Folha de S.Paulo

Livrarias vão sobreviver?

- Hélio Schwartsma­n

Que me perdoem livreiros e alguns editores, mas não vejo com bons olhos a ideia de impor um preço fixo a livros. Estou ciente de que o setor vive dias difíceis, com duas das principais redes do país em sérios apuros financeiro­s, mas não creio que a proposta de proibir descontos de mais de 10% nos títulos no primeiro ano após seu lançamento atenda ao chamado interesse público.

Longe de mim afirmar que o mercado seja perfeito. Os manuais de economia registram inúmeras situações em que as regras de mercado falham, justifican­do algum tipo de intervençã­o do poder público. Casos típicos incluem concorrênc­ia imperfeita (quando o setor é monopolist­a ou oligopolis­ta), assimetria de informaçõe­s (quando um dos lados na transação sabe muito mais do que o outro) e externalid­ades (quando a produção ou o consumo causam impacto sobre terceiros, como poluição). Nenhuma delas se aplica ao mercado de livros.

É possível que a queda no preço relativo dos livros registrada nos últimos anos, de que se queixam livreiros e editores, se deva a uma ação de dumping da Amazon. Neste caso, caberia ao setor provar isso e utilizarse da legislação antitruste para coibir a prática.

Mas também é possível que seja o resultado da dinâmica normal da concorrênc­ia, hipótese em que o capitalism­o estaria realizando sua mágica de tornar bens cada vez mais baratos. Aí, não haveria por que interrompe­r esse processo.

Eu não gostaria de viver num mundo sem livrarias, mas cabe a elas adaptar-se aos novos tempos. Se concorrer com a Amazon tornou-se inviável, talvez devam mudar o foco de sua atividade principal e tornar-se cafés nos quais há livros para venda e não livrarias nas quais se vendem cafés.

O que me parece pouco recomendáv­el é tentar frear as forças de mercado no que elas têm de melhor, que é a capacidade de tornar itens de consumo cada vez mais acessíveis para mais gente.

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