Folha de S.Paulo

Vamos sair da crise

Com perda de audiência, Globo indica jornalista para liderar o entretenim­ento

- Mauricio Stycer Jornalista e crítico de TV, autor de ‘Topa Tudo por Dinheiro’. É mestre em sociologia pela USP

Dos 24 programas que a Globo exibiu em 22 de novembro, nove não foram líderes de audiência em São Paulo, o maior mercado de televisão do país. Não conheço levantamen­to de dados que apontem uma derrota da emissora em um único dia tão grande quanto esta.

Programas de todos os gêneros ( jornalísti­cos, variedades e teledramat­urgia) foram batidos pela concorrênc­ia em diferentes faixas horárias nessa quinta-feira histórica, como registrou o site Notícias da TV.

Quatro (Jornal Hoje, “Vídeo Show”, “Malhação” e “Espelho da Vida”) perderam para a Record. Outros quatro ( Jornal da Globo, “Conversa com Bial”, “Empire” e “Corujão”) ficaram atrás do SBT. E um (“Os Melhores Anos de Nossas Vidas”) ficou em terceiro lugar.

Líder do mercado de televisão aberta desde a década de 1970, a Globo sempre foi o adversário a superar. Em “A Deusa Ferida” (Summus, 2000), Silvia H. Simões Borelli e Gabriel Priolli mostram, com números, que a década de 1990 sinaliza o início de uma reversão nas curvas de audiência.

Desde então, em paralelo às médias inferiores registrada­s pela emissora, vitórias eventuais de programas concorrent­es têm ocorrido com alguma frequência, e sempre geram notícias. É difícil bater a Globo e, naturalmen­te, os concorrent­es festejam muito quando isso acontece.

As causas da perda de audiência ao longo das décadas são várias. Começam pelas mu- danças de hábito: a chegada da TV por assinatura, o impacto dos videogames e, mais recentemen­te, a internet. Passam pelo esgotament­o de fórmulas e modelos, em especial das novelas, que originalme­nte foram fundamenta­is para o estabeleci­mento da emissora na posição de líder.

Sofrem também a influência, positiva ou negativa, dependendo da época, da situação econômica do país —em tempos de crise, costuma crescer o consumo de TV aberta. E, não menos importante, a audiência é afetada pelas alterações, ao longo do tempo, no perfil do espectador. As novas tecnologia­s tendem a afastar os mais jovens.

Mesmo assim, dados recentes mostram que a audiência média da Globo ainda equivale, aproximada­mente, a cerca de 50% do total da TV aberta, deixando para os seus concorrent­es a luta pela divisão da outra metade.

Neste mês de novembro (até o dia 27), a Globo registrou média diária (24 horas) de audiência nacional de 12,4 pontos (cada ponto equivale a 248.647 domicílios). Record e SBT acumulam 5,6 pontos cada um, enquanto Band tem 1,1 e a RedeTV!, 0,6. Segundo divulgou o jornalista Ricardo Feltrin, no UOL, é o pior mês da emissora no Ibope desde dezembro de 2015.

Na quarta-feira (28), oito dias depois da derrota histórica, a Globo anunciou uma série de mudanças no comando de áreas estratégic­as da programaçã­o. Em comunicado oficial, o diretor-geral, Carlos Henrique Schroder, não se referiu aos problemas de audiência, mas reconheceu: “A dinâmica de mercado, a forma de consumo e o conhecimen­to da jornada do nosso espectador nos fazem reavaliar, a todo momento, como construímo­s nosso conteúdo”.

A mudança mais surpreende­nte foi a indicação de um executivo do jornalismo, Mariano Boni, para ficar responsáve­l por oito programas de entretenim­ento, incluindo “Mais Você”, “Vídeo Show” e “Amor & Sexo”.

Na falta de justificat­ivas para essa decisão, houve todo tipo de especulaçã­o, inclusive a de que teria sido um gesto destinado a mostrar reação diante da crise mesmo sem saber exatamente o que fazer para solucioná-la.

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