Folha de S.Paulo

May ouve novo não da Europa sobre reabertura de acordo do brexit

A 50 dias da saída do Reino Unido do bloco, dois lados prosseguem sem saída para impasse

- Lucas Neves

O presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, disse nesta quinta (7) à primeira-ministra britânica, Theresa May, que o acordo para a saída do Reino Unido da União Europeia (UE) não será reaberto.

Ele sinalizou, porém, disposição em alterar a declaração política que acompanha o texto principal, na qual se esboça a relação comercial pósbrexit entre as partes.

A ideia seria “torná-la mais ambiciosa em termos de conteúdo e agilidade” na implantaçã­o do sistema de transações.

Um comunicado conjunto divulgado após o encontro em Bruxelas informou que negociador­es britânicos e europeus voltarão a conversar para tentar pôr fim ao impasse em torno do pacto.

Uma reunião bilateral foi agendada para segunda (11). May e Juncker devem se ver novamente até o fim de fevereiro.

O pomo da discórdia conti- nua sendo o dispositiv­o previsto para evitar o restabelec­imento de controles rigorosos de mercadoria na fronteira entre a Irlanda do Norte (parte do Reino Unido) e a República da Irlanda (Estado membro da UE).

A hipótese de uma união aduaneira que colocaria temporaria­mente sob o mesmo guarda-chuva Europa e os então “livres” território­s britânicos causa arrepios em dezenas de parlamenta­res em Londres, o que vem impedindo a aprovação do acordo.

No fim de janeiro, o Parlamento apontou sua condição para endossar o texto: a exclusão do dispositiv­o, conhecido em inglês como “backstop”.

Na quinta, em Bruxelas, May reconheceu não ser possível descartar um mecanismo de salvaguard­a da “fronteira invisível” entre as Irlandas, mas insistiu na necessidad­e de alterá-lo para obter o sinal verde do Legislativ­o em Londres.

Ela apresentou três saídas: uma, envolvendo a definição de uma data-limite de vigência do “backstop” em sua forma atual; a segunda, dando ao Reino Unido a prerrogati­va de sair da hipotética união aduaneira quando bem entender; e a última, trocando a zona de tarifa comum por soluções tecnológic­as que permitiria­m checagens de produtos longe da divisa irlandesa.

A UE já disse não às duas primeiras e por ora não crê na viabilidad­e logística da terceira.

“O que vejo e ouço dos líderes [europeus] é um desejo de trabalharm­os juntos para garantir que cheguemos a um acordo sobre a saída do Reino Unido”, afirmou May.

“Vou ‘entregar’ o brexit, e entregá-lo pontualmen­te [em 29 de março]. Vou negociar muito nos próximos dias para fazer isso.”

Além de Juncker, ela se reuniu com os presidente­s do Parlamento Europeu, Antonio Tajani, e do Conselho Europeu (que reúne os chefes de Estado e de governo do bloco), Donald Tusk.

Na quarta (6), esse último havia causado furor ao sugerir que havia um lugar no inferno para os políticos que advogaram pelo brexit sem ter um plano concreto sobre a condução do processo.

“Tenho pensado em como deve ser este lugar especial no inferno para as pessoas que fizeram campanha pelo brexit sem ter nem mesmo um esboço de plano de como realizá-lo de modo ordenado”, disse Tusk.

A frase foi bombardead­a pelos parlamenta­res britânicos a favor da saída do país do bloco.

Mas na saída da conversa com a britânica, um dia depois, limitou-se a escrever em uma rede social que não houvera avanços e que as tratativas continuari­am.

Onde houve algum ensaio de avanço foi no front interno. O líder da oposição, Jeremy Corbyn (Partido Trabalhist­a), divulgou carta aberta a May em que fixa cinco prérequisi­tos para que seu grupo aceite o acordo firmado pelo governo com a UE.

O principal, uma união aduaneira permanente com o bloco, vai de encontro ao que a chefe de governo martela há meses: o brexit, segundo ela, oferece ao país a chance de ter uma política comercial independen­te, de fechar seus próprios acordos. Quem integra uma união aduaneira não goza dessa autonomia.

O gesto de conciliaçã­o de Corbyn, se é que se pode falar assim, não foi bem recebido nas fileiras trabalhist­as, onde muitos acham que, em vez de mostrar um caminho para um “brexit suave”, o partido deveria turbinar os esforços para forçar um segundo plebiscito sobre o adeus à UE.

May prometeu voltar ao Parlamento britânico em 13 de fevereiro com uma nova proposta para o brexit.

Ainda na quinta, o Banco da Inglaterra lançou mais sal na ferida aberta do brexit ao divulgar um prognóstic­o atualizado para a evolução do PIB em 2019. O cresciment­o esperado, antes de 1,7%, caiu para 1,2%.

A retração se deve à incerteza do mercado global, mas também, destacou a instituiçã­o, à condução caótica do processo de desligamen­to da Europa.

Se a previsão se confirmar, a economia britânica terá sua pior performanc­e em dez anos.

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François Lenoir/Reuters A primeira-ministra britânica, Theresa May, fala a jornalista­s em Bruxelas, na Bélgica

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