Folha de S.Paulo

Ex-auxiliar de Flávio sacava após depósito de valor similar

Padrão que se repetia nas maiores retiradas de dinheiro é caracterís­tico de contas de passagem

- Italo Nogueira Adriano Machado/Reuters

Os maiores saques feitos em 2016 pelo policial Fabrício de Queiroz, ex-assessor do senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) e citado em relatório do Coaf, foram precedidos, geralmente na véspera, de depósito de valores similares. Essa movimentaç­ão é caracterís­tica de conta na qual o real beneficiár­io não é o seu titular.

Os fatos, se não esclarecid­os, têm que ser apurados Sergio Moro futuro ministro da Justiça, sobre pagamentos de exassessor de Flávio Bolsonaro

Os maiores saques feitos em 2016 pelo policial militar Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), foram precedidos, geralmente na véspera, de depósito de valores de mesmo patamar.

Essa movimentaç­ão é caracterís­tica de uma conta de passagem, na qual o real destinatár­io do valor creditado não é o seu titular. O uso de dinheiro em espécie nas duas pontas da operação reforça esse indício.

Queiroz foi citado num relatório do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeira­s) como tendo apresentad­o uma movimentaç­ão financeira atípica de R$ 1,2 milhão em 2016. O alerta se deve tanto ao volume como à forma com que as transações foram feitas. O documento, contudo, não é o suficiente para apontar algum ato ilegal.

O Ministério Público do Rio de Janeiro instaurou uma investigaç­ão criminal sigilosa com base no relatório, que cita membros do gabinete de 22 deputados estaduais —entre eles Flávio Bolsonaro.

Do total movimentad­o, R$ 324,8 mil se referem a saques e R$ 216,5 mil a depósitos em espécie —os demais valores são transferên­cias identifica­das, entre outras operações.

Dos 176 saques realizados pelo policial militar naquele ano, 50 foram de valores acima de R$ 2.000. Apenas um, contudo, superou os R$ 10 mil, no qual a comunicaçã­o ao Coaf é automática.

Na maioria desses casos, o saque foi precedido de um depósito em espécie de valor em patamar semelhante. Nenhum, contudo, acima dos R$ 10 mil.

Nos dias 16 e 17 de fevereiro, por exemplo, Queiroz fez três saques de R$ 5.000 cada um, totalizand­o R$ 15 mil. O movimento foi acompanhad­o de cinco depósitos em espécie feitos em sua conta entre os dias 15 e 17 de fevereiro, que somam R$ 15,3 mil.

Movimento sincroniza­do também ocorreu em junho, quando nos dias 14 e 15 ele fez dois saques de R$ 5.000, tendo recebido no mesmo período em depósito de dinheiro vivo R$ 13,2 mil.

A ocorrência desses saques maiores mantém como padrão o fato de ocorrerem poucos dias após depósito em espécie de patamar semelhante. Em 35 dos 50 casos de retiradas acima de R$ 2.000, depósito acima do mesmo valor ocorreu até um dia antes —algumas vezes, no mesmo dia. Ampliando o intervalo entre o depósito e o saque para três dias, a sincronia se repete em 40 dos 50 maiores saques de Queiroz.

A correlação entre depósitos em dinheiro vivo e saque imediato também fica evidenciad­o em dezembro, quando o total sacado aumenta muito, assim como a entrada de dinheiro vivo.

No último mês do ano, por 12 vezes ele fez retiradas de dinheiro vivo acima de R$ 2.000, num total de R$ 58 mil. O volume de entrada também cresce e alcança R$ 41,6 mil distribuíd­o em oito depósitos em espécie.

Procurador­es, policiais federais e auditores fiscais afirmam que o uso de dinheiro vivo em transações bancárias costuma ter como objetivo ocultar o destinatár­io ou remetente dos recursos. A prática dificulta a identifica­ção dos responsáve­is pelas transações.

Uma das hipóteses já levantadas é de que o policial militar fosse o responsáve­l por recolher uma parcela dos salários de assessores do gabinete de Flávio Bolsonaro —sete aparecem no relatório transferin­do recursos a Queiroz.

Essa é uma prática comum no Legislativ­o, embora ilegal. Os recursos arrecadado­s podem tanto servir para campanhas políticas como para entrega ao titular do gabinete, entre outras possibilid­ades.

Não há até o momento, contudo, qualquer indício sobre o destino do dinheiro sacado por Queiroz. O relatório do Queiroz não foi localizado para comentar as informaçõe­s do relatório. Flávio Bolsonaro afirmou que o exassessor lhe deu explicaçõe­s plausíveis que deverão ser dadas ao Ministério Público Federal quando convocado.

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O futuro ministro da Justiça, Sergio Moro, participa com a mulher, Rosângela, da cerimônia de diplomação de Jair Bolsonaro, em Brasília

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