Folha de S.Paulo

Brasil está entre os países que mais perdem dinheiro com mudanças climáticas

Prejuízo anual devido a eventos como tempestade­s e inundações no país chega a R$ 6,4 bi; efeitos indiretos não foram contabiliz­ados

- Ana Carolina Amaral Carlos Garcia Rawlins - 26.set.17/Reuters A jornalista viajou a convite da ONG Bread for the World

O Brasil está entre os 18 países com mais perdas econômicas decorrente­s de desastres climáticos. O ranking foi apresentad­o nesta terça (4) na COP-24 do Clima pela organizaçã­o alemã Germanwatc­h, que reúne dados climáticos e socioeconô­micos de 181 países.

Embora no ranking geral o país figure longe do topo dos mais vulnerávei­s ao clima, aparecendo na 79ª posição em 2017 e na 90ª posição na média de 1998 para cá, o Brasil alcança a 18ª posição no ranking dos que mais perdem economicam­ente com as mudanças climáticas.

As perdas anuais passam de US$ 1,7 bilhão (R$ 6,4 bilhões) ao ano devido a eventos extremos como tempestade­s e inundações, na média dos últimos vinte anos.

O ranking contabiliz­a os prejuízos diretament­e causados por desastres climáticos —tempestade­s, inundações, ciclones, furacões, ondas de calor etc— incluindo mortes e perdas econômicas, respectiva­mente comparados com o tamanho da população e o PIB cada país.

Com isso, o cálculo considera não só a exposição geográfica a fenômenos extremos, mas também a capacidade de resposta a eles. “As mudanças climáticas se manifestam localmente de formas muito diferentes e o preparo de cada país para antecipar a ocorrência dos fenômenos e responder a eles faz a diferença no ranking”, conta à Folha o principal autor do estudo, David Eckstein.

“Não é do interesse do próprio país negar que as mudanças climáticas estão acontecend­o. Se ignorar os fatos, Brasil pode ficar mais vulnerável”, afirma Eckstein. “Embora os países mais pobres sofram mais por não terem condições de se preparar para os fenômenos e para se recuperar deles, países que ignoram as mudanças climáticas também podem ter altos prejuízos, como os Estados Unidos tiveram”. Apenas os furacões que atingiram a costa leste do país em 2017 causaram um prejuízo recorde de U$S 200 bilhões (R$ 760 bilhões).

A situação pode ser mais grave para o Brasil do que o ranking sugere, segundo Eckstein. Ele diz que os países africanos e o Brasil estão sub-representa­dos, pois o ranking só calcula perdas diretas e não inclui fenômenos como a seca, que implica prejuízos indiretos, como no abastecime­nto de água e na agricultur­a.

Para o climatolog­ista do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) e um dos colaborado­res do Painel Intergover­namental de Mudanças Climáticas da ONU, Carlos Nobre, os extremos climáticos se acentuaram muito no Brasil nos últimos doze anos.

Ele contabiliz­a três secas que bateram recordes históricos na Amazônia nos anos de 2005, 2010 e 2015. A região também sofreu com inundações mais intensas em 2009 e 2012. Já o Nordeste, ainda segundo Nobre, viveu o pior ciclo de chuvas da História entre 2012 e 2017, desde que as medições se iniciaram, no final do século 19.

O Sudeste também viveu a pior seca do registro histórico em 2014. No mesmo período, Brasília também viveu sua seca mais grave, em 2016.

“A seca afeta a macroecono­mia: o agronegóci­o, a segurança alimentar, o abastecime­nto hídrico e geração de energia elétrica”, lista Nobre. “Mas o que causa mais mortes é o excesso de chuvas, com deslizes de terra e inundações”. Esses desastres causam cerca de 145 mil mortes por ano no Brasil, segundo o ranking.

No topo do ranking de 2017 estão Porto Rico, Sri Lanka e Dominica. Os três países foram afetados pela temporada de furacões no Atlântico. Dos 30 países mais vulnerávei­s a desastres em 2017, dez foram afetados por ciclones tropicais, incluindo os EUA.

No entanto, a maioria dos mais vulnerávei­s são considerad­os países em desenvolvi­mento. Haiti, Filipinas e Paquistão são os países mais presentes no topo do ranking anuais e também na média dos últimos vinte anos.

O relatório menciona estudos recentes que apontam clara relação entre as mudanças climáticas causadas pelo aumento das emissões de gasesestuf­a e os recordes na intensidad­e dos furacões de 2017. Os estudos também sugerem que o número de ciclones tropicais severos deve crescer conforme o aumento da temperatur­a média global.

Entre as sugestões de políticas que podem ser adotadas para lidar com os eventos extremos, o relatório traz o exemplo dos seguros regionais: um fundo criado por países em regiões vulnerávei­s já colhe contribuiç­ões de cada nação para casos de emergência. Reunidos no fundo, os países do Caribe e da América Central providenci­aram U$S 19 bilhões para a ilha de Dominica apenas 14 dias após a ocorrência do furacão Maria.

Na COP-24, negocia-se como operar compensaçõ­es por perdas e danos e como financiar a adaptação aos efeitos das mudanças do clima nos países em desenvolvi­mento.

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Homem carrega água em área atingida pelo furacão Maria, em Porto Rico

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