Poluição do ar mata mais que cigarro
Estudo indica que material particulado tira 1,8 ano da expectativa de vida
Quiz sobre saúde: qual dos problemas prejudica mais a expectativa de vida no mundo —terrorismo e conflitos, acidentes de trânsito, falta de saneamento básico, álcool e dependência química ou tabagismo?
Nenhuma das anteriores. A maior ameaça para a saúde da população terrestre é a poluição do ar, em especial o material particulado (como poeira e fuligem). Sozinha, ela diminui em 1,8 ano a expectativa de vida, na média global.
O dado estarrecedor consta do estudo “Introducing the Air Quality Life Index” (apresentando o Índice de Vida e Qualidade do Ar). O trabalho foi compilado por Michael Greenstone e Claire Qing Fan, da Universidade de Chicago.
Entenda-se que isso não significa que cada pessoa viverá 1,8 ano a menos. Crianças que morrem nos primeiros meses ou anos de complicações respiratórias provocadas por material particulado —seriam mais de 600 esses casos fatais, a cada ano, só no Brasil— contribuem para reduzir de modo drástico a expectativa de vida.
O tabagismo, único fator a rivalizar o malefício da qualidade do ar, também ataca os pulmões e retira 1,6 ano da média de anos de vida.
As outras condições citadas ficam muito atrás dos dois flagelos. Terrorismo diminui a média em apenas 22 dias, como seria de esperar para um fenômeno de escala local. Já acidentes de trânsito assumem feição de problema de saúde pública: 4,5 meses a menos.
Pouco acesso a água tratada e a esgotos recolhidos e tratados causam estrago maior, de sete meses. Álcool e drogas, algo ainda pior, com 11 meses. Note que em nenhum desses casos se ultrapassa a marca de um ano completo, como no caso da poluição atmosférica.
Mede-se a qualidade do ar com base em vários parâmetros, como as concentrações de ozônio, monóxido de carbono e óxidos de nitrogênio. Dá-se atenção especial ao particulado porque a poeira mais fina penetra nos alvéolos pulmonares e pode desencadear câncer e doenças cardíacas.
A situação do Brasil até que não é das piores. Segundo o relatório, só 0,2 ano se acrescentaria à expectativa de vida por aqui se o máximo de material particulado recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) fosse obedecido.
Médias, entretanto, podem revelar-se enganosas. No estado de São Paulo, já se estimou em mais de 11 mil as mortes precoces, a cada ano, resultantes da poluição do ar.
Um exemplo: na estação medidora de Pinheiros, bairro da capital paulista, o índice de material particulado MP10 esteve ininterruptamente acima do recomendado pela OMS (50 microgramas por metro cúbico, mg/m3) de 2000 a 2015.
Ainda mais alarmante se mostra a situação em nações como Índia e China. No primeiro caso, os indianos viveriam 4,3 anos mais, em média, se o padrão OMS fosse implantado.
Em Nova Déli, a parcela de vida subtraída alcança nada menos que 10 anos. Na média.
Na China, o dano para a população seria de 2,9 anos, informa o relatório. Em Pequim, 6 anos. Mas metrópoles de países ricos também sofrem com material particulado, como Los Angeles, nos EUA.
Em países como Índia e China, pesa nas estatísticas o fato de que muita gente ainda cozinha com lenha dentro de casa. A poluição doméstica, sobretudo fuligem, acaba sendo pior para a saúde, localmente, que a de distantes metrópoles.
Nesses casos, fogareiros de metal projetados para substituir tradicionais queimadores feitos de argila podem cortar a fumaça em 80%. Nas grandes cidades do mundo, contudo, a solução seria disseminar transportes públicos e eletrificar toda a frota —de quebra ajudando a conter a mudança do clima.