Futuro ambiental projetado para país esbarra em ideias de Jair Bolsonaro
Desmatamento zero, código florestal com implementação avançada e agropecuária de baixo carbono, ou seja, que não agrava o aquecimento global. Esse cenário faz parte da visão de um grupo de organizações agropecuárias e ambientalistas para as próximas décadas no Brasil.
Em contraste com o panorama, a desistência do país de sediar em 2019 a COP-25, conferência da ONU sobre o clima —decisão que teve participação do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL)—, causa preocupação em grupos como a Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, que congrega 180 entidades acadêmicas, ambientalistas e do agronegócio.
Nesta segunda (3), em paralelo ao início da primeira semana de trabalhos na COP-24, na Polônia, a Coalizão lança um documento (“Visão 20302050 - O Futuro das Florestas e da Agricultura no Brasil”) que visa fomentar o debate sobre o uso da terra no Brasil.
“No século 21, produção agropecuária e conservação ambiental devem andar juntas, lado a lado”, diz o documento, segundo o qual a atividade agropecuária, mesmo sendo a maior emissora brasileira de gases-estufa, pode contribuir para redução das emissões nacionais e até mesmo para a captura de carbono.
Isso poderia ser feito com manejo de áreas degradadas ou subutilizadas, em vez do avanço de pastagens sobre áreas de floresta.
Após a assinatura do protocolo de Kyoto, primeiro pacto para redução de emissões, em cerca de 15 anos, a Europa movimentou mais de R$ 1,5 trilhão no mercado de carbono.
“Eles criaram um esquema de trocas de crédito e comercialização de carbono que permitiu alavancar investimentos para modernizar sistemas produtivos que tinham altas taxas de emissão”, diz André Guimarães, diretor do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia e integrante da Coalizão. Para ele, nos próximos anos deve haver atenção especial a esse mercado.
As sinalizações de Bolsonaro, como as ameaças de deixar o Acordo de Paris, preocupam o setor agropecuário.
O presidente eleito tem dito que o acordo é uma ingerência estrangeira no país, especialmente no controle da Amazônia. Questionado sobre quais cláusulas afetariam a soberania nacional, o candidato disse em outubro que se tratavam de coisas “nos bastidores”.
“O Brasil fez um esforço na questão do clima, temos compromissos que fizemos em Paris. Se virarmos as costas para isso, mandamos um sinal muito ruim para o exterior e também internamente”, diz Luiz Cornacchioni, da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), também integrante da Coalizão Brasil. “Não deveríamos trazer essa conta para nós. Vai ficar cara.”
O diretor da Abag diz que a sustentabilidade é uma demanda do mercado mundial e que o agronegócio brasileiro não avançará sem esse componente. “Se você sacar essa variável, a equação não fecha.”
Guimarães afirma que, nos próximos meses, espera haver maior diálogo entre as organizações e o governo eleito.
É praxe que COPs sejam realizadas em diferentes regiões do mundo e cabe a um país da América Latina e Caribe a sede em 2019. O Brasil anunciou sua candidatura há um ano, na COP-23. O anúncio da próxima sede deve acontecer no fim do evento na Polônia.