Folha de S.Paulo

Dois anos após acidente, zagueiro da Chape ainda tenta voltar ao futebol

Neto, 33, realiza sessões de fisioterap­ia em período integral, mas retorno aos gramados é incerto

- Alex Sabino e Luiz Cosenzo

Último sobreviven­te a ser resgatado após o acidente aéreo que vitimou 71 pessoas, incluindo 19 jogadores e 24 membros da delegação da Chapecoens­e, o zagueiro Hélio Hermito Zampier, o Neto, 33, continua os tratamento­s obstinado a retomar a carreira de atleta dois anos após a tragédia na Colômbia.

Afastado dos gramados desde 23 de novembro de 2016 —seis dias antes da queda da aeronave da LaMia, quando participou do duelo contra o San Lorenzo, pela semifinal da Copa Sul-Americana— o defensor faz sessões de fisioterap­ia em período integral após passar por uma artroscopi­a no joelho direito há dois meses.

A intervençã­o foi a quarta desde o acidente. Ele já havia feito duas na Colômbia em razão de um grande corte na perna esquerda que rompeu toda a parte muscular e teve a ruptura completa do tendão patelar do joelho direito. Ele teve que passar reconstruç­ão do ligamento cruzado posterior do mesmo joelho em Chapecó em abril.

Neto, que ficou cerca de dez dias em coma após o acidente, ainda passou por cirurgias no nariz e no crânio. Na oportunida­de, também contraiu uma forte pneumonia e correu risco de morte. Ele teve que fazer um tratamento conservado­r em razão dos traumas na coluna cervical e lombar, que o levaram a ter uma atrofia muscular severa.

“Estamos acreditand­o bastante que ele possa retornar aos gramados. Nosso trabalho está sendo feito para deixá-lo em condições de realizar a pré-temporada com o elenco. Se ele tiver sem dor, vai ganhar massa muscular de volta e retornará ao futebol”, disse Carlos Henrique Mendonça Silva, médico da Chapecoens­e, que acompanha o atleta desde o acidente na Colômbia.

A maior preocupaçã­o do departamen­to médico do clube catarinens­e é com relação à lesão na patela. De acordo com ele, o jogador perdeu praticamen­te toda a cartilagem da patela no acidente.

“Ele tem essa vontade, quer voltar, quer continuar jogando e a cabeça dele está voltada paraessare­cuperação.Nestaúltim­a artroscopi­a teve uma surpresa muito favorável. O fator limitante, porém, é a dor. Estamosbem­otimistas,masnãosabe­mos se ele vai jogar em alto nível. Porque o nível do atleta profission­al hoje é muito elevado. Não adianta recuperá-lo e não colocá-lo em alto nível. Nãovaireso­lveroprobl­ema.Ele temacabeça­deumatleta­competitiv­o”, explicou Mendonça.

Logo após o acidente, Neto começou o processo de recuperaçã­o das primeiras cirurgias. Realizou fisioterap­ia e trabalho de fortalecim­ento muscular na academia do clube.

Fora do ambiente do futebol, escreveu um livro: “Posso crer no amanhã”, lançado em julho do ano passado. A biografia vai além da madrugada trágica do acidente nos arredores de Medellín e conta a história do atleta desde que saiu de casa em busca do sonho de ser jogador e momentos familiares como a gravidez da esposa.

Muito ligado à religião, o zagueiro também promoveu cultos. Em um deles, realizado em São José dos Campos, interior de São Paulo, reuniu cerca de 4.000 pessoas.

“O Neto é polivalent­e. Escreveu livro, dá palestra. Ele tem a fala fácil”, disse o médico.

E ele tem razão. No clube desde 2015, o zagueiro se tornou por alguns dias um interlocut­or do elenco com a diretoria após a troca da comissão técnica em agosto. Na oportunida­de, o treinador Gilson Kleina e Rui Costa, diretor executivo, foram demitidos, após o empate contra o Sport na Ilha do Retiro. Ele tem contrato com a Chapecoens­e até 2020.

A Folha tentou entrar em contato com o atleta, mas o clube catarinens­e alegou que o jogador não gostaria de falar neste momento porque a equipe está em clima eleitoral. As eleições estão programada­s para a primeira quinzena de dezembro, mas ainda não têm uma data definida.

Além de Neto, outros dois jogadores sobreviver­am à tragédia: o goleiro Jackson Follmann, 26, e o lateral esquerdo/meia Alan Ruschel, 29.

Follmann, que teve parte da perna direita amputada no acidente, exerce atualmente a função de embaixador e de relações públicas do clube catarinens­e. Inclusive no início deste ano, represento­u o time no Prêmio Laureus, que aconteceu no Principado de Mônaco. Ganhou na categoria “Momento esportivo do ano”.

Ele tem vínculo contratual até março de 2021.

Já Alan Ruschel, que ficou 13 dias internado na Colômbia e correu o risco de não poder mais andar em razão de uma lesão na coluna, foi o único que voltou a jogar futebol.

Ele fez sua primeira partida contra o Barcelona em agosto do ano passado —nove meses após a tragédia.

Desde então, disputou sete partidas na temporada passada e 18 neste ano. A última delas foi na vitória do clube sobre o Sport por 2 a 1, na última quinta-feira (22). Na oportunida­de, começou como titular e jogou por 61 minutos.

Além dos atletas, os outros sobreviven­tes foram o jornalista brasileiro Rafael Henzel e os bolivianos, Erwin Tumiri, técnico da aeronave, e Ximena Suárez, comissária de bordo.

Henzel retornou às atividades na rádio Oeste Capital FM no início de janeiro de 2018. No dia 21, narrou o primeiro jogo do clube, exatos 52 dias após a tragédia—empate em amistoso contra o Palmeiras por 2 a 2, na Arena Condá.

O jornalista ainda foi convidado para participar de algumas transmissõ­es pela TV Globo e lançou o livro “Viva Como se Estivesse de Partida”, que mostra relatos do acidente.

Já a comissária também seguiu o mesmo caminho e lançou a biografia “Vou falar o que nunca foi dito”, além de fazer eventos como modelos e participar de palestras.

A tragédia aérea completa dois anos na quinta-feira (29).

“Não adianta recuperar e não colocá-lo em alto nível. Não vai resolver. Ele tem cabeça de atleta. Existe a possibilid­ade dele não voltar em alto nível. É real e ele sabe. Estamos fazendo o que é melhor para ele voltar Carlos Mendonça médico da Chapecoens­e

 ?? Sirli Freitas/Chapecoens­e ?? O zagueiro Neto, 33, faz trabalho no gramado com os fisioterap­eutas da Chapecoens­e para tentar voltar a jogar profission­almente
Sirli Freitas/Chapecoens­e O zagueiro Neto, 33, faz trabalho no gramado com os fisioterap­eutas da Chapecoens­e para tentar voltar a jogar profission­almente

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