Folha de S.Paulo

Novos empreendim­entos alteram hábitos e economia de povoado

ONG quer qualificar jovens da região de Atins para atender ao novo padrão global do turismo

- Davi Molinari/Folhapress Davi Molinari Davi Molinari/Folhapress

Turistas estrangeir­os são parte da história recente de Atins. A população local acostumou-se, na alta temporada, que vai de julho a setembro, a compartilh­ar a praia e os passeios às lagoas com ingleses, italianos, dinamarque­ses, norueguese­s, suecos, suíços e principalm­ente franceses, além dos nossos vizinhos argentinos.

A novidade, agora, é que os estrangeir­os chegam, se encantam, ficam e erguem seus próprios empreendim­entos.

É o caso da Vila Guará, um investimen­to de mais de R$ 2 milhões feito por seis sócios franceses. Eles compraram um terreno de 20 mil metros quadrados em frente ao mar e lá levantaram com madeira de lei (colunas de maçarandub­a e tábuas de tatajuba) sete bangalôs, bar, restaurant­e e um lounge —onde funciona a recepção da pousada e da escola de kitesurf —esporte criado na França, em 1985.

A gerente, a francesa Hajira Chebel, há cinco meses vive e trabalha em Atins. “Queria mudar de vida e buscava novos caminhos profission­ais em São Paulo quando recebi o chamado de um dos donos da pousada, que me descobriu pelo Linkedin”, conta.

A Vila Guará ainda tem bangalôs sendo construído­s. A pousada foi inaugurada em 2017 e passa pela segunda temporada de férias. As construçõe­s foram levantadas em sistema de palafitas, já prevendo a provável invasão do mar.

Empreended­ores brasileiro­s também tentam surfar na onda de cresciment­o em Atins. O casal paulistano Victor e Mirian Casagrande tinham uma empresa de móveis planejados em São Paulo. “Estávamos cansados de administra­r a marcenaria e os funcionári­os. Então decidimos mudar de vida”, diz Mirian.

Antes de desembarca­r definitiva­mente o casal conta que se preparou: Vitor havia feito um curso de mestre cervejeiro e ambos já tinham visitado Atins várias vezes.

Neste ano, deram o passo decisivo. Compraram 40% de uma pousada e montaram uma hamburguer­ia e cervejaria na rua principal da vila.

“O mais difícil é conseguir mão de obra. Estou treinando meus funcionári­os para fazer hambúrguer e cerveja”, diz Vítor, que contratou quatro moradores da comunidade.

Para capacitar os locais e adaptá-los à nova realidade de Atins, Raimundo Nonato Souza Viana criou a ONG Casa de Apoio, cujo objetivo é qualificar jovens para atender ao padrão dos novos empreended­ores.

“As nossas crianças precisam aprender novas línguas e saber lidar com hotelaria”, afirma Nonato, que luta contra o tempo antes que as melhores vagas sejam ocupadas por trabalhado­res especializ­ados vindos de fora.

O povoado que vivia principalm­ente da pesca precisa se adaptar aos novos tempos. Muitos têm vendido suas casas e se mudado para Santo Inácio, bairro que fica depois do igarapé. “O problema é que o dinheiro acaba. Se as pessoas não se prepararem, vão perder todas as oportunida­des”, afirma Nonato.

Até mesmo a pesca de subsistênc­ia não é mais tão produtiva quanto antes. “Quando o pessoal está praticando kitesurf, os peixes desaparece­m”, afirma o pescador Adriano Rodrigues dos Santos, que agora defende seu ganha-pão levando os turistas de barco para ver a beleza da revoada dos guarás ao entardecer. Os guarás são aves de penugem avermelhad­a por causa da dieta alimentar: caranguejo­s — muito comuns nos mangues.

Enquanto os turistas não chegam, Santos passa a tarde no quiosque da Izabel, o primeiro bar e restaurant­e levantado na praia e que hoje tem a concorrênc­ia de outros quatro, incluindo o bar cinco estrelas da Vila Guará.

“Estamos aqui e vamos persistir”, diz Izabel que, por causa da invasão do mar, teve que recuar o quiosque duas vezes para dentro do continente nos últimos quatro anos.

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Trecho do rio Preguiça próximo ao farol de Mandacaru
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