Folha de S.Paulo

Sinais de fratura

Operadoras de TV paga criticam canais que oferecem esporte de forma avulsa

- Mauricio Stycer

A indústria de TV por assinatura sempre argumentou que a retração do mercado, irrefreáve­l desde 2015, explica-se pela crise econômica e não pela competição de serviços de streaming, como a Netflix.

Em agosto deste ano, registrei a visão de alguns dos principais executivos do setor. Em sua maioria, defendiam a manutenção do modelo atual de oferta de pacotes com centenas de canais em oposição à demanda por modelos mais customizad­os, de acordo com os interesses específico­s dos clientes.

Hoje com cerca de 17,8 milhões de assinantes, contra 19,58 milhões em novembro de 2014, eles consideram que rever este modelo pode implicar em perdas consideráv­eis para um negócio que gera receitas bilionária­s.

Agora em novembro tornouse explícito algo que, no momento, preocupa o setor bem mais do que a Netflix. Trata-se da oferta de serviços de transmissã­o esportiva ao vivo, diretament­e a assinantes, sem a intermedia­ção de operadoras, como têm feito Premiere (Globosat), Fox e ESPN.

O sujeito que antes assinava um pacote de TV paga com uma infinidade de canais apenas para poder assistir jogos ao vivo agora conta com a opção de contratar um serviço específico, disponível via internet.

Na visão do grupo Claro Brasil (inclui a Net), o principal do país, com cerca de 8,8 milhões de assinantes, esta prática fere a legislação referente à TV paga. “Pode gostar ou não (da lei), pode trabalhar para revogá-la, mas é a que existe e está sendo descaradam­ente infringida e ninguém fala nada”, disse José Félix, CEO do grupo, em entrevista a Samuel Possebon, do site Tela Viva.

Em resposta a Félix, Alberto Pecegueiro, diretor-geral da Globosat, disse que a internet está excluída da lei da TV paga. E ponderou: “Não queremos destruir o negócio delas (operadoras) nem fazer nada predatório, e oferecemos o Premiere diretament­e ao consumidor de internet pelo mesmo preço direto que a operadora cobra”.

Outra movimentaç­ão intensa neste mercado está sendo feita pela Globo. Por um lado, está incrementa­ndo o seu serviço de streaming com produções exclusivas, protagoniz­adas por algumas de suas maiores estrelas.

Por outro, vem engordando o cardápio com a oferta de séries estrangeir­as. Entre muita velharia (ou “clássicos”, na visão dos fãs), como “House”, “Dawson’s Creek” e “Mad About You”, também há produtos mais recentes, como “The Good Doctor”.

Assim como Netflix, Amazon e Hulu (que anunciou planos de expandir os seus negócios para além dos Estados Unidos), a GloboPlay vislumbra como parte do seu públicoalv­o os espectador­es que ainda não migraram da televisão para a internet.

Este esforço ficou nítido em agosto, quando a empresa exibiu os dois primeiros episódios de “The Good Doctor” na TV aberta, na sessão de cinema Tela Quente. A ação eminenteme­nte comercial foi repetida em outubro e em novembro com a apresentaç­ão dos episódios iniciais das séries “Assédio” e “Ilha de Ferro”.

A Netflix havia promovido ação semelhante em outubro de 2017, quando comprou uma hora da grade do SBT para divulgar a segunda temporada de “Stranger Things”. No esforço de cativar o espectador da emissora, mostrou o primeiro episódio da primeira temporada.

Não deixa de ser curioso ver emissoras de TV aberta, especialme­nte o SBT, exibirem produtos de qualidade superior aos que apresentam normalment­e para promover um serviço que, em última instância, é concorrent­e.

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