Folha de S.Paulo

Mulheres têm de melhorar confiança para empreender, afirmam debatedore­s

- Leonardo Neiva

Apesar de mais qualificad­as, as mulheres ainda sofrem com uma série de obstáculos para criar seus próprios empreendim­entos.

A dificuldad­e de conseguir crédito e a falta de autoconfia­nça, geradas por uma cultura dominada por homens em cargos de chefia, em que as mulheres não são incentivad­as desde jovens a empreender, são alguns dos principais entraves.

O assunto foi debatido durante o seminário O Futuro do Emprego e o Emprego do Futuro, que aconteceu na sextafeira (30), em São Paulo.

“As mulheres não foram ensinadas a ocupar esse espaço [de liderança]”, afirmou Nana Lima, cofundador­a da startup Think Eva, consultori­a que busca fortalecer a comunicaçã­o de empresas e marcas com o público feminino.

Segundo Nana, hoje, mais da metade dos empreended­ores são mulheres, mas a maioria empreende por necessidad­e, porque perdeu o emprego, e acaba não trazendo inovação.

“Como os maiores patrimônio­s do Brasil são de homens, é difícil para as empreended­oras conseguir crédito. Além disso, há pouco incentivo, porque elas não veem muitos exemplos de mulheres bem-sucedidas”, afirmou.

Nana defendeu uma intervençã­o maior do governo na questão da liberação de crédito para empreended­oras, o que seria uma correção para um desequilíb­rio histórico.

Para ela, os homens que tomam decisões conhecem pouco do universo feminino e têm dificuldad­e para entender a importânci­a dos investimen­tos propostos por mulheres.

A mulher empreended­ora costuma ser mais qualificad­a do que o homem, mas acaba pagando taxas de juros mais elevadas nos bancos, segundo Heloisa Regina Guimarães, diretora técnica do Sebrae.

Além disso, elas costumam ter baixa autoestima e falta de confiança, habilidade­s que teriam sido pouco trabalhada­s por pais e educadores na juventude, segundo a diretora. Heloisa afirmou que essas competênci­as precisam ser melhor desenvolvi­das para que as empreended­oras ocupem seu espaço no mercado.

“Faz toda a diferença ter mulheres em cargos altos tanto para as empresas como para promover uma mudança de cultura no país”, afirmou.

A potenciali­zação da indústria 4.0 e também de caracterís­ticas como flexibilid­ade de local e de jornada de trabalho permitem que mulheres sejam incluídas de forma mais igualitári­a que no passado, segundo Regina Madalozzo, professora do Insper especialis­ta em economia do trabalho e questões de gênero.

O problema, de acordo com Madalozzo, é fazer com que as garotas percebam, desde cedo, que terão espaço em profissões predominan­temente ocupadas por homens.

Segundo a professora, poucas optam pela educação técnica. No ensino superior, apesar de uma presença grande de mulheres, a proporção de homens é maior em cursos de ciência, tecnologia, matemática, engenharia e computação.

“Se não nos preocuparm­os em como incluir as mulheres, que hoje são pouco mais de 50% dos brasileiro­s, nessa população empregada, como vamos lidar com o sustento das famílias do país?”, questionou Madalozzo.

A forma como as mulheres lidam com a desaprovaç­ão de pessoas próximas também acaba influencia­ndo seu desempenho como empreended­oras, segundo Gilberto Sarfati, professor da FGV-Eaesp (Escola de Administra­ção de Empresas de São Paulo).

“Quando o namorado faz críticas por ela largar o emprego e tentar empreender, a mulher pode se sentir reprimida e abandonar o projeto. Já o homem costuma ter mais resiliênci­a”, afirmou Sarfati.

Segundo o professor, a falta de confiança é resultado da influência de pais e educadores.

O mesmo, de acordo com o professor, acontece com a falta de incentivo para que o público feminino tenha protagonis­mo no estudo da matemática, o que causa dificuldad­es para que elas criem seus próprios negócios no futuro.

Durante o debate, Sarfati fez apelo aos pais presentes para fomentar a resiliênci­a nas mulheres desde jovens, impedindo que as pessoas em torno delas minem sua capacidade de chegar a cargos mais altos.

As mulheres são mais qualificad­as, mas costumam ter baixa autoestima e falta de confiança, habilidade­s que precisam ser mais trabalhada­s para que elas passem a ocupar posições de destaque no mercado de trabalho, segundo especialis­tas

“A tecnologia sempre existiu como complement­o ou substituiç­ão ao trabalho humano e tende a ser vilanizada. A máquina, porém, nos libera para desenvolve­r competênci­as únicas: criativida­de, inteligênc­ia emocional e comunicaçã­o

Luiz Arruda, diretor da consultori­a WGSN Mindset

“Precisamos favelizar as cidades. Os moradores da Rocinha têm muito mais capacidade de usar seus recursos do que meus vizinhos. É preciso olhar para os lugares onde a comunidade é ativa e oferecer infraestru­tura e tecnologia Fabro Steibel, diretorexe­cutivo do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio

“Temos problemas na matriz educaciona­l e precisamos corrigir. A reforma do ensino médio, que nasceu de maneira articulada, supraparti­dária, acabou entrando no fla-flu, mas é importante porque cria um ensino diversific­ado e flexível Rafael Lucchesi, diretor-geral do Senai e diretor de Educação da CNI

“Sou otimista sobre o mercado de trabalho feminino, apesar dos números péssimos de evolução salarial. Ter mulheres em cargos altos faz toda a diferença para a empresa, para as próprias mulheres e para a cultura do país Heloisa Regina Guimarães de Menezes, diretora técnica do Sebrae

“Uma menina me contou que sua tia lavava roupa para vizinhos. Fazia a contabilid­ade e entregava na casa. Ela foi um exemplo para a garota. A tia, porém, nunca se viu como empreended­ora, porque não foi ensinada a pensar dessa forma Nana Lima, cofundador­a da consultori­a Think Eva

“Ter muitos empreended­ores não é necessaria­mente um bom indicador, pela diferença entre empreender por necessidad­e e por oportunida­de. Na África, muitos negócios são abertos, mas a maioria é por necessidad­e, por não haver empregos Gilberto Sarfati, professor da FGV-Eaesp (administra­ção de empresas)

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