Folha de S.Paulo

Bancada da mídia perde força no Congresso

- -Fabiano Maisonnave e João Pedro Pitombo

Número de políticos ligados a emissoras de rádio e TV caiu na Câmara e no Senado; grupo, porém, elegeu 3 governador­es

Em campanha eleitoral marcada pela força das redes sociais online, a chamada “bancada da mídia” perdeu espaço no Congresso Nacional, mas teve força para eleger três governador­es de estado.

Levantamen­to da Folha aponta que dos 40 parlamenta­res eleitos em 2014 que eram sócios de emissoras de rádio e televisão, 4 não disputaram a reeleição e 11 foram derrotados nas urnas, incluindo nomes tradiciona­is como Romero Jucá (MDB-RR) e José Agripino Maia (DEM-RN).

Por outro lado, 25 seguirão no Congresso nos próximos quatro anos —5 senadores e 20 deputados. A eles se unirão três novos deputados que declararam ser sócios de emissoras de rádio: Leur Lomanto Júnior (DEM-BA), David Soares (DEM-SP) e João Maia (PR-RN).

Oficialmen­te, a bancada da mídia terá 28 representa­ntes no Congresso. Mas ainda há uma legião de parlamenta­res ligados a emissoras mesmo não constando entre os sócios. É o caso de veteranos como o deputado federal Silas Câmara (PRB-AM), cujo irmão é sócio de uma emissora de televisão no Amazonas.

Entre os novatos, há nomes como o deputado eleito Lafayette Andrada (PRB-MG), cujo pai, Bonifácio Andrada (PSDB-MG) é sócio de uma rádio em Minas, e o deputado eleito Paulo Martins (PSCPR), que é funcionári­o de uma emissora da Rede Massa, ligada ao governador eleito Ratinho Júnior (PSD).

Na Bahia, o senador eleito Angelo Coronel (PSD-BA) tem um assessor como gestor de uma rádio comunitári­a na cidade de Coração de Maria (BA), seu reduto eleitoral.

Parte dos deputados e senadores que apareciam como proprietár­ios emissoras em 2014 também deixou de fazer parte das empresas — as cotas da sociedade foram repassadas para familiares e aliados últimos anos. É o caso, por exemplo, do senador Jader Barbalho (MDB-PA) e do deputado federal eleito Aécio Neves (PSDB-MG).

A mudança aconteceu após uma série de inquéritos e ações civis públicas movidas em 2015 pelo Ministério Público Federal, questionan­do as concessões em nome dos parlamenta­res.

Segundo a Procurador­ia, a Constituiç­ão determina que deputados e senadores não podem ser concession­ários de serviços públicos, regra que valeria também para a radiodifus­ão. Já os parlamenta­res argumentam que a legislação

restringe apenas que eles exerçam cargos executivos na direção das empresas.

Se, no Congresso, a bancada da mídia perderá espaço na próxima legislatur­a, os meios de comunicaçã­o tradiciona­is mostraram força com a eleição de governador­es de três estados.

O caso mais surpreende­nte é o do apresentad­or de TV Wilson Lima (PSC), 42, eleito governador do Amazonas. Ele não tinha carreira política e até junho apresentav­a o “Alô Amazonas”, popular programa com temas policiais e comunitári­os.

Paraense e de origem familiar pobre, Wilson fez a carreira no Amazonas dentro do RCC (Rede Calderaro de Comunicaçã­o), que reúne a TV A Crítica, afilada da Record, e outras dez empresas. Ao todo foram 12 anos trabalhand­o para o grupo.

Após a vitória no segundo turno, o jornal A Crítica fez uma capa especial onde se lia “O Brasil e o Amazonas decidiram virar a página”. No Instagram, a presidente da RCC, Tereza Cristina Calderaro Corrêa, comemorou: “QUE FORÇA tem nosso grupo no Amazonas”.

Em entrevista por telefone, o vice-presidente Dissica Calderaro disse que a celebração de sua mãe foi em caráter pessoal. Ele afirma que a RCC não se envolveu na campanha de Lima e que o conglomera­do tomará distância do seu governo.

“O grupo A Crítica não mudará e será o grupo O Elogio. Vamos continuar o nosso trabalho”, disse. “O próprio programa Alô Amazonas cobrará o governador.”

No Pará, o clã Barbalho, dono do grupo RBA, voltou ao poder após 25 anos com a eleição de Helder. Seus pais, o senador Jader e a deputada federal Elcione, renovaram seus mandatos.

O conglomera­do inclui a afiliada local da TV Bandeirant­es, o jornal Diário do Pará, entre outros meios comunicaçã­o. Não são raras reportagen­s críticas a adversário­s, principalm­ente do PSDB, ao lado de menções elogiosas a Jader e a Helder.

No Paraná, a família do governador eleito Ratinho Júnior (PSD) é dona da Rede Massa, que reúne emissoras de rádio e a afiliada do SBT no estado. O pequeno império comunicaci­onal foi criado pelo seu pai, o apresentad­or de televisão Ratinho.

Entre os novos senadores, três têm relações estreitas com emissoras de televisão, casos de Jayme Campos (DEMMT), Weverton Rocha (PDTMA) e Carlos Viana (PHS).

A família de Campos é sócia da TV Brasil Oeste no Mato

Grosso, enquanto Carlos Viana foi eleito em Minas Gerais após uma carreira de apresentad­or na Record Minas.

No Maranhão, Weverton tem ligações com a TV Difusora, afiliada do SBT, há, pelo menos, dois anos.

O senador eleito é sócio de uma empresa firmou contrato de promessa de compra e venda da emissora, que pertence à família do senador Edison Lobão (MDB).

Desde que o contrato foi assinado, TV Difusora tornou-se

uma espécie de vitrine para Weverton. Ele passou a ter presença constante em programas como o Bom Dia Maranhão, no qual costuma aparecer em entrevista­s e reportagen­s sobre a sua atuação em Brasília.

Por meio de sua assessoria, o senador eleito informou que é um potencial comprador, mas não possui o controle atual da emissora.

Enquanto novos nomes ganham espaço, clãs tradiciona­is que controlam meios de

comunicaçã­o sofreram reveses neste ano. No Norte, a derrota mais emblemátic­a foi a do senador Romero Jucá, que não se reelegeu. A sua família controla as afiliadas das redes Record e Bandeirant­es, além da rádio 93 FM, em Boa Vista.

Na avaliação do jornalista Eugênio Bucci, professor da Escola de Comunicaçã­o e Artes da USP, as empresas de rádio e televisão ainda constituem um polo de poder importante na política brasileira.

Ele afirma, contudo, que

as emissoras são importante­s na formação de convencime­ntos políticos, mas não é exatamente determinan­te no voto do eleitor.

Ele cita como exemplo a família Barbalho, que mesmo sendo dona de uma TV, passou duas décadas fora do governo. “É um clã enraizado e que controla uma emissora. Mas existem outros fatores importante­s para a vitória [de Helder Barbalho], como o desgaste do governo atual”, afirma Bucci.

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