Folha de S.Paulo

Após críticas, Moro anuncia mudanças em pacote anticrime

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O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, apresentou uma primeira revisão do seu projeto anticrime, lançado nesta semana, incluindo alterações propostas por governador­es.

O ex-magistrado também acrescento­u na mudança uma nova redação na parte que trata da Justiça Eleitoral, em resposta às críticas disparadas na véspera pelo decano do STF (Supremo Tribunal Federal), Celso de Mello.

As primeiras mudanças no texto da principal bandeira do ministro do presidente Jair Bolsonaro (PSL) ocorrem apenas dois dias depois da apresentaç­ão do pacote, em Brasília, para governador­es.

O texto original altera pontos do Código Penal, Código de Processo Penal, Lei de Execução Penal, Lei de Crimes Hediondos e Código Eleitoral. As medidas precisam passar por comissões do Congresso e serem aprovadas pelo plenário das duas Casas, por maioria simples, antes de irem para sanção do presidente.

Uma das medidas do pacote permite que os juízes neguem a liberdade provisória quando o detido em flagrante for reincident­e ou incorra em “prática habitual, reiterada ou profission­al de infrações penais”. O mesmo vale para membros de organizaçõ­es criminosas.

Os governador­es solicitara­m que esse trecho também fizesse referência a pessoas detidas com armas de fogo de uso restrito ou “em circunstân­cias que indiquem” que elas são “membro de grupo criminoso.”

“Foi solicitado [pelos governador­es] uma preocupaçã­o do projeto em habilitar as polícias a retirar criminosos mais perigosos, com armas pesadas, das ruas”, disse Moro nesta quarta (6), logo depois de se reunir com deputados federais, na Câmara, para fazer uma primeira apresentaç­ão do seu anteprojet­o, que ainda não foi encaminhad­o formalment­e ao Congresso.

“A ideia é tirar pessoas muitas vezes com armamentos pesados e com indicativo de serem membros de organizaçõ­es criminosas, da circulação, protegendo o cidadão”, acrescento­u o ministro.

Outra inserção a pedido dos governador­es acatada por Moro ocorreu no trecho que aborda as teleconfer­ências. Moro havia proposto inicialmen­te que presos reclusos em estabeleci­mentos fora da comarca ou da subseção judiciária realizasse­m suas audiências “preferenci­almente” por videoconfe­rência.

A nova redação traz um caráter obrigatóri­o e diz que nesses casos a audiência “deverá ocorrer” por transmissã­o de vídeo em tempo real, “desde que exista o equipament­o necessário”.

Trata-se de um dos principais pleitos dos governador­es, que afirmam gastar grandes quantias de recursos públicos com o deslocamen­to de presos que se encontram em presídios distantes dos tribunais do estado.

O ministro da Justiça também buscou, na primeira revisão do seu anteprojet­o, aparar as arestas com o STF.

Na terça, ele foi publicamen­te cobrado pelo ministro Celso de Mello, que criticou o item do pacote anticrime que determina que crimes comuns (como corrupção), quando investigad­os em conexão com crimes eleitorais, sejam de competênci­a da Justiça comum, e não da eleitoral (onde, em tese, as punições são mais brandas).

O ministro do Supremo afirmou que eventual mudança nas atribuiçõe­s da Justiça Eleitoral não poderia vir por meio de lei ordinária, como pretendia o anteprojet­o inicial.

Na nova versão, Moro criou um novo capítulo temático, intitulado “Medidas para alteração da competênci­a para facilitar o julgamento de crimes com autoridade­s com foro”.

Nele, o ministro da Justiça inseriu as mesmas mudanças que pretende realizar no Código Eleitoral, mas indicou que o tema será assunto de um “projeto de lei complement­ar separado”.

Os principais pontos do projeto apresentad­o por Moro são o cumpriment­o provisório da pena após condenação em segunda instância e a criminaliz­ação do caixa dois.

Para permitir a execução da pena antes do trânsito em julgado, Moro defende alterar o Código de Processo Penal.

Desde 2016, o STF adotou o entendimen­to de que uma pessoa já condenada por um tribunal colegiado pode começar a cumprir sua pena. A corte marcou para 10 de abril nova análise sobre o tema.

Já a criminaliz­ação do caixa dois consta da parte do pacote que trata da lei eleitoral. Moro pede que seja considerad­o crime eleitoral “arrecadar, receber, manter, movimentar ou utilizar qualquer recurso, valor, bens ou serviços estimáveis em dinheiro, paralelame­nte à contabilid­ade exigida pela legislação eleitoral”.

Atualmente casos de caixa dois eleitoral são julgados com base em um dispositiv­o que aborda omissão ou falsidade na prestação de contas. Não há registro no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) de condenaçõe­s nesse sentido.

Moro defende pena de dois a cinco anos, com aumento de até dois terços caso o condenado seja agente público.

Outro item do texto —e um dos mais criticados— modifica o que é considerad­o legítima defesa. Moro quer enquadrar nesse rol policial que, “em conflito armado ou em risco iminente de conflito armado, previne injusta e iminente agressão a direito seu ou de outrem”.

Entidades de defesa de direitos humanos afirmam que a medida pode dar a policiais uma “licença para matar”, o que o ministro refuta.

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Pedro Ladeira/Folhapress O ministro Sergio Moro em reunião com parlamenta­res nesta quarta (6)

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