Folha de S.Paulo

Pedrinho Matador faz sucesso no YouTube

Em seu canal, serial killer comenta crimes que vê nos jornais; livre há 7 meses, ficou 42 anos preso por mais de cem mortes

- William Cardoso Robson Ventura/Folhapress Agora

Depois de 42 anos na prisão e mais de cem assassinat­os, Pedrinho Matador, 64, agora comenta crimes em vídeos no YouTube e prepara um documentár­io sobre a sua vida. Em liberdade há sete meses, o maior serial killer do Brasil —autor de mais de cem assassinat­os— garante: agora, só quer a paz.

O canal de Pedrinho Matador tem 28 mil inscritos e mais de 2,5 milhões de visualizaç­ões. A ideia foi de seu amigo, Pablo Silva, 30, que também produz os vídeos.

Entre os assuntos comentados por ele estão crimes como as mortes da cachorrinh­a do Carrefour de Osasco, do jogador Daniel, e da estudante Rayane Alves.

“São crimes que revoltam a gente, cheios de mentira, acabando com a felicidade de uma pessoa. Essa jovem [Rayane]... Por que o segurança foi fazer aquilo com ela? Ele tem família, mulher linda, filho. O diabo faz a panela, mas esquece de fazer a tampa. Tudo é descoberto. A condenação dele foi uma caneta [encontrada no local onde estava o corpo]”, afirma.

Depois de mais de quatro décadas na prisão, Pedrinho se vê também na obrigação de alertar os mais novos sobre os riscos da vida bandida. “O crime não é brincadeir­a. Muitos estão entrando por verem os galhos [fama e dinheiro], não a raiz [prisão e morte]. É como o diabo: dá com uma mão e tira com a outra. Tem muitos jovens que entram e, quando querem sair, é tarde demais.”

Entre as coisas que fogem ao código de conduta estabeleci­do por Pedrinho para os jovens e que o incomodam profundame­nte estão quebrar pontos de ônibus, andar de skate nas calçadas, desrespeit­ar os mais velhos, mentir para os pais. “Vejo isso tudo com os meus olhos. Não é só a droga que atrapalha a vida das pessoas”, afirma.

Embora a maioria dos seguidores apoie os conselhos do serial killer, muitos o criticam. “Eu dou risada. Esses caras são todos burros para caramba, não param para pensar no que falam. Por onde passei, eles não passam nem que a vaca tussa. Em vez de chegar na gente e conversar, saber quem é a pessoa, ficam falando abobrinhas”, diz.

Ele se sente envergonha­do quando é reconhecid­o nas ruas. “Até corro, me escondo. A pessoa chega e diz ‘eu te conheço de algum lugar’. Falo ‘eu não, você está enganado’. Mas alguns são cara dura e chegam, daí tiram foto”, diz.

O assédio, entretanto, não o incomoda por completo. “Eu me sinto feliz porque as pessoas vão aprender um pouco sobre o que elas não sabem.”

A vida de Pedrinho está prestes a virar um documentár­io. O diretor Bruno Santana tem levado o serial killer aos locais onde cometeu seus crimes e pretende contar fatos ainda desconheci­dos. A previsão é de que a história fique pronta até fevereiro.

Os mais de cem assassinat­os cometidos por Pedrinho não são suficiente­s para deixar Santana ressabiado durante as gravações. “Ele vem dormir aqui na produtora e fico tranquilo. Deixo as espadas ao lado dele”, brinca.

Quem convive com ele garante que Pedrinho está longe de ser um monstro. Atriz e assistente de produção, Andréia dos Santos é tratada como filha por ele e o descreve com carinho. “Ele é como uma criança querendo voltar a viver.”

Por trás do canal no YouTube está o também youtuber Pablo Silva, 30, amigo de longa data de Pedrinho. É ele quem define os temas a serem comentados, compra roupas para ele e o leva para a igreja.

“A ideia surgiu para mostrar o lado positivo do Pedro, que muitas pessoas não conhecem. Não imaginava que fosse chegar tão longe”, diz Pablo, que também prepara a biografia do matador.

Especialis­ta em criminolog­ia e autora do livro “Serial Killers: Made in Brazil”, Ilana Casoy diz que ele não é um justiceiro, mas um vingador, por matar aqueles que ele considera o que há de pior na sociedade. “Quando alguém desobedece o código de ética dele, ele tem soluções muito próprias e que não seguem a lei.”

“Acaba exercendo fascínio nas pessoas. É reflexo de uma sociedade que a gente tem, de um país onde só 10% dos homicídios são resolvidos. Traz essa visão distorcida”, diz . “O problema é que as vítimas de Pedrinho não tiveram direito a um advogado, como ele teve.”

Segundo Ilana, serial killer é aquele que matou duas ou mais pessoas, com intervalo de tempo entre as vítimas, com ritual que envolve uma densidade psicológic­a.

Ela entrevisto­u Pedrinho e diz que o que mais chamou a atenção foi a alegria, desenvoltu­ra e inteligênc­ia dele. “Muito claro e direto. Não se esconde atrás de nenhuma fala imprecisa. Apesar dos crimes, existe uma pessoa, que é o Pedro. E Pedro merece todo respeito, independen­temente de todos os crimes que cometeu.”

A caminho de Bertioga (a 103 km de SP) no sábado (8),

acompanhad­o da reportagem, Pedrinho foi requisitad­o para fotos em uma cachoeira.

Assim que desceu do carro, não demorou para se ver cercado por curiosos e admiradore­s. “Estou diante dessa pessoa e não me impacta, porque não sou juiz, nem julgador para condenar os atos que ele praticou. Talvez ele tivesse seus motivos. Ouvi a história dele e teve uma infância difícil”, disse o autônomo Nilton Rodrigues Alves, 49.

Quando chegou à praia, onde não pisava havia décadas, emocionou-se. “Dentro da cela só se vê gato brincando”, diz.

Pedro Rodrigues Filho, o Pedrinho Matador, afirma que o mundo mudou muito desde que entrou numa prisão pela primeira vez. Quando saiu da Colônia Penal de Mongaguá há sete meses, ele disse ter enfrentado dificuldad­es com o dia a dia.

“Passei a maior vergonha para me acostumar. Até para pegar o trem na estação precisei pedir ajuda”, diz. Sobre o “tempos de guerra”, como chama as batalhas travadas à faca no sistema prisional, Pedrinho lembra com tristeza. “Deus já me castigou muito. Já fui muito ruim no passado, porque as pessoas também foram ruins comigo”, diz.

Questionad­o se matou mais de cem, Pedrinho não nega. “Chega a isso aí. O dia em que não matava gente, eu não dormia”, fala. Ele diz não se arrepender dos assassinat­os, mas sim de ter entrado no crime.

Em relação ao futuro, o matador sonha com uma vida tranquila em que possa cuidar de alguma chácara, no meio do mato, o lugar que tanto gosta. E quer um pouco mais. “Não queria que me conhecesse­m por esse nome mais. Deixa Pedrinho Matador para lá... Quando as pessoas me chamam ‘ô, seu Pedro’, eu fico feliz da vida. Seu Pedro, né? Viver o restinho de vida que eu tenho na paz.”

 ??  ?? A partir da esq., Bruno Santana, diretor do documentár­io, Pedrinho Matador, Pablo Silva, amigo e produtor do canal, e a atriz e assistente Andreia dos Santos, em Bertioga, no litoral de São Paulo
A partir da esq., Bruno Santana, diretor do documentár­io, Pedrinho Matador, Pablo Silva, amigo e produtor do canal, e a atriz e assistente Andreia dos Santos, em Bertioga, no litoral de São Paulo

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