Folha de S.Paulo

Em busca de apoio, Onyx propõe colocar nome de deputado em placa de obra

Futuro ministro quer aumentar visibilida­de de projetos bancados com emendas; especialis­tas afirmam que plano é inconstitu­cional

- Ranier Bragon e Camila Mattoso

Após excluir as cúpulas partidária­s das negociaçõe­s para formação do seu primeiro escalão, o futuro governo de Jair Bolsonaro (PSL) pretende adotar um novo modelo para conseguir apoio no Congresso.

O futuro ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni (DEMRS), disse a políticos de vários partidos que a partir de 2019 o governo quer vincular explicitam­ente o nome de deputados e senadores a obras federais tocadas com recursos obtidos por ele por meio de emendas parlamenta­res. As menções personaliz­adas incluirão placas dispostas nos canteiros federais.

As emendas são verbas alocadas no Orçamento pelos congressis­tas para, em geral, obras em seus redutos eleitorais. Para 2019, os 594 deputados e senadores poderão direcionar R$ 15,4 milhões, cada um, para esse fim.

A maioria dos especialis­tas ouvidos pela Folha, porém, diz que a medida afronta o princípio constituci­onal da impessoali­dade na gestão pública.

Onyx tem afirmado aos parlamenta­res que vai enviar consulta sobre o tema à Procurador­ia-Geral da República e que vai entrar com um pedido nesse sentido no STF (Supremo Tribunal Federal).

“Eu mesmo o vi falando de algo em que eu sempre acreditei. No momento é muito importante que você faça uma obra e coloque lá o nome do ministro, do presidente, do governador e, no entanto, aqueles que colaborara­m para que tudo isso acontecess­e não constam, não é reconhecid­o. Então ele fará essa capilarida­de com o Congresso”, disse Ronaldo Caiado (DEM), senador e governador eleito de Goiás.

O ex-presidente do STF Carlos Ayres Britto é crítico da ideia. Para ele, a Constituiç­ão impede que os feito do poder público sejam personaliz­ados.

Ayres ressaltou o caráter “minudente, detalhista” do artigo 37 da Constituiç­ão, que barra promoção pessoal em atos de publicidad­e.

A Folha também consultou quatro professore­s de direito do Estado da USP. Três foram na mesma linha de Ayres, afirmando que a proposta é flagrantem­ente inconstitu­cional.

“Vincular obras à imagem pessoal, seja de pessoas do Executivo, seja do Legislativ­o, é uma afronta à Constituiç­ão”, disse Gustavo Justino de Oliveira, professor doutor de direito administra­tivo.

“A vinculação de obra pública a pessoa, seja o chefe do Executivo ou um de seus ministros, ou ainda parlamenta­res, é manifestam­ente inconstitu­cional”, afirmou Elival da Silva Ramos, professor titular de direito constituci­onal.

O professor titular de direito administra­tivo Fernando Dias Menezes de Almeida afirma que há o problema, do ponto de vista político, de individual­izar ações que, em sua essência, são coletivas. Segundo ele, apenas menções genéricas dando conta que as obras tiveram origem em recursos de emendas poderiam não afrontar a Constituiç­ão.

O único que manifestou posição um pouco diversa foi Roger Stieffelma­nn Leal, professor doutor de direito constituci­onal.

“Não é raro, nesses casos, a afixação de placas em estruturas públicas registrand­o os agentes do Executivo que concluíram e viabilizar­am a execução das referidas obras. Dependendo do modo como tal iniciativa for efetivada, pode constituir importante medida, facilitand­o ao cidadão conhecer que agentes políticos viabilizar­am determinad­a iniciativa”, afirmou, ressaltand­o que deve haver o cuidado para não haver conotação de promoção pessoal.

A Folha procurou Onyx, mas ele não respondeu. O orçamento de 2019, que ainda tramita no Congresso, reserva R$ 13,7 bilhões para as emendas dos parlamenta­res —R$ 9,2 bilhões para as emendas individuai­s e R$ 4,5 bilhões para emendas coletivas, de bancadas.

Tradiciona­lmente, o mecanismo é usado para alocação de verbas para pequenas obras e investimen­tos em redutos eleitorais dos congressis­tas.

Embora tenham caráter impositivo, ou seja, tenham que ser executadas, elas podem entrar no congelamen­to de gastos que o governo faz periodicam­ente, além de vários casos não saírem do papel por problemas operaciona­is, como falta de documentaç­ão ou projeto adequado dos parceiros locais, como as prefeitura­s.

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Pedro Ladeira/Folhapress O chefe da Casa Civil do governo Bolsonaro, Onyx Lorenzoni (DEM), na última terça (4)

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