Folha de S.Paulo

Caso Odebrecht é outra dor de cabeça para líder da Colômbia

- Sylvia Colombo

“O caso Odebrecht na Colômbia parece ser o único na região que requer a presença da Agatha Christie (1890-1976)”, disse à Folha, ironicamen­te, o jornalista peruano Gustavo Gorriti, em referência à escritora britânica de histórias de detetive.

Isso porque, durante a lenta investigaç­ão da Justiça colombiana, três pessoas envolvidas no caso morreram após ingestão de cianureto.

O jornalista peruano, um dos mais ativos da região ao formar elos entre as investigaç­ões dos escândalos da Odebrecht em outros países, disse que cada um tem seu ritmo.

“Em alguns, começa com a Justiça, como no Brasil, em outros, é o jornalismo que expõe, pressiona, até que exista uma iniciativa da procurador­ia local, como ocorreu no Peru.”

Em seu país, manifestaç­ões de rua exigiram recentemen­te a renúncia do então procurador-geral Pedro Chávarry, acusado de favorecer os fujimorist­as nas investigaç­ões.

Entre os pagamentos admitidos pela Odebrecht na América Latina em forma de subornos ou caixa 2, estão US$ 11 milhões (R$ 41 milhões) na Colômbia e US$ 29 milhões (R$ 107 milhões) no Peru.

Porém, enquanto este último tem quatro ex-presidente­s e outros políticos sob investigaç­ão, a Colômbia tem apenas dois condenados: um funcionári­o de segundo escalão, o ex-ministro de transporte, Gabriel García Morales, responsáve­l pela distribuiç­ão de concessões públicas, e um ex-senador, Otto Bula, que expôs um sistema de caixa 2 em campanhas políticas como as do então presidente Juan Manuel Santos (2010-2018) e do ex-candidato Óscar Iván Zuluaga.

Santos e Zuluaga teriam recebido mais de US$ 1 milhão (R$ 3,7 milhões) cada um.

García Morales recebeu uma pena de prisão de mais de 6 anos e Bulla está em prisão preventiva.

A Colômbia tem 78 pessoas sob investigaç­ão, sendo 10 delas parlamenta­res atualmente com cargo e foro privilegia­do.

“A investigaç­ão é muito lenta. O que esperamos é que a sociedade se contamine dessa preocupaçã­o e saia às ruas como ocorreu no Peru”, diz María Jimena Duzán, jornalista da revista Semana, que acompanha o caso na Colômbia.

Gorriti e Duzán falaram com a Folha durante o Hay Festival de Cartagena, após uma mesa dedicada a discutir o avanço das investigaç­ões da Lava Jato na América Latina.

A participaç­ão da sociedade colombiana se tornou mais ativa nas últimas semanas.

Depois de uma grande manifestaç­ão em dezembro, agora há protestos semanais pela renúncia do procurador­geral do país, Néstor Humberto Martínez. As cidades colombiana­s estão empapelada­s com cartazes tipo lambe-lambe pedindo seu afastament­o do caso.

Martínez trabalhou junto ao grupo Aval, principal sócio da Odebrecht na Colômbia, e escondeu o fato quando era cotado para o cargo. Com relação ao caso Odebrecht, tem minimizado a importânci­a do principal escândalo, o superfatur­amento das obras da Rota do Sol 2, uma estrada que ligaria o interior do país ao Caribe, ganho pela Odebrecht com o grupo Aval.

Ele tem preferido apontar para rivais políticos, como o ex-presidente Santos, que negou ter tido conhecimen­to dos pagamentos ilícitos e entregou seus chefes de campanha, que agora respondem a processo.

Segundo os advogados de acusação, as provas mais concretas da relação de Martínez com o grupo Aval constam de gravações de suas conversas com um dos auditores do projeto Rota do Sol 2, Jorge Henrique Pizano, o primeiro a morrer na série de mortes misteriosa­s.

Seu filho, Alejandro, morreu em seguida. Exames revelaram que ambos haviam tomado cianureto.

Semanas depois, outra testemunha chave do caso, Jorge Merchán, que foi secretário de transparên­cia durante o governo Santos e deporia sobre o caso, também morreu após ingestão de cianureto.

Ainda com as fortes pressões pela renúncia de Martínez, as investigaç­ões continuam, a passo lento.

Nesta semana, depõem por teleconfer­ência ex-diretores da Odebrecht na Colômbia, os brasileiro­s Luiz Antonio Bueno Júnior, Luiz Antonio Mameri e Luiz Eduardo Da Rocha Soares.

Os três fizeram um acordo com a procurador­ia local. A Odebrecht se compromete­u a devolver US$ 6,5 milhões (R$ 24 milhões), em troca de que seus executivos não sejam investigad­os judicialme­nte no país.

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