João de Deus nega e repele acusações de abuso sexual
Força-tarefa busca relatos de crime sexual, e mulheres formalizam queixa; médium nega acusações
A defesa de João de Deus disse que o médium recebeu com indignação a notícia de que é acusado de abuso sexual. Segundo a Promotoria, depoimentos de vítimas poderão ser provas suficientes para embasar investigação contra ele.
Depoimentos de vítimas poderão ser provas suficientes para embasar uma investigação e depois tentar condenar acusados de crimes sexuais.
A avaliação é do Ministério Público de Goiás e de outros integrantes de uma força-tarefa iniciada nesta segundafeira (10) para receber os relatos e investigar os casos de denúncias contra o médium João Teixeira de Faria, 76, conhecido como João de Deus.
No sábado (8), 13 mulheres relataram ao Conversa com Bial, da TV Globo, e ao jornal O Globo terem sido vítimas de crime sexual cometido por ele, que mantém a Casa Dom Inácio de Loyola, em Abadiânia, no interior de Goiás.
A Folha também revelou a acusação feita por uma empresária paulistana de origem libanesa. Nesta segunda, a Promotoria de Goiás disse que foi contatada por 40 mulheres —35 delas por email— que se apresentaram como vítimas. Sete formalizaram queixa na Polícia Civil do estado contra João de Deus e já deverão prestar depoimentos nos próximos dias.
À TV Globo a promotora Gabriela Manssur, de São Paulo, afirmou ter recebido mais de 200 relatos do tipo.
O promotor Luciano Miranda Meireles afirmou que os depoimentos podem ser o único meio de comprovar as acusações, já que crimes como o de estupro não ocorrem à luz do dia nem têm testemunhas. “Não há por que duvidarmos dos relatos das vítimas. É claro que não vamos encontrar vestígios do crime nem lesões.”
O órgão envolveu seis delegados e duas psicólogas na força-tarefa e fez contato com Promotorias de outros estados, como São Paulo e Maranhão, para evitar que vítimas se desloquem até Abadiânia.
Pessoas que relataram ter Luciano Miranda Meireles promotor que investiga acusações contra João de Deus sofrido violência sexual praticada por João de Deus também procuraram o Ministério Público em Minas Gerais e no Rio Grande do Sul.
A defesa de João de Deus nega as acusações. O advogado do médium, Alberto Toron, diz que ele recebeu com “indignação” a notícia de que é acusado de crime sexual e está à disposição das autoridades para esclarecimentos. Ele critica a falta de identificação de parte das mulheres —que argumentam temer represálias.
O Ministério Público avalia medidas nas áreas cível e criminal. A investigação cível pode culminar na interdição do espaço utilizado por João de Deus para os atendimentos.
“Se for verificado que o local é voltado para a prática de crimes, a interdição pode ocorrer”, disse Meireles, ressalvando ser necessário recolher os depoimentos oficialmente.
A promotora do Ministério Público de São Paulo Silvia Chakian, que participa da força-tarefa, diz que os depoimentos serão colhidos tanto no órgão paulista como em Goiás —ambos divulgaram emails para recolher denúncias (somosmuitas@mpsp. mp.br e denuncias@mpgo. mp.br, respectivamente).
“Esse tipo de crime não tem conjunto robusto de provas físicas. É muito raro ter vestígios de esperma ou exame sexológico. Então é preciso que as palavras dessas mulheres sejam vistas com credibilidade.”
A promotora diz que um grande número de denúncias fortalece o caso. “Confere mais seriedade aos relatos, porque há várias mulheres, que não se conhecem, narrando o mesmo modus operandi.”
Especialistas citam o caso do ex-médico Roger Abdelmassih, condenado a 181 anos de detenção pelo estupro de 48 pacientes, como exemplo de conduta em que os depoimentos de várias vítimas embasaram os resultados.
Na investigação contra João de Deus, a polícia de Goiás está reunindo diferentes inquéritos, incluindo acusações arquivadas que poderão ser reabertas se houver novas provas.
Em junho, o Ministério Público requisitou a instauração de inquérito para investigar acusação de violência sexual que teria sido cometida pelo médium, mas não recebeu a conclusão da investigação.
Pelo que foi narrado até o momento, os promotores entendem que podem ser configurados três crimes: violação sexual mediante fraude, com pena de até seis anos; estupro, caracterizado por qualquer ato libidinoso, mediante violência ou grave ameaça, cuja pena é de até dez anos de prisão; e estupro de vulnerável, o mais grave, punido com até 15 anos de prisão.
A vulnerabilidade, afirma o promotor Meireles, é caracterizada quando os crimes são praticados contra menores de 14 anos (conforme parte dos relatos) e em situações em que as vítimas estão fragilizadas, como em caso de doença grave. Os dois últimos são hediondos.
As penas, em regra, são acumuláveis. Não haverá uma investigação para cada crime. Os casos deverão ser reunidos em um procedimento investigativo criminal. Muitos casos narrados são antigos, mas, segundo a Promotoria, o prazo para prescrição, dependendo da tipificação, é de 20 anos.
“Muitas vezes as vítimas precisam de um tempo para compreender o que aconteceu, falar a respeito, denunciar. As vítimas que vivem na mesma cidade, sabendo da influência que ele exerce, talvez tenham mais dificuldade”, diz a promotora Patrícia Otoni.
A promotora Valéria Scarance, coordenadora do Núcleo de Gênero do Ministério Público de São Paulo, diz que já há farta jurisprudência de acusações sexuais baseadas essencialmente em declarações feitas pelas vítimas.
“O depoimento da vítima é um meio de prova reconhecido em lei, e há muitos anos os tribunais têm conferindo validade ao depoimento da vítima, que adquire uma relevância especial em crimes contra a dignidade sexual”, afirma Scarance.
“Não há por que duvidarmos dos relatos das vítimas. É claro que não vamos encontrar vestígios do crime nem lesões
AR SECO E QUENTE EM SP
Tempo ensolarado e calor em quase todo o estado; previsão de chuva rápida no Vale do Paraíba e na Serra da Mantiqueira SOL, CALOR E TEMPO SECO PELO PAÍS
Sol e temperatura subindo no Sul, em MS, parte de SP e RJ, no sertão e no agreste do Nordeste; temporais no MA, no PA, no AP, noAMenoAC
O advogado de João de Deus, Alberto Toron, afirmou nesta segunda-feira (10) à Folha que o médium recebeu com “indignação” a notícia de que é acusado de crime sexual e está à disposição das autoridades para esclarecimentos.
Desde sábado (8), dezenas de mulheres já relataram à imprensa ou às autoridades terem sido violentadas sexualmente por João de Deus, nome pelo qual o médium João Teixeira de Faria é conhecido. Ele faz atendimentos na Casa Dom Inácio de Loyola, espécie de hospital espiritual em Abadiânia (GO).
Segundo Toron, o médium nega e “repele” as acusações. Ele critica a falta de identificação de vítimas. Em geral, mulheres que o acusam dizem preferir não ter o nome revelado por temer represálias.
“Tem acusações, e é importante dizer isso, cujas vozes e a cara das pessoas não foram exibidas. Então veja você: não se ouve a voz, nem vê o rosto. São coisas de mais de dez anos. Outras de quatro anos. É impossível sequer rememorar se ele conhece a pessoa e se a atendeu”, afirma Toron.
Questionado sobre casos em que vítimas aceitaram mostrar o rosto, como o da coreógrafa holandesa Zahira Lieneke Mous, e da empresária paulistana Aline Saleh, o advogado contesta.
“Ele nem sequer fala inglês. O português dele, se você o conhece ou já teve a oportunidade de conversar, é muito limitado também”, afirma.
No sábado, Zahira disse em entrevista ao programa Conversa com Bial, da TV Globo, ter sido vítima de abuso pelo médium durante um atendimento espiritual em 2014.
Ela relata que conheceu o trabalho do médium enquanto buscava por uma cura para o trauma de ter sofrido abusos sexuais no passado. Na segunda visita à Casa Dom Inácio, foi informada que teria uma consulta particular em um escritório ao fim da sessão, de acordo com ela.
Lá, segundo a versão de Zahira, ele pediu para que ela ficasse de costas, conduzindo-a para um banheiro onde ele faria uma “limpeza espiritual”. Depois, ele teria colocado as mãos dela no pênis e fez com que elas se movimentassem.
Ela diz ter ficado com medo de denunciar o caso à época.
Aline Saleh fez relato parecidoà Folha, conforme publicado nesta segunda. Ela diz que, em 2013, esteve na Casa, que foi levada para um banheiro e que João de Deus colocou a mão dela em seu pênis.
Para Toron, as circunstâncias das denúncias devem ser averiguadas. “São coisas que não quero adiantar mas que no curso de eventual investigação vamos pedir que seja apurado”, afirma.
Desde sábado, outras mulheres têm relatado casos à imprensa e ao Ministério Público. O advogado, porém, diz ter dúvidas sobre o número real de denúncias. “Eram dez, agora são 20 e estão falando em 200, o que é estranho. Isso é algo que estamos apurando.”
Segundo ele, o médium alegou que seus atendimentos individuais são raros. “Ele refuta isso [atendimentos individuais]. O atendimento dele é público, aberto. Ele recebeu uma ou outra pessoa privadamente ao longo desses 40 anos”, afirma.
Toron se refere ao tempo de existência da Casa Dom Inácio de Loyola, fundada pelo médium em 1976. Boa parte da economia e rotina de Abadiânia giram em torno da instituição. Ele diz que o médium planeja manter suas atividades “se não houver oposição das autoridades”.
“Ele faz o bem para muita gente. Se entenderem que ele deve parar, por respeito à Justiça, assim ele o fará. Mas a princípio ele continua as atividades dele atendendo publicamente”, afirma.
Em geral, João de Deus faz atendimentos às quartas, quintas e sextas-feiras pela manhã e tarde. Lá, prescreve terapias à base de passiflora e faz cirurgias espirituais.
Nesta segunda, a defesa protocolou petição ao Ministério Público, ao delegado de Polícia Civil, em Goiás, e ao juiz em que diz que João de Deus está à disposição “no dia e na hora em que entenderem necessário” para prestar depoimento e pede acesso aos procedimentos da investigação.