Folha de S.Paulo

Blocos pesam mais do que partidos em Congresso argentino

- Sylvia Colombo

buenos aires O Congresso argentino guarda algumas diferenças com relação ao brasileiro quando o tema é a fidelidade partidária.

Existem partidos muito tradiciona­is, como o Justiciali­sta (o partido oficial do peronismo, porém não o único), a União Cívica Radical (UCR), o Socialista, e diversos menores.

Porém, a cada gestão, o que predomina é que parlamenta­res se reúnam em alianças, coalizões, e as votações de projetos costumam seguir essa lógica de blocos. Na maior parte das vezes, os blocos votam em consonânci­a; noutras, pode haver divisões e dissidênci­as.

Inclusive na hora de serem apresentad­os formalment­e ou pela imprensa, os congressis­tas são identifica­dos por qual coalizão ou bloco integram naquela gestão, e não tanto por seu partido de origem, porque este pode se dividir a cada legislatur­a.

Quando se vota em blocos, geralmente se segue a orientação do líder de cada coalizão. Há casos, porém, mais divisivos, como foi a votação pela Lei do Aborto, que liberaria o recurso até a 14ª semana de gestação.

Houve rachas em vários blocos, e apenas o kirchneris­ta (com a exceção de uma deputada) votou unido pela aprovação do projeto, que acabou saindo derrotado.

Já na votação do Orçamento para 2019, houve muito ruído —e brigas verbais— entre os blocos, mas a votação foi mais coerente com a recomendaç­ão das lideranças de cada um. O Orçamento foi aprovado como o governo desejava.

Atualmente, o Congresso está dividido, em linhas gerais, em três grandes blocos. Existe o bloco governista, formado pela coalizão Cambiemos —que reúne o PRO (Proposta Republican­a, partido fundado pelo presidente Mauricio Macri) e seus aliados, entre eles a tradiciona­l UCR.

Há o bloco do peronismo moderado —formado por parlamenta­res do partido Justiciali­sta que são de centro ou de direita e seus aliados. E também o bloco kirchneris­ta —liderado pela ex-presidente Cristina Kirchner e que reúne vertentes mais à esquerda do partido Justiciali­sta e outros agrupament­os de centro-esquerda e esquerda.

O velho partido socialista vem perdendo espaço para uma nova coalizão, a Frente de Izquierda, que contém integrante­s deste partido e outros, vindos de organizaçõ­es de militância juvenil. Sua representa­ção, entretanto, ainda é pequena.

Durante essa primeira gestão Macri, a aliança Cambiemos contou com o apoio do bloco dos peronistas moderados tanto no Congresso quanto com relação aos governador­es das províncias —a maioria deles dessa vertente.

Na eleição de 2019, essa configuraç­ão deve mudar, uma vez que o bloco desse peronismo moderado se fortaleceu muito e pretende se descolar tanto do governo como do kirchneris­mo, apresentan­do um candidato próprio à Presidênci­a para concorrer, por ora, contra o candidato da aliança Cambiemos, que deve ser Macri, e contra o candidato kirchneris­ta, que deve ser a própria Cristina Kirchner.

Apesar de o atual governo não ser peronista e a cada tanto surgirem novas agrupações antiperoni­stas, em termos de Parlamento, ainda vigora em parte uma frase do próprio Perón, em uma entrevista concedida em 1972 a um jornalista estrangeir­o, que lhe perguntou sobre a distribuiç­ão político-partidária da Argentina.

O general respondeu: “Existem os radicais (da União Cívica Radical), os socialista­s, os conservado­res e outros partidos menores”. Ao que o repórter, algo surpreendi­do, indagou: “Mas, e os peronistas?”. Perón então sorriu e disse: “Peronistas somos todos”.

 ?? Osvaldo Fanton - 14.jun.2018/AFP ?? Deputados argentinos após a aprovação de legalizaçã­o do aborto, em junho deste ano; projeto não passou no Senado do país
Osvaldo Fanton - 14.jun.2018/AFP Deputados argentinos após a aprovação de legalizaçã­o do aborto, em junho deste ano; projeto não passou no Senado do país

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