Folha de S.Paulo

Candidato à reeleição leva mais verba que novato

Partidos deram a deputados com mandato fatia do fundo eleitoral maior que destinada a concorrent­es fora do cargo

- -João Pedro Pitombo e Marina Merlo

Dos 8.588 candidatos a deputado federal que disputaram a eleição deste ano, só 3.967 receberam recursos do fundo eleitoral.

Ao todo, os partidos distribuír­am R$ 794,2 milhões, sendo que 46% do valor foi repassado a 369 candidatos à reeleição — uma média de R$ 1 milhão para cada um.

“Com o controle do dinheiro, o partido passa a ter influência nas eleições e no mandato. Um deputado que não votar com a base pode ficar sem recursos Leonardo Barreto doutor em ciência política (UnB)

A distribuiç­ão dos recursos do fundo eleitoral, criado em 2017 para financiar as campanhas políticas do país, privilegio­u os candidatos a deputado que já tinham mandatos e disputavam a reeleição.

Levantamen­to da Folha aponta que dos 8.588 candidatos a deputado federal que disputaram a eleição deste ano, apenas 3.967 receberam recursos do fundo eleitoral de seus respectivo­s partidos.

Entre os candidatos que receberam repasses, os deputados federais que disputaram a reeleição obtiveram, em média, oito vezes os recursos do fundo eleitoral recebidos pelos demais postulante­s ao cargo.

Ao todo, os partidos distribuír­am R$ 794,2 milhões a candidatos a deputado federal, sendo que 46% deste valor foi repassado a 369 candidatos à reeleição —uma média de R$ 1 milhão para cada um.

Os outros 54% foram repassados a 3.598 candidatos que ocupavam outros cargos ou não tinham função pública na época da eleição. Cada um, em média, ficou com R$ 113,4 mil do fundo eleitoral.

Com maior fatia no fundo, partidos como MDB, PP e PT estão entre os que mais aplicaram recursos para tentar reeleger suas respectiva­s bancadas eleitas em 2014.

Proporcion­almente, contudo, legendas como PP, PR e Podemos se destacam e chegaram a aplicar até 38% de todo o seu fundo eleitoral em suas atuais bancadas.

A decisão de concentrar as verbas teve cunho estratégic­o, já que o número de deputados eleitos é o fator que baliza o volume de recursos que cada legenda receberá de fundo partidário durante a legislatur­a e de fundo eleitoral nas próximas eleições, além do tempo de rádio e televisão.

Em geral, os grandes e médios partidos estabelece­ram cotas nas quais candidatos à reeleição receberam verbas que chegaram a até R$ 2 milhões.

Alguns candidatos, contudo, conseguira­m fazer costuras políticas que ampliaram o valor captado do fundo eleitoral.

A deputada federal Flávia Morais (PDT-GO), por exem- plo, recebeu R$ 500 mil de seu partido —mesmo valor que os demais candidatos pedetistas à reeleição— e mais R$ 625 mil do DEM, partido ao qual aliou-se em apoio à candidatur­a de Ronaldo Caiado (DEM) ao governo de Goiás.

Partidos pequenos e com menor volume de recursos também concentrar­am recursos em deputados que disputavam a reeleição.

O PHS, por exemplo, repassou R$ 1,8 milhão para o presidente do partido, o deputado federal Marcelo Aro (MG) —ele ficou com equivalent­e a 10% do total do fundo eleitoral da legenda.

Seu único colega de bancada que disputou a reeleição, Carlos Andrade (RR), recebeu apenas R$ 287 mil.

Outros 200 candidatos novatos receberam, juntos, R$ 4,2 milhões, resultando numa média de R$ 21 mil para candidato, enquanto 128 não receberam recursos.

Segundo Marcelo Aro, o partido priorizou candidatur­as com potencial de ajudar o partido a ultrapassa­r a cláusula de barreiras —meta que a legenda não conseguiu alcançar.

Ele ainda justificou o fato de cerca de 10% do fundo ter sido aplicado em sua própria candidatur­a.

“Foi um recurso proporcion­al à votação que tive em 2014 e ao potencial que teria em 2018”, disse.

A Rede Sustentabi­lidade também concentrou recursos em seu único deputado que disputou a reeleição —João Derly (Rede-RS) ficou com R$ 725 mil, equivalent­e a 7% de todo o recurso destinado ao partido.

Outros 27 candidatos novatos repartiram R$ 2,1 milhões e 228 ficaram sem repasses.

Na avaliação de Leonardo Barreto, doutor em ciência política pela UnB (Universida­de de Brasília), a criação do fundo eleitoral resultou em um novo instrument­o de poder dos partidos, que passaram a distribuir os recursos de campanha entre os seus escolhidos.

Por outro lado, ele destaca que na eleição deste ano, o poder dos partidos acabou sendo ultrapassa­do pelo desejo de mudança da população, que resultou em uma renovação das cadeiras da Câmara.

Barreto, contudo, vê uma tendência de fortalecim­ento de poder dos partidos no longo prazo, caso as regras sejam mantidas.

“Com o controle do dinheiro, o partido passa a ter influência não só nas eleições como também na organizaçã­o do mandato. Um deputado que não votar com a base, que brigar muito, pode ser punido e ficar sem recursos”, afirma Barreto.

Em geral, mesmo dentre os candidatos que não disputaram a reeleição, tiveram prioridade aos recursos aqueles que já exerceram mandatos ou que são parentes de de- putados ou de dirigentes partidário­s.

Entre os ex-deputados, destacam-se João Maia (PR-RN), que recebeu R$ 2,2 milhões, e Luciano Bivar (PSL-PE), que comanda o partido do presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), e ficou com R$ 1,8 milhão.

Entre os parentes de políticos, o destaque foi Marlene Campos Machado (PTB-SP), que recebeu R$ 2 milhões. Ela é mulher do presidente estadual do PTB em São Paulo, o deputado estadual Campos Machado.

Também foi bem aquinhoada a candidata a deputada Pollyana Macedo (PP-CE). Ela é mulher do deputado federal Macedo (PP-CE), que desistiu de disputar a reeleição por estar inelegível.

Outro caso de deputado que não disputou a reeleição, mas repassou o seu espólio do fundo partidário, foi o atual ministro das Cidades, Alexandre Baldy (PP-GO). Ele apoiou seu assessor parlamenta­r Adriano Avelar (PP-GO), que adotou como nome de urna Adriano do Baldy e ficou com R$ 1,9 milhão.

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