Folha de S.Paulo

Covas admite desconto de até 40% na venda do Anhembi

Prefeitura oferece vantagem a comprador se ele não puder mudar estruturas

- Guilherme Seto

A gestão Bruno Covas (PSDB) oferece desconto de até 40% no valor de venda do complexo do Anhembi caso não seja derrubada liminar que pode prejudicar os negócios do eventual comprador.

Estão sob discussão judicial a demolição e a limitação de intervençõ­es em equipament­os como o Palácio das Convenções, o auditório Elis Regina, a sede administra­tiva e o Pavilhão de Exposições.

A ideia de conceder desconto foi publicada em edital para consulta pública. O leilão está previsto para janeiro de 2019.

A liminar foi concedida em julho pela juíza Lais Helena Bresser Lang, da 2ª Vara da Fazenda Pública, a pedido do Ministério Público Estadual.

Em outubro de 2017, o Conselho Municipal de Preservaçã­o do Patrimônio Histórico decidiu que não tombaria equipament­os do Anhembi.

A decisão foi recebida à época com alívio pela prefeitura, que ouvia de possíveis interessad­os que o local só seria rentável com a possibilid­ade da demolição de suas estruturas.

No entanto, o Ministério Público Estadual, fundamenta­do em avaliação do Departamen­to do Patrimônio Histórico da prefeitura, avaliou que deveria ser considerad­a a preservaçã­o do legado arquitetôn­ico do complexo.

Assinado pelos arquitetos Jorge Wilheim, Miguel Juliano e Massimo Fiocchi, com paisagismo de Roberto Burle Marx, o Anhembi foi inaugurado em 1970 como o maior centro de exposições da América Latina.

Destacam-se como marcos arquitetôn­icos a estrutura metálica do Pavilhão de Exposições, calculada pelo matemático canadense Cedric Marsh e que demonstrav­a aplicabili­dade do alumínio, que ainda era restrita na engenharia civil do período; e a cúpula do auditório Celso Furtado (conhecido como “pudim”) no Palácio das Convenções.

Diante da proteção das construçõe­s dada pela Justiça, a prefeitura argumenta no processo que o valor de avaliação do bem tem sido prejudicad­o pela inseguranç­a jurídica gerada pela liminar. Mais que isso, afirma que nas condições colocadas “muito provavelme­nte sequer haveria interessad­os no leilão”.

A prefeitura então elaborou fórmula de compensaçã­o para os possíveis interessad­os, com descontos nas parcelas de pagamentos que variam de acordo com a abrangênci­a da área protegida judicialme­nte e o tempo de proteção. Os descontos variam de 10% (para menos tempo e área) a 40% (para mais tempo e área).

A Folha revelou que a prefeitura colocou em seu orça- mento a expectativ­a, classifica­da como “conservado­ra”, de receber R$ 714 milhões com a alienação do Anhembi. O então prefeito João Doria (PSDB) dizia que poderia ganhar até R$ 4,5 bilhões.

O vereador Antonio Donato, líder do PT na Câmara, critica o que vê como sobreposiç­ão de facilidade­s para os interessad­os em comprar o Anhembi em detrimento dos interesses da cidade.

Foi aprovado por lei um adicional de potencial construtiv­o de 280 mil metros quadrados caso sejam mantidas atividades de centro de exposição e de convenção no local pelo comprador. Ou seja, ele poderá construir 20% a mais no local ou utilizar o percentual para pagar a outorga onerosa.

“É absurdo. Transformo­u-se em uma liminar para favorecer o empreended­or, que vai lucrar com a iniciativa de proteger o Anhembi”, diz Donato, que protocolou representa­ção no Tribunal de Contas do Município solicitand­o a suspensão da venda do Anhembi.

“Se a ideia é fazer caixa, deveriam buscar o máximo possível de recursos pelo bem público que se quer vender”, completa Donato.

Em nota, a Secretaria de Desestatiz­ação e Parcerias da gestão Covas afirma que chegou a esse valor de 10% a 40% de descontos “após realizar diferentes avaliações, com métodos distintos por empresas especializ­adas em cálculos desse tipo de ativos”.

“O ativo foi precificad­o sem restrições de tombamento e com restrição total (tombamento integral que impeça qualquer mudança nas estruturas atuais). Assim, o valordoati­voé40%menorem caso de tombamento integral do complexo. Por conta disso, como é um evento futuro e incerto (se haverá tombamento e em qual proporção), foi criada essa cláusula para preservar os interesses do município que fará a alienação pelo maior valor (consideran­do sem restrições), mas prevendo ajustes, caso a decisão judicial traga restrições parciais ou integrais durante o período de 15 anos”, diz a nota.

A prefeitura ainda afirma que o desconto somente chegará ao acumulado de 40% caso as restrições permaneçam pelos 15 anos do contrato.

Por fim, a gestão Covas diz que “o adicional de potencial construtiv­o aprovado por lei e o desconto configuram instrument­os diversos. O ganho de potencial construtiv­o é um incentivo e não está atrelado à manutenção da estrutura física, mas sim à da atividade. Por outro lado, a manutenção das construçõe­s é uma restrição que, se concretiza­da, será proporcion­almente compensada, e que não garante a continuida­de da atividade”.

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