Folha de S.Paulo

Grafite com beijo entre Bolsonaro e Donald Trump é apagado no Ceará

- Marcel Rizzo

O grafite feito por Yuri Sousa, 21, não durou 48 horas. A cena desenhada no dia 25 de novembro chamava a atenção: o presidente eleito, Jair Bolsonaro, dava um beijo na boca do presidente dos EUA, Donald Trump. Alguém parece não ter gostado e passou por cima uma tinta azul, apagando a obra do artista que demorou quase nove horas para ficar pronta.

“Desconfio quem possa ter sido”, disse Sousa, conhecido no meio dos artistas urbanos do Ceará como Bad Boy Preto. O muro escolhido para a arte ficava em uma alameda em que há outros grafites, na ligação entre duas ruas no bairro Jereissati 1 em Maracanaú, na região metropolit­ana de Fortaleza.

A prefeitura informou, por meio da assessoria de comunicaçã­o, que não teve nada a ver com o ocorrido. Quem apagou, acredita Sousa, fez porque não gostou do que viu e, claro, a desconfian­ça recai sobre apoiadores de Bolsonaro. Maracanaú tem 226 mil habitantes eéaquart acidade mais populosa do Ceará. Foi também umadas que Bolsonaro teve melhor votação no Estado, com 39,3% dos votos válidos —o total no Ceará foi de 28,89% para Bolsonaro, que perdeu para Fernando Haddad (PT) em todas os municípios.

“Eu vi uma vez um desenho do Putin [também beijando Trump, feito em 2016 pelo designer gráfico lituano Mindaugas Bonano]. Associei o Bolsonaro e o Trump, pensei o que eles falavam, algumas críticas ao homossexua­lismo, e veio a ideia. Foi uma maneira de criticar”, contou Sousa.

Enquanto pintava, o artista lembra que uma pessoa passou filmando, questionan­do o motivo de fazer aquilo. Não há certeza se seria a culpada por apagar a obra, e não há câmeras na localidade que possam identifica­r o autor.

Yuri Sousa a publicou fotos da imagem em sua página em uma rede social, mas começou a receber dezenas de mensagens críticas, algumas ameaças, e a surpresa: na segunda (3) o Instagram bloqueou sua conta (segundo ele porque seu perfil foi denunciado por apoiadores do presidente eleito). Outras perfis na internet a reproduzir­am e viralizou.

“Fiquei chateado porque nunca tive um grafite apagado e eu o desenhei em cima de um outro que havia feito no ano retrasado. Mas, como teve um tema político, sabia que podia mexer mais com as pessoas”, afirmou.

Bolsonaro tem se alinhado a ideias apoiadas por Trump e tentará aproximar os dois governos. Recentemen­te um dos filhos do presidente eleito, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), viajou aos EUA e apareceu com um boné onde se lia “Trump 2020”, já em alusão a uma possível campanha de reeleição do americano daqui a dois anos.

O beijo entre Bolsonaro e Trump do artista cearense remeteu também a um famoso desenho do russo Dmitri Vrubel, feito em 1990 no recémderru­bado Muro de Berlim, que retratava um beijo dado pelos líderes da União Soviética, Leonid Brejne, e da Alemanha Oriental, Erich Honecker, em 1979. Batizado de “Meu Deus, Ajuda-me a Sobreviver a Este Amor Mortal”, foi um dos grafites mais conhecidos de todos os pintados no muro que dividia a Alemanha.

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