Folha de S.Paulo

Quem tem medo do PL 10.044/18?

Estar contra o projeto implica aval à corrupção

- Roberto Livianu Promotor de Justiça em São Paulo, doutor em direito (USP) e idealizado­r e presidente do Instituto Não Aceito Corrupção

O Latinobarô­metro acaba de divulgar o relatório 2018, que realiza desde 1995, em que foram ouvidas 20 mil pessoas em 18 países, incluindo o Brasil —que se destaca, infelizmen­te, pelos números negativos.

O índice de confiança interpesso­al detectado aqui é de apenas 4% (o pior dos 18 países); a fé na democracia é de apenas 34% (média dos 18 países é de 48%); por fim, na visão dos brasileiro­s apenas 7% dos detentores de poder utilizam-no para o bem comum, apesar do trabalho hercúleo da Operação Lava Jato, com recuperaçã­o de heroico um terço dos valores desviados —muito acima das médias mundiais.

Mas a Lava Jato não tem a força de reverter o grave quadro acima, que nos levou a cair 17 posições no índice de percepção da corrupção da Transparên­cia Internacio­nal, levando-nos ao vexatório 96º lugar dentre 180 países, ao passo que temos a nona economia do mundo, o que evidencia a tragédia de nossa corrupção, geradora de erosão nos pilares democrátic­os.

A Presidênci­a contribuiu para essa queda, ao conceder indulto Black Friday de Natal para corruptos, tentando liquidar em 2017 80% de suas penas; e a Câmara também ajudou ao não deliberar sobre a PEC 333/16, que elimina o foro privilegia­do e ao barrar a reforma política, de verdade, como esperava a sociedade.

Na última semana, o Senado pautou o projeto de um senador fichasuja, que pretendia amesquinha­r e enfraquece­r a Lei da Ficha Limpa, apesar da decisão do pleno do STF em relação à interpreta­ção de seu campo de abrangênci­a. A sociedade reagiu, e o projeto foi arquivado.

Leis devem ser concebidas para resolver problemas e para proteger o bem comum, como o PL 10.044/18, que deverá ser votado na Comissão de Desenvolvi­mento Econômico da Câmara nesta quarta-feira (28).

Este nasceu da percepção dos prejuízos causados por ilicitudes perpetrada­s a partir de sócios “laranjas” de empresas fictícias, constituíd­as por contratos frios, que, sem nenhuma fiscalizaç­ão, hoje são registrado­s em cartórios e Juntas Comerciais. O papel aceita literalmen­te tudo e serve como meio para fraudar e lavar dinheiro.

Segundo reportagem do jornal O Globo de 29 de abril, empresas e grupos financeiro­s acusados de usar técnicas de sonegação e de lavagem de dinheiro tiveram R$ 3,1 bilhões em bens bloqueados por investigaç­ão da Procurador­ia-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e da Receita Federal, que delineou o Mapa da Fraude —diagnóstic­o sobre esquemas para ocultar bens de empresas com o objetivo de escapar de dívidas com o fisco, em oito estados.

Os países com os sistemas legais mais avançados do mundo, como Alemanha, França, Itália e Espanha, em busca de segurança jurídica, tornaram obrigatóri­o para abrir empresa o instrument­o público lavrado pelo tabelião, perante o qual os sócios devem se apresentar, melhorando a fiscalizaç­ão, com geração de publicidad­e e menos custo —propõe-se desconto de 50% para pequenas e médias empresas, que predominam no Brasil.

Posicionar-se contra o projeto equivale a se postar em favor do atraso, da burocracia, da opacidade, da corrupção e da lavagem de dinheiro e contra o bem comum, já que o projeto propõe aceleração do trâmite para abrir empresas, economicid­ade, modernizaç­ão e transparên­cia.

O texto estabelece, ainda, o controle efetivo nas constituiç­ões das empresas pelo MP, PF, Receita e Judiciário, já que o Colégio Notarial do Brasil criará e custeará um Órgão Central de Prevenção de Lavagem de Dinheiro (OCPLD). Com a palavra, os nobres deputados.

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