Folha de S.Paulo

Em vez de se renovar, PT está trancado com o seu líder em Curitiba

- Igor Gielow

A nova condenação de Luiz Inácio Lula da Silva deveria servir como um alerta à sigla que ele fundou só para fundir ao seu destino ao longo de quase quatro décadas.

Apesar de ter sobrevivid­o melhor do que outras agremiaçõe­s, como PSDB ou o MDB, o PT não encontrou um fio narrativo decente desde que a onda de direita capitanead­a por Jair Bolsonaro varreu as urnas.

As condições objetivas do petismo não eram totalmente desastrosa­s, mas o partido se perdeu. A sigla saiu com a maior bancada na Câmara das urnas e viu Fernando Haddad chegar ao segundo turno e levar quase 45% dos votos.

Apesar de ter entrado no pleito para ser derrotado e topado um papel humilhante de poste assumido, Haddad poderia buscar protagonis­mo no debate.

Claro, nunca lhe sobrou apoio partidário, mas deixar a bola com Gleisi Hoffmann apenas reforça o que já se sabe: o PT virou uma banca de advogados de defesa de Lula, restando a torcida por um desastre do governo Bolsonaro como discurso inercial.

O ex-prefeito paulistano nunca foi querido em seu partido, mas dedica-se a tuítes e a entrevista­s confortáve­is desde a derrota. Gleisi segue sendo uma histriônic­a porta-estandarte do surrado “Lula livre!”.

Outros líderes petistas são desconheci­dos neste momento, e o histórico ético do partido não transmite credibilid­ade a acusações de que a nova condenação é um ato político.

Uma saída óbvia para o partido é buscar organizar o que sobrou da esquerda no Congresso para atrapalhar a vida do governo, como ele soube fazer bem nas gestões tucanas de Fernando Henrique Cardoso. Mas os tempos são outros —Ciro Gomes (PDT) que o diga.

Há chance de sucesso em combates pontuais contra a agenda conservado­ra de Bolsonaro, mas mais midiáticas do que efetivas na hora do voto no Congresso. Bandeiras autodenomi­nadas progressis­tas não estão na moda no Brasil de 2019.

Além disso, há a insistênci­a no erro político de agarrar-se sempre a agendas regressiva­s: os slogans petistas são invariavel­mente de negação (“Fora Temer”, “Eleição sem Lula é fraude”, “EleNão”), algo que o próprio Lula abandonou lá em 2002, quando entendeu como chegar ao poder.

Torcer por uma debacle econômica, a essa altura dos acontecime­ntos e depois do legado do PT no setor, é engano análogo à crítica ao Plano Real em 1994.

Claro que Bolsonaro irá desgastar-se sempre com a metade do Brasil que o rejeita, é parte do pacote político atual, mas isso é quase irrelevant­e politicame­nte se houver sucesso na seara de Paulo Guedes.

Com tudo isso, restaria racionalme­nte ao PT tentar uma renovação de lideranças, só para então afinar um discurso sob a luz do desempenho de Bolsonaro.

Só que por ora o partido prefere abraçar-se ao líder preso em Curitiba, trancando-se cada vez mais profundame­nte dentro de sua cela a cada condenação.

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