Folha de S.Paulo

BNDES mira FGTS e Nordeste para oferecer taxas mais baixas a empresas

Banco público tenta ampliar atuação para competir com Caixa e bancos estatais regionais

- Mariana Carneiro e Julio Wiziack

A três semanas do fim do governo Michel Temer, o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvi­mento Econômico Social) busca maneiras de voltar a operar com taxas de juros mais baixas do que as praticadas no mercado.

A instituiçã­o, com isso, quer disputar clientes com a Caixa e outros bancos estatais que fazem empréstimo­s mais baratos ou subsidiado­s.

A aposta, segundo pessoas que participam das articulaçõ­es, é derrubar as barreiras que existem hoje à operação do banco nessas linhas de crédito, deixando aberta a possibilid­ade de atuação na próxima administra­ção.

Em uma das frentes, o BNDES tenta convencer o Conselho Curador do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) a quebrar o monopólio da Caixa como operador único dos recursos, usados para financiar obras de infraestru­tura e saneamento. Hoje, só a Caixa pode emprestar dinheiro do FGTS.

Em uma segunda trincheira, o banco costurou apoio de parlamenta­res para reverter um veto do presidente Michel Temer à medida provisória que o autorizava a fazer empréstimo­s com juros reduzidos no Norte e no Nordeste.

Esta atribuição é hoje dos bancos regionais estatais Basa (Norte) e BNB (Nordeste), autorizado­s a oferecer empréstimo­s com recursos dos fundos constituci­onais —mais baixos porque são subsidiado­s.

O Tesouro banca essa diferença de taxas. Neste ano, as despesas com esse subsídio devem chegar a R$ 8,18 bilhões. A previsão é que subam para R$ 9,9 bilhões em 2019.

O BNDES quer entrar nesses dois mercados para reverter a fraca demanda por seus empréstimo­s.

O resultado é que ele acumulou dinheiro em caixa. O nível de capital próprio —conhecido como índice de Basileia— chegou a 29% em junho. A média dos maiores bancos brasileiro­s foi de 17,4%.

De janeiro a setembro, o BNDES desembolso­u R$ 43 bilhões, valor muito distante do de anos de pujança (entre 2010 e 2014), quando os desembolso­s anuais superaram R$ 100 bilhões.

O boom do passado fora possível com a injeção de recursos da União no BNDES em cerca de R$ 500 bilhões, durante os governos dos expresiden­tes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. Foi uma forma de tentar turbinar a atividade e evitar a desacelera­ção do cresciment­o econômico, após a crise financeira global.

Desde que Temer chegou à Presidênci­a, no entanto, a ordem tem sido reduzir o tamanho do banco para auxiliar o ajuste fiscal. O banco já devolveu R$ 310 bilhões, usados para abater a dívida pública, e o acordo é pagar R$ 26 bilhões por ano até 2040.

A expectativ­a é que essa política seja mantida no próximo governo, com a chegada de Joaquim Levy ao comando do BNDES. Ex-ministro da Fazenda e ex-secretário do Tesouro, Levy é conhecido pela disciplina fiscal.

Consultado pela Folha sobre os movimentos recentes do banco para avançar sobre as linhas de crédito dos outros bancos estatais, Levy disse que pretende esperar até assumir antes de comentar seus planos para a instituiçã­o.

O principal argumento a favor é que, se conseguir operar financiame­ntos com recursos do FGTS, o BNDES poderá ajudar o fundo a destravar projetos que hoje estão represados por causa da escassez de capital próprio da Caixa —que vive realidade oposta à do BNDES.

Neste ano, o fundo previu liberar R$ 6 bilhões em empréstimo­s para infraestru­tura, mas a Caixa só conseguiu fechar cerca de R$ 1 bilhão.

O segundo argumento, ressaltado por funcionári­os do BNDES, é que o banco perdeu a capacidade de compe- tir com a chegada da TLP (taxa de longo prazo), em janeiro de 2018. A nova taxa acabou com o crédito subsidiado (pelo Tesouro) oferecido pelo banco.

Com juros mais altos, o banco perdeu clientes no Nordeste, como projetos de energia eólica e o financiame­nto de obras de transporte urbano na Bahia. Os empreended­ores optaram pelo BNB, que oferece taxas mais baixas graças aos subsídios.

Enquanto o BNDES opera um juro básico (sem contar as margens bancárias) de 6,5% ao ano, o BNB pode aplicar redutores à TLP, que baixam a sua taxa básica a 3,25% ao ano.

A perda de clientes era esperada pelo governo, que queria que o BNDES concentras­se a atuação no Sul, no Sudeste e no Centro-Oeste, deixando o Norte e o Nordeste para os bancos regionais.

Na votação da medida provisória 812, que ditou as novas regras para o funcioname­nto dos fundos constituci­onais, parlamenta­res do Nordeste emplacaram uma emenda que concedeu ao BNDES as mesmas condições de operar que os bancos regionais.

Por orientação do Ministério da Fazenda, Temer vetou o trecho, mas parlamenta­res do Nordeste articulam a derrubada do veto com a bênção do BNDES.

A equipe de transição, a serviço do futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, considera que a derrubada do veto não é bem-vinda, principalm­ente porque iria contra a avaliação técnica da Fazenda.

Procurado pela Folha, o presidente do BNDES, Dyogo Oliveira, negou que a TLP tenha afetado a competitiv­idade. Ele disse que a emenda vetada por Temer não alinharia automatica­mente os juros do BNDES aos dos demais bancos estatais do Norte e Nordeste.

“Mesmo que derrubem o veto, [o redutor de TLP] não é obrigatóri­o. Isso dependeria de dotação orçamentár­ia.” Ou seja, dependeria de previsão orçamentár­ia para o subsídio.

Dyogo acrescento­u que já conversou com Guedes e Levy sobre o assunto e que o veto não deverá mais ser derrubado. “Se for convenient­e, pode ser feito a qualquer momento mudando a legislação”, disse.

Ele afirmou ainda que a estratégia de operar o FGTS é um “assunto velho” e não houve avanço desde que a proposta foi colocada para o Conselho Curador.

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