Folha de S.Paulo

Macron aumenta mínimo para deter ‘coletes amarelos’

Presidente francês acena com aumento do salário mínimo e corte na taxação de aposentado­rias

- Lucas Neves

O presidente da França anunciou pacote de medidas em resposta às manifestaç­ões que levaram milhares às ruas do país. Emmanuel Macron elevou o salário mínimo de € 1.500 para € 1.600 e tirou tributos sobre horas extras e aposentado­rias.

O presidente da França, Emmanuel Macron, anunciou, na noite desta segundafei­ra (10), um pacote de medidas para responder à sequência de manifestaç­ões dos “coletes amarelos”, que há quase um mês leva centenas de milhares de pessoas às ruas e estradas do país.

Em pronunciam­ento transmitid­o pelos principais canais de TV, ele disse que o salário mínimo, hoje fixado em 1.500 euros (R$ 6.500), será reajustado em 100 euros (R$ 445).

A recomposiç­ão do poder aquisitivo é a principal pauta do movimento, que surgiu em oposição ao aumento de uma taxa sobre combustíve­is, já revogado na semana passada.

Além disso, o presidente afirmou que a remuneraçã­o de trabalhado­res por horas extras não será taxada (ou seja, não haverá deduções tributária­s) e que anularia a alta de uma contribuiç­ão compulsóri­a que incide sobre aposentado­rias –a medida valerá para quem recebe até 2.000 euros (R$ 8.900).

Por fim, incentivou empregador­es a oferecer um abono de fim de ano a funcionári­os, pagamento que também estará isento de taxas e deduções.

Mas Macron afirmou que não recuará da extinção do imposto sobre fortunas (na verdade, convertido em imposto sobre propriedad­es imobiliári­as), uma das de su- as primeiras medidas ao chegar ao Eliseu, em maio de 2017.

O fim do tributo é uma das decisões do chefe de Estado mais atacadas por opositores e por integrante­s do movimento dos “coletes amarelos”, que o chamam de “presidente dos ricos” e criticam o suposto descolamen­to da realidade do antigo executivo de um banco de investimen­tos.

Macron abordou essas alegações de insensibil­idade social, pedindo desculpas indiretame­nte. Para aquele que é comparado a antigos reis pela empáfia e pouca disposição em ceder a apelos populares, trata-se de uma “descida de salto” inédita.

“Não conseguimo­s trazer resposta rápida e forte a um sofrimento de mães solteiras, aposentado­s e trabalhado­res que já dura 40 anos. Assumo minha parte de responsabi­lidade por isso”, afirmou.

“Por vezes, posso ter magoado alguns de vocês com minhas palavras.”

Ele se referia a episódios de interação com cidadãos comuns que acabaram em saia justa, como aquele em que, diante da reclamação de um jovem sobre a dificuldad­e de encontrar emprego na França, disse que poderia achar um posto para ele no ato, atravessan­do a rua, em qualquer restaurant­e ou hotel (“eles só querem quem esteja disposto a trabalhar”).

A taxa de desocupaçã­o entre franceses de até 24 anos é de 20%, enquanto fica nos 9% na população como um todo.

Também durante o discurso, Macron voltou a condenar a violência de alguns manifestan­tes (“nenhuma raiva justifica atacar policiais e prédios”) e falou em termos vagos sobre a necessidad­e de descentral­izar o Estado francês e de conduzir um “debate sem precedente­s” sobre a identidade nacional e a imigração. Mencionou ainda a urgência de uma discussão sobre o oferecimen­to de serviços públicos em todo o território francês.

Nessa seara, os “coletes amarelos”, que mobilizara­m 136 mil pessoas no último sábado (8), se queixam de “desertos de hospitais” em algumas regiões e argumentam que o governo não deveria tornar mais onerosos os deslocamen­tos em carros particular­es de quem mora onde há poucos ônibus e trens.

Mais cedo na segunda, em outro aceno ao diálogo, Macron recebeu no Eliseu os presidente­s do Senado e da Assembleia Nacional, presidente­s dos principais sindicatos franceses e líderes de entidades patronais.

A reunião coincidiu com a divulgação de uma má notícia pelo banco central do país: em parte por causa do bloqueio de ruas, rodovias e depósitos desde 17 de novembro, a economia crescerá no último trimestre de 2018 apenas 0,2% em relação aos três meses anteriores, bem menos do que 0,4% previsto.

O movimento dos “coletes amarelos”, cujo nome faz referência ao acessório obrigatóri­o em carros que circulam na França, é considerad­o pela opinião pública local o mais vigoroso desde a revolta estudantil e sindical do Maio de 68 —em um país, não custa lembrar, em que protestar é quase uma modalidade esportiva.

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Jean-Paul Pelissier/Reuters Manifestan­tes assistem a fala do presidente Emmanuel Macron, próximo a Marselha, na França

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