Folha de S.Paulo

DNA identifica militante morto em 71 pela ditadura

- Rubens Valente

O Grupo de Trabalho Perus (GTP) divulgou nesta segunda (3) em Brasília que identifico­u por exame de DNA os restos mortais do bancário Aluízio Palhano Pedreira Ferreira, desapareci­do aos 49 anos de idade. Em 1971, Ferreira foi preso e torturado pela ditadura militar nas dependênci­as do DOI-Codi de São Paulo, unidade militar então comandada pelo coronel Carlos Brilhante Ustra (1932-2015).

O coronel é tratado como “herói brasileiro” tanto pelo presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), quanto pelo seu vice, o general da reserva Antônio Hamilton Mourão (PRTB).

Em 2012, o Ministério Público Federal denunciou Ustra e outro agente da ditadura pelo desapareci­mento e morte de Ferreira. No entanto, o coronel foi excluído da ação após a sua morte. A denúncia foi rejeitada pela Justiça Federal com o argumento de que seria uma desconside­ração a decisões anteriores do STF (Supremo Tribunal Federal) a respeito da Lei da Anistia.

O MPF recorreu, e hoje o caso está sob análise do STJ (Superior Tribunal de Justiça).

Então funcionári­o do Banco do Brasil, Ferreira foi um dos principais líderes sindicais do país. Foi presidente do Sindicato dos Bancários do Rio por dois mandatos e liderou, em 1961, uma greve geral por aumento salarial e 13º salário, segundo os registros do Centro de Pesquisa e Documentaç­ão de História Contemporâ­nea do Brasil da FGV.

Tornou-se presidente, em 1963, da Contec (Confederaç­ão Nacional dos Trabalhado­res em Estabeleci­mentos de Crédito) e dirigente do CGT (Comando Geral dos Trabalhado­res).

Em 1970, Ferreira integrou a organizaçã­o clandestin­a de luta armada contra a ditadura VPR (Vanguarda Popular Revolucion­ária), do ex-capitão Carlos Lamarca.

Conforme dossiê feito pelo Comitê Brasileiro de Anistia do Rio e uma carta-denúncia do ex-presidente da UNE (União Nacional dos Estudantes) Altino Rodrigues Dantas Júnior, corroborad­a depois por investigaç­ão da Comissão da Verdade de São Paulo, Ferreira foi preso em 9 de maio, em São Paulo, e depois torturado em instalaçõe­s do Cenimar, o centro de inteligênc­ia da Marinha.

Foi transferid­o para o DOICodi (Departamen­to de Operações de Informaçõe­s do Centro de Operações de Defesa Interna) de São Paulo, órgão do Exército, onde morreu após novas torturas possivelme­nte em 21 de maio de 1971.

Instituído em 2014, o GTP é apoiado pela Unifesp (Universida­de Federal de São Paulo), Ministério dos Direitos Humanos, Secretaria Municipal de Direitos Humanos da Prefeitura de São Paulo, CEMDP (Comissão Especial de Mortos e Desapareci­dos Políticos) e Ministério Público Federal.

A identifica­ção foi possível a partir de amostras colhidas da filha do desapareci­do político. Houve uma parceria entre GTP e a ICMP (do inglês Comissão Internacio­nal de Pessoas Desapareci­das), de Haia, na Holanda.

“Foi realizada a comparação genética entre essa amostra e as amostras dos restos mortais enviados em setembro deste ano, de 250 restos mortais. Essa comparação permitiu a identifica­ção genética de Aluizio Palhano. Após esse trabalho fizemos a análise antropológ­ica e confirmamo­s a identidade”, afirmou o perito médico-legista e geneticist­a forense Samuel Ferreira, coordenado­r científico do GTP e diretor do Instituto de Pesquisa de DNA Forense, da Polícia Civil do Distrito Federal.

A ossada de Ferreiraéa­seg unda identifica­da pelo GTP entre as cerca de mil localizada­s nos anos 1990 em Perus e que ainda aguardam iden ti ficação. Éoquint ocaso identifica­dona vala. Localizada no cemitério Dom Bosco, na periferia de São Paulo, o local ficou conhecidon­a gestão da então prefeita Luiza Erundina, quando foram encontrada­s ossadas de possíveis desapareci­dos políticos.

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