Promessas caras esbarram em meta de manter gasto de saúde
A estratégia de saúde da família é mundialmente reconhecida, uma vez que resolve a maior parte dos problemas no atendimento básico. Outra vantagem é que ela orienta o paciente sobre qual caminho percorrer no sistema de saúde.
Na sexta-feira (23), a reportagem acompanhou uma equipe no Jabaquara, zona sul de São Paulo. Responsável por uma área de pouco mais de 30 quarteirões, o médico Cassio Gonçalves, 27, foi à casa de dois pacientes que têm dificuldade de locomoção para ir à unidade básica de saúde.
As visitas são planejadas a partir do trabalho de agentes comunitários, que passam de domicílio em domicílio para ver a situação dos moradores e dar orientações diversas.
Elas vão de alertas sobre vacinação a dicas mais cotidianas, como ocorreu na casa do ascensorista aposentado Mário Pedro da Silva, 80, de cama, com uma anemia severa.
“O senhor me ressuscitou”, disse ele ao médico. “Já pintei a porta, da próxima vez que você vier vou estar no telhado.” A agente comunitária Elaine Mello, 44, interveio: “O senhor tem que ir devagar, já caiu, pode se machucar.”
Na visita seguinte, Cassio mediu a pressão da comerciante Alba da Silva, 55, e cobrou o laudo de exames. Ela tem plano de saúde, mas teria que ir até a Mooca para ser atendida, então não vai.
Como nesse caso, o acompanhamento de perto das equi- pes de saúde garante o atendimento evitando-se a ida desnecessária a especialistas e a piora dos problemas de saúde. É uma ferramenta, portanto, de economia de recursos.
Nos últimos quatro anos, porém, a cobertura da estratégia de saúde da família no país está parada em torno de 60%. Segundo o presidente do Conasems, a estagnação se deve à dificuldade de contratar profissionais por causa da queda de arrecadação.
A escassez de recursos fica ainda mais dramática diante de uma peculiaridade do Brasil, diz Lígia Bahia, professora de saúde coletiva da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). “Temos doenças crônicas, vírus tropicais, violência e acidentes”, diz.
Países mais ricos não precisam se preocupar tanto com os três últimos itens, o que significa menos gasto com pronto-socorro e vigilância epidemiológica.
Os problemas não pressionam apenas o SUS. Desde 2014, os planos de saúde perderam cerca de 3 milhões de beneficiários, mas as despesas não pararam de crescer —especialmente com internações.
Trata-se de uma evidência de que o atual sistema de pagamento por procedimento não é sustentável, afirma Luiz Carneiro, superintendente do Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS).
“É um modelo que incentiva o volume, não o resultado”, diz. Além de se repensar essa lógica, ele avalia que também é preciso dar mais transparência aos preços praticados por toda a cadeia da saúde, incluindo hospitais.
Como autor de nomeações para a agência reguladora do setor, o governo federal poderia induzir uma discussão sobre o tema. Como a procura pelos planos está muito ligada ao emprego formal, não se espera que o mercado volte tão rápido ao patamar pré-crise.