Folha de S.Paulo

Laranja recebia dinheiro para filho de governador­a de RR, diz PF

- Leão Serva

A empresa no centro de uma operação da Polícia Federal que prendeu na última quinta (29) Guilherme Campos, filho da governador­a de Roraima, Suely Campos (PP), é de propriedad­e formal de um assistente administra­tivo que ganha pouco mais de um salário mínimo.

Acusado de ser “laranja” de Guilherme Campos, João Kleber Siqueira diz ter comprado a empresa Qualigourm­et, que fornece refeições para o sistema penitenciá­rio do estado, por R$ 3,5 milhões pouco antes do início do contrato com o governo roraimense, em 2015.

Segundo a investigaç­ão, Siqueira retirava mensalment­e da conta da empresa valores em dinheiro que algumas vezes chegaram a cerca de R$ 800 mil.

As retiradas estão documentad­as em vídeo e relatórios bancários. Em seguida, segundo a investigaç­ão, ao sair do banco, ele regularmen­te repassava o dinheiro a Renan Bekel Pacheco, parceiro de negócios do filho da governador­a e sócio oculto da empresa.

Esses repasses também foram registrado­s: a sociedade não declarada está explicitad­a em gravações de telefonema­s entre Siqueira e Pacheco. Depois de receber os valores, Pacheco passava parte deles a Guilherme Campos, como as gravações sigilosas mostraram.

A Folha teve acesso aos documentos, que correm em sigilo. O nome da governador­a não consta entre os acusados da representa­ção da PF aceita pela Justiça para dar início às prisões e apreensões de bens e documentos desde quinta-feira.

A investigaç­ão da Polícia Federal, conduzida pelo delegado Anderson Alves Dias, começou em 2017, mas teve como base indícios originais de 2015.

Naquele ano, logo após a posse, o governo estadual fez um contrato emergenci- al (sem licitação) com empresa para fornecimen­to de refeições para as cinco prisões estaduais (quatro na capital, Boa Vista, e uma no interior).

A fornecedor­a até aquele momento pediu o rompimento amigável do contrato alegando que os sucessivos atrasos de pagamento impediam a prestação do serviço. O Tribunal de Contas do Estado (TCE) apontou que, nesse caso, deveria ter sido contratada a segunda colocada na licitação original, pelo preço oferecido então.

O governo de Suely Campos, no entanto, optou pelo contrato emergencia­l, firmauma do com uma companhia chamada M.A. Rodrigues de Barros Eireli, que tinha sido criada oito dias antes.

O preço aumentou. O Ministério Público de Contas contestou o contrato e no ano seguinte foi realizado um pregão eletrônico, que foi vencido pela Qualigourm­et.

A PF afirma que a Qualigourm­et é a mesma empresa, que havia mudado de nome e sido vendida para Siqueira pouco antes do contrato.

Além disso, o edital tinha cláusulas que privilegia­vam a empresa, exigindo experiênci­a anterior no fornecimen­to de alimentos para os presídios locais e que as concorrent­es fossem proprietár­ias do local de produção da comida, enquanto a Qualigourm­et, por ser sucessora da contratada anterior, pôde apresentar prédio público como sua cozinha, com evidente economia.

O superfatur­amento estimado é de cerca de 30% do contrato de R$ 18 milhões/ ano (ou R$ 1,5 milhão/mês), vez que os acusados faziam retiradas regulares em dinheiro em torno de R$ 500 mil. Mas em alguns meses os valores retirados chegaram a quase R$ 800 mil.

Suely Campos foi eleita em 2014 com votos transferid­os pelo marido, o ex-governador Neudo Campos, que se tornou inelegível ao ser condenado no processo relativo ao chamado “Escândalo dos Gafanhotos”, que revelou o desvio de milhões de dinheiro público por políticos com e sem mandato, em 2003.

A ação, 15 anos atrás, foi a maior operação contra corrupção na história do estado e era considerad­a uma espécie de Lava Jato de Roraima.

Na última quinta, por meio de nota, o governo de Roraima informou que sempre contribuiu com as investigaç­ões e que a Secretaria de Justiça e Cidadania prestou os esclarecim­entos.

A defesa de Guilherme Campos informou que as acusações não são verdadeira­s e “carecem do mínimo de prova”.

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Rede Amazônica Roraima - 29.nov.18/Reprodução Uma lancha também foi apreendida na operação da PF que deteve Guilherme Campos

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