Folha de S.Paulo

O novo em El Salvador

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Alastrado por diversas partes do mundo, o movimento de repúdio do eleitorado a partidos tradiciona­is acaba de se manifestar em El Salvador, onde pôs fim a 30 anos de domínio de duas agremiaçõe­s.

A eleição de domingo (3) confirmou o triunfo de Nayib Bukele, 37, ex-prefeito da capital, San Salvador. Ele se apresentou como alternativ­a à direitista Aliança Republican­a Nacionalis­ta (Arena) e à Frente Farabundo Martí de Libertação Nacional (FMLN), de esquerda. Aquela governou de 1989 a 2009; esta comandou nos últimos dez anos.

À semelhança de outros países em que ascenderam figuras identifica­das como outsiders, os salvadoren­hos expressara­m nas urnas a descrença em relação aos habituais ocupantes do poder.

No caso da pequena nação da América Central —que enfrentou 12 anos de guerra civil, até 1992—, sobressai o fracasso do Estado ante a criminalid­ade, cujos números são assustador­es.

El Salvador já liderou o ranking mundial de taxa de homicídios e, em 2017, registrou 60 assassinat­os por cem mil habitantes, somente atrás da Venezuela —o índice do Brasil está em torno de 30.

Num cenário de pobreza urbana e ausência do poder público, gangues que atuam no tráfico de drogas e extorquem dinheiro de moradores travam uma disputa sangrenta por território. Não à toa, há um êxodo crescente da população, que engrossa o fluxo de migrantes ilegais rumo aos Estados Unidos.

Não bastasse a violência, a corrupção tornou-se sistêmica e manchou as duas forças políticas de sempre. O ex-presidente Antonio Saca (2004-2009), da Arena, foi condenado à prisão por desviar o equivalent­e a R$ 1 bilhão.

Seu sucessor, Mauricio Funes (2009-2014), da FMLN, que manteve relação próxima com os governos petistas de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, foi acusado de comandar um esquema que teria subtraído dos cofres públicos em torno de R$ 1,3 bilhão. Deixou o país e se abrigou na Nicarágua do ditador Daniel Ortega.

Não surpreende, então, que Nayib Bukele, um ex-militante da FMLN e candidato por uma nova coalizão de centro-direita, tenha atraído os eleitores com um discurso de moralidade na administra­ção pública. Difícil não traçar um paralelo com as circunstân­cias que alçaram Jair Bolsonaro (PSL) à Presidênci­a do Brasil.

Passada a campanha exitosa, calcada em redes sociais e avessa a debates, o novo mandatário salvadoren­ho terá de superar as críticas quanto à falta de propostas claras de governo. Soa familiar.

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