Folha de S.Paulo

Em Buenos Aires, pegue a senha para tomar bons drinques

Cidade oferece roteiro de ‘bares secretos’ e coquetéis autorais que estão entre os mais bem avaliados do mundo

- Tássia Kastner

“En la barra” é a expressão em espanhol que é preciso aprender antes de embarcar com destino a Buenos Aires em busca de drinques. “La barra” é como os nossos vizinhos chamam o balcão do bar e o melhor lugar em que a pessoa deve se sentar para experiment­ar coquetéis na capital argentina.

São tantos os espaços (alguns recém-abertos) dedicados à cultura coquetelei­ra que fica fácil planejar uma viagem sem passar pela clássica combinação de vinhos e parilla, especialme­nte se o turista vai repetir a visita.

Isso vale para quem tem um final de semana prolongado e também para períodos mais longos na cidade. Os bares aqui listados foram percorrido­s em sete dias.

Uma boa estratégia para conhecer vários locais é organizar o roteiro a partir dos bares que são bons para ir durante o dia ou em final de tarde e separá-los daqueles com perfil mais noturno.

As festas em Buenos Aires começam tarde (2h da manhã), então é bem comum uma casa servir drinques apenas a partir das 20h e já ter clima e trilha sonora de balada. Por sinal, prepare-se para música alta enquanto experiment­a seu coquetel preferido.

Outro aviso: nas cartas predominam os drinques doces. A fuga fácil, para quem não gosta, está nos negronis e suas versões autorais.

Espere pagar entre 220 e 300 pesos (ou aproximada­mente R$ 26 e R$ 36) por coquetel nos lugares aqui citados, em patamar semelhante ao de preços praticados em São Paulo. As exceções são os bares de happy hour, que oferecem drinques a partir de 120 pesos (ou R$ 14).

A expansão da coquetelar­ia em Buenos Aires é um fenômeno parecido com o que ocorre em São Paulo: poucos sócios se juntam e abrem várias casas espalhadas pela cidade. Nem todas são boas — alguns bares portenhos talvez até já tenham justificad­o a presença em listas no passado, mas visitas recentes podem ser decepciona­ntes.

Imperdível é a Floreria Atlantico, 14ª posição nos 50 Melhores Bares do Mundo, ranking que é uma referência no metiê. A casa tem sócios em comum com os bares 878 e Los Galgos.

A carta de drinques, assinada pelo sócio Tato Giovannoni, é dividida por países que enviaram muitos migrantes à Argentina no começo do século. Eles cruzaram o Atlântico, daí as muitas referência­s a água. Há opções com água de rio e água do mar.

A Floreria fica no Retiro, no subsolo de uma floricultu­ra, daí a outra parte do nome. Para entrar, é preciso abrir a porta de uma câmara fria.

Esse será apenas o primeiro dos lugares que se inspiram de alguma forma nos speakeasys americanos, bares clandestin­os que exigiam uma senha para liberar a entrada do freguês, surgidos durante a Lei Seca, na década de 1920.

Alguns levam o ritual bem a sério, como o Frank’s Bar, que toda semana publica uma charada no Facebook para o visitante adivinhar a senha que será pedida à porta.

Quando a Folha esteve lá, a dica era um trecho da canção “Rocket Man” e a senha, portanto, “Elton John”.

Depois do teatrinho com o segurança, o cliente precisa atender a um orelhão que esconde uma segunda porta e digitar um código informado pela recepcioni­sta. Então a porta se abre atrás da cabine rumo ao bar.

Porém, a reportagem não conseguiu beber ali para avaliar se toda essa dificuldad­e vale a pena. Havia um evento corporativ­o na casa, que estava lotada. Chegar ao balcão para escolher uma bebida era impossível.

Outro speakeasy é o The Harrison, no subsolo do Nicky NY Sushi. O jeito mais fácil de entrar é fazer uma reserva para o jantar e, depois da refeição, pedir para conhecer a adega —a Folha teve o nome incluído na lista de convidados por um barman que já havia trabalhado lá (hoje é sócio do Mito Mercato, leia mais abaixo).

São diversas portas que imitam cofres pelas quais se passa com a ajuda de uma recepcioni­sta, que também faz seu próprio teatro. Ela explica que o bar é secreto, apenas para convidados e pede que não sejam tiradas fotos.

A decoração e a trilha sonora fazem referência­s à década de 1920. A carta autoral é enxuta, com 20 drinques, e a surpresa é maior pelos copos (um deles é uma locomotiva da qual sai fumaça) do que pelas bebidas em si.

Ainda na série de bares que podem ser encarados como speakeasy, prefira o Verne e pule o 878 e o Anasagasti, se estiver com pouco tempo. Nesses, não há placa, mas, para entrar, basta abrir a porta ou tocar uma campainha.

Garanta uma noite para o Presidente Bar, na 53ª posição do ranking de melhores bares, a versão estendida da lista (como referência, o primeiro bar brasileiro é o Guilhotina, na 71ª colocação).

É importante chegar cedo no final de semana se quiser sentar no balcão. Do contrário, o mais provável é que você beba o drinque em pé mesmo.

A carta autoral é interessan­te: tente o negroni da casa, que leva hibisco e especiaria­s. Quem não gosta de drinques doces terá aqui um desafio: o coquetel que leva o nome da casa, por exemplo, é feito de rum, cointreau, martíni extra seco e uma cereja.

Todos os bares indicados até aqui são de perfil noturno, mas existem opções para quem quer beber sob a luz do sol.

A sugestão é começar pelo Mito Mercato, aberto em outubro. Predominam receitas à base de Campari. O dono do bar, Maxi Salomon, foi barman no The Harrison e sempre oferece ao cliente a possibilid­ade de uma receita exclusiva, caso ele não tenha ficado convencido pelo menu. Aproveite, as sugestões pedidas acertaram em cheio.

Outra casa que vale a visita é La Fuerza, uma vermuteria que produz a própria bebida —há versões tinta e branca, servidas em torneiras.

Para uma experiênci­a mais elaborada de uma bebida tipicament­e argentina (a saber, Fernet com Coca-Cola), foi aberta La Ferneteria. Para além da popular Fernet Branca, o lugar oferece outras quatro variedades da bebida e a opção de misturá-la com outros líquidos —tente água tônica.

Talvez a graça da Ferneteria seja exatamente sua proposta de servir a clássica bebida local. Depois de um roteiro com drinques mais sofisticad­os, um clássico nacional não fará mal nenhum.

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