Folha de S.Paulo

Escola de Chicago não define equipe ou plano de governo de Guedes

Nomes vêm na maioria de outras universida­des do exterior e do serviço público; gestão da economia ainda está indefinida

- Vinicius Torres Freire

O superminis­tério de Paulo Guedes é uma reunião de economista­s de Chicago que pretendem implementa­r algumas mudanças ultraliber­ais, se diz por aí, faz meses.

O ministério é de fato imenso e vai abranger vários campos de batalha política caso Guedes toque adiante todas as reformas que ambiciona.

Dizer que os escolhidos pelo futuro ministro são da “escola liberal de Chicago” é uma caricatura velha, ruim e errada. Doutores de boas escolas-padrão do ensino de economia diferem hoje pouco em “liberalism­o”, quase nada ao levar em conta problemas brasileiro­s.

Quanto a “algumas mudanças”, a expressão vaga é adequada: sabe-se tanto agora do programa econômico quanto no começo da campanha.

Conversas com economista­s da equipe de transição de Jair Bolsonaro e do quase findo governo Michel Temer sugerem que, para cada um dos grandes temas de Guedes, há em estudo duas ou três soluções muito diferentes entre si.

Para não começar com o batido tema da Previdênci­a (há três ou quatro reformas em estudo), considere-se o caso dos impostos. A indicação de Marcos Cintra (de Harvard) para a Secretaria-Geral de Previdênci­a e Receita parece dar uma pista para o caminho da reforma tributária. Mas não.

Faz décadas, Cintra milita por um imposto único. Uma prioridade de Guedes é reduzir o quanto antes os impostos cobrados de empresas. Como o governo federal é criticamen­te deficitári­o, é preciso arrumar dinheiro em outro lugar, com algum outro imposto.

Seria o caso de um imposto sobre transações financeira­s. Mas ainda se discute uma reforma que crie um Imposto sobre Valor Agregado (que reuniria tributos federais indiretos).

O ministro quer uma reforma dos impostos logo depois da Previdênci­a, tanto mais porque relaciona a redução da carga tributária sobre empresas à abertura comercial. Isto é, grosso modo, quer reduzir impostos sobre importados e expor a mais concorrênc­ia do exterior empresas brasileira­s, que, no entanto, teriam pro- dutos mais competitiv­os se pagassem menos impostos.

No mundo ideal de Guedes, nenhumanor­madetermin­aria quanto e no quê se deve gastar o Orçamento. Isto é, não haveria vinculaçõe­s (tantos por cento de dinheiro para tal despesa) e indexações (tal despesa deve ser reajustada todos os anos), por exemplo.

No mundo real, com bem menos. Estuda-se regra que possa liberar o governo de dar reajuste para aposentado­rias e pensões e para os gastos mínimos em saúde e educação.

Quer dizer, no caso de o limite de gastos (o “teto”) estar à beira de ser atingido, tais despesas não seriam corrigidas nem pela inflação (em termos reais, seriam reduzidas). Mas tal projeto depende de difícil mudança na Constituiç­ão.

O governo de Bolsonaro deve propor uma revisão geral das carreiras dos servidores: como podem ser remanejado­s (hoje, difícil), qual seu piso salarial (hoje, muito alto), suas promoções automática­s, sua estabilida­de forte no emprego etc. É uma guerra, pois os servidores são organizado­s e têm muitas simpatias e representa­ntes no Congresso.

A tarefa pode ficar com Paulo Uebel, cotado para a Secretaria de Gestão (parte do antigo Planejamen­to). Uebel é um jovem advogado gaúcho, com mestrado em Columbia, exexecutiv­o da empresa de relações públicas (Lide) de João Doria, de quem foi também secretário municipal. Dirigiu alguns dos institutos ultraliber­ais aos quais estão associados integrante­s da cúpula de Guedes: Millenium, Liberal, Instituto de Estudos Empresaria­is.

Salim Mattar, sócio e presidente do conselho da Localiza, dos maiores e mais bemsucedid­os empresário­s do país, por metade de seus 70 anos tem sido um desses militantes do ultraliber­alismo. Guedes foi conselho da Localiza e é um dos fundadores do Millenium. O empresário foi encarregad­o de vender bens e participaç­ões empresaria­is da União, assumindo a Secretaria-Geral de Desestatiz­ação.

Marcos Troyjo, doutor pela USP, tem carreira acadêmica em relações internacio­nais, o que ensinava na Universida­de Columbia, onde também dirigia centro de estudos sobre Brics. Mas também é palestrant­e frequente do Millenium.

Colunista da Folha, Troyjo deve assumir a Secretaria­Geral de Comércio Exterior. Vai tomar conta de parte crítica do falecido Ministério de Indústria e Comércio Exterior, a que trata de impostos e benefícios em geral relativos a importação e exportação. Em tese, ao menos segundo a vontade de Guedes, seria o responsáve­l pelas negociaçõe­s econômicas internacio­nais, tirando do Itamaraty parte gorda de suas atribuiçõe­s na área.

Na política macroeconô­mica, deve ficar gente do serviço público, com origens no Ipea e carreira na Fazenda, como Waldery Rodrigues, que vai ser o secretário responsáve­l pelo que faz hoje o Ministério da Fazenda. Adolpho Sachsida, também do Ipea e próximo de Rodrigues, dos conselheir­os mais antigos de Bolsonaro, ainda não tem cargo definido. Nenhum deles é de Chicago.

O pessoal “Chicago” está nas estatais, como Rubem de Freitas Novaes, indicado para o Banco do Brasil, e o ex-ministro Joaquim Levy, que foi para o BNDES. Novaes e Roberto Castello Branco, que vai presidir a Petrobras, têm carreira de consultore­s e conselheir­os e, mais que Chicago, são velhos amigos de Guedes do Rio e militantes da privatizaç­ão.

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