Para alimentar 10 bi em 2050 consumo de carne deve cair
Estudo diz que deve haver redução de consumo e aumento da produtividade
Para alimentar uma população que pode chegar a 10 bilhões de pessoas em 2050, será necessário quadruplicar a produtividade agropecuária e reduzir a demanda por carne entre seus maiores consumidores, entre eles o Brasil.
É o que diz o relatório lançado nesta quarta (5) pelo World Resources Institute (WRI) na COP-24 do Clima, em Katowice, na Polônia.
“Como alimentar o mundo sem destruí-lo é a grande questão desta metade do século”, diz Craig Hanson, um dos autores do documento e vice-presidente de Alimentos, Florestas, Água e Oceanos do WRI, .
O estudo analisou soluções para responder a três desafios principais: a segurança alimentar de 10 bilhões de pessoas em 2050, a redução das emissões de gases-estufa e o controle da expansão das terras agrícolas sobre áreas de preservação.
Para tanto, o relatório aponta um caminho que passa por novas políticas públicas, iniciativas de mercado, avanços tecnológicos e mudanças no padrão de consumo de carne —já que ruminantes como boi, cordeiro e cabra requerem dois terços da terra agrícola global e contribuem com aproximadamente metade de todas as emissões da agricultura e da mudança de uso da terra, segundo o trabalho.
“O mundo não precisa se tornar vegetariano, mas deve moderar o consumo de carne”, afirma Hanson.
A proposta do estudo é frear a projeção atual de crescimento de 88% na produção de carne de ruminantes até 2050, na comparação com 2010.
Para isso, será necessário que os maiores consumidores de carne do mundo —especialmente em países como Brasil, Estados Unidos e Rússia, totalizando 20% da população mundial— limitem sua dieta a 40% da quantidade de carne que costumavam comer em 2010.
Além disso, o relatório alerta para a necessidade de pelo menos dobrar ou até quadruplicar a produtividade agrícola, para evitar a expansão sobre áreas preservadas, evitando aumento das emissões de carbono e também de perdas na biodiversidade.
Essa conclusão parte de um novo diagnóstico, que alerta para uma ameaça às florestas tropicais maior do que se imaginava até então.
“As áreas agrícolas não estão apenas se expandindo, mas mudando de uma região para outra, de áreas temperadas para os trópicos”, afirma o documento, implicando o avanço da agricultura sobre as terras em grandes florestas tropicais ricas em biodiversidade e carbono, ou seja, cuja devastação gera liberação do poluente na atmosfera.
O relatório não faz recomendações específicas aos países e não cita o Brasil, maior exportador de carne bovina do mundo. À Folha, o autor do estudo afirmou que o Brasil tem grande potencial de expandir sua produção no território já explorado, sem ameaçar a Amazônia.
Para mudar essa trajetória, seria preciso criar programas de incentivo para ajudar a estruturar uma agricultura que preserva as florestas, diz a especialista em florestas do Pnud (Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas), Nicole DeSantis.
Outras possíveis ações incluem investimento tecnológico para o desenvolvimento agrícola, programas de aquicultura sustentável para a criação de peixes e incentivos à agricultura de baixo carbono.
“O Brasil tem um bom começo com o programa ABC (Agricultura de Baixo Carbono, do Governo Federal), essa direção precisa ser mais incentivada”, afirma à reportagem o economista de agricultura do Banco Mundial, Tobias Baedeker.
ONGs criticam e ‘premiam’ Brasil com Fóssil do Dia na COP
As organizações que acompanham as negociações da COP-24 do Clima manifestaram nesta quarta (5) suas críticas às mudanças na postura brasileira anunciadas nas últimas semanas, como a desistência de sediar a COP-25 em 2019 e a possibilidade de deixar o Acordo de Paris, considerada pelo presidente eleito, Jair Bolsonaro.
“O Brasil, local de nascimento da agência de clima da ONU e até então um mediador confiável das negociações do Acordo de Paris, está para se tornar um dos tratantes mundiais do clima”, critica o artigo publicado hoje no Eco, jornal que circula diariamente na COP, editado pela rede de ONGs Climate Action Network (CAN).
As mais de mil ONGs membros da rede votam a cada dia da COP para eleger o ganhador do prêmio Fóssil do Dia, que chama atenção para países que tentam travar as negociações ou que adotam políticas contrárias às previstas no Acordo de Paris. Nesta quarta o prêmio foi dedicado ao Brasil.
O país dividiu o primeiro lugar com a Arábia Saudita —país conhecido por dificultar as negociações climáticas e que, agora, leva o prêmio por se colocar contrário a mecanismos de elevação das ambição das metas de Paris.
Já o Brasil leva o troféu irônico pelo conjunto de afirmações de Bolsonaro e seu indicado para o Ministério das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, contrárias ao Acordo de Paris.
“Bolsonaro cancelou a COP-25 no Brasil porque leu algo no WhatsApp [...] isso parece legítimo”, ironiza o texto de justificativa para entrega do prêmio. “Nunca antes na história das COPs um presidente recebeu o prêmio antes mesmo de assumir como chefe de Estado”, comentou Márcio Astrini, coordenador de políticas públicas do Greenpeace no Brasil.
Também nesta quarta foi divulgada na COP-24 uma análise da Climate Action Tracker sobre o conjunto de mudanças para o clima implicado pela eleição de Bolsonaro no Brasil.
A publicação alerta para o alinhamento político de governadores da região amazônica com o presidente eleito, o que poderia acelerar políticas contrárias à preservação na região.
O setor aguarda com expectativa o anúncio do novo ministro do meio ambiente do Brasil, o que, segundo a equipe de transição, deve acontecer nos próximos dias.