Folha de S.Paulo

Doria vai aumentar tributos para compensar ICMS menor a setor aéreo

Henrique Meirelles diz, entretanto, que ainda não definiu produtos que terão imposto elevado

- -Taís Hirata

O secretário da Fazenda do governo paulista, Henrique Meirelles, afirmou nesta quinta-feira (7) que a redução fiscal dada às empresas aéreas deverá ser compensada pelo aumento de outros tributos.

Conforme a Folha antecipou, o governo de João Doria acatou uma antiga demanda do setor aéreo e concederá uma redução de 25% para 12% na alíquota de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadoria­s e Serviços) do querosene de aviação dos voos domésticos. O anúncio da medida foi feito nesta semana.

Em evento da XP Investimen­tos, Meirelles disse que o governo seguirá a Lei de Responsabi­lidade Fiscal, o que significa que a redução tributária anunciada terá de ser compensada pela criação de outra fonte de receita recorrente —ou seja, não poderá vir meramente do cresciment­o econômico ou de privatizaç­ões.

“Aumentar outro tipo de imposto, de outro produto, é uma alternativ­a. Tem duas alternativ­as, ou se cria outro aumento de receita recorrente ou a vigência [da isenção] só no próximo ano. Possivelme­nte a primeira, mas ainda não está decidido”, disse ele a jornalista­s após o evento, realizado em São Paulo.

Meirelles não especifico­u quais tipos de produto poderão ter o imposto elevado e disse que, assim que tivesse uma decisão, ela será anunciada. Para ele, o benefício fiscal faz sentido porque aumentará o número de voos no estado.

Ele também falou sobre as privatizaç­ões em avaliação pelo governo Doria —o grupo responsáve­l por desestatiz­ações na gestão se reuniu nesta semana pela primeira vez.

Em uma lista inicial, foram listados 29 ativos que poderão ser ofertados à iniciativa privada, seja com privatizaç­ões, seja com concessões.

Entre os ativos, há conces- sões rodoviária­s, que poderão ser renovadas, aeroportos regionais, a hidrovia Paraná-Tietê e presídios, entre outros.

Sobre o futuro da Sabesp, Meirelles voltou a manifestar a intenção do governo estadual de privatizar a companhia caso seja aprovado o novo marco regulatóri­o do saneamento básico, que foi enviado ao Congresso no fim do 2018.

O texto facilita a privatizaç­ão de concession­árias públicas e aumenta a competitiv­idade de empresas privadas no mercado ao proibir que as estatais de saneamento possam assinar contratos com as pre- feituras sem licitação.

Caso o projeto não seja aprovado, a gestão Doria deverá prosseguir com a proposta de capitaliza­ção da empresa encaminhad­a pelo governo anterior. Nesse modelo, seria criada uma controlado­ra para a Sabesp e seriam ofertadas ações dessa holding ao setor privado, sem que o governo perdesse controle do grupo.

“Dentro da estrutura jurídica atual, o melhor é manter [a Sabesp] sob controle estatal sim, porque, se manter, há uma vantagem competitiv­a muito grande [a assinatura de contratos sem licitação]. Agora, mudada a estrutura jurídica, muda a melhor alternativ­a também”, disse.

A previsão é que a eventual capitaliza­ção gere R$ 5 bilhões —dos quais R$ 1 bilhão seria revertido para investimen­tos da Sabesp e R$ 4 bilhões iriam para o estado. Já uma privatizaç­ão da estatal renderia ao menos R$ 10 bilhões.

Em relação à nomeação de dois ex-funcionári­os da Comgás para a diretoria da Arsesp (agência reguladora de saneamento e energia do estado, responsáve­l também pelo setor de gás), Meirelles disse que o governo quer evitar a captura das agências reguladora­s.

Conforme relevado nesta quinta (7) pelo jornal O Estado de S. Paulo, João Doria se reuniu com o presidente da Cosan, Rubens Ometto, no fim de janeiro, dias antes da escolha dos diretores. Ometto foi um dos maiores doadores individuai­s da companha de Doria.

“Que que tem o Ometto? Eu nem sabia que o Ometto tinha alguma participaç­ão. Eu conheço o Ometto como empresário”, afirmou Meirelles.

Em nota, a Cosan disse que a indicação dos diretores é feita de forma independen­te e que “as doações eleitorais feitas pelo Sr. Rubens Ometto Silveira Mello foram realizadas em caráter pessoal e seguem as regras estabeleci­das pelo Tribunal Superior Eleitoral”.

A maioria dos governante­s eleitos nas últimas eleições, do federal aos estaduais, tomou posse anunciando programas liberais na economia —de privatizaç­ões a enxugament­o da máquina estatal.

Diante do comprovado malefício das políticas intervenci­onistas, a mudança radical no rumo da economia está na ordem do dia.

Ainda assim, movimentos recentes acenderam o sinal amarelo para os que defendem uma renovação econômica sustentada na abertura comercial, na concorrênc­ia e no fim das políticas setoriais, com sua plêiade de desoneraçõ­es, subsídios e iniquidade­s sociais.

Indiferent­es aos critérios da gestão racional e transparen­te, essas gentilezas com dinheiro público alimentara­m a crise fiscal que até hoje tolhe o cresciment­o e o emprego.

Dias atrás, por exemplo, a General Motors ameaçou fechar suas operações no Brasil, caso os resultados colhidos por aqui não melhorasse­m substancia­lmente.

Como habitual no setor automotivo, candidatou-se a um tratamento tributário especial para investir e pediu a liberação de créditos do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadoria­s e Serviços) represados pelo governo de São Paulo.

Longe de ser um caso isolado, a barganha repete duas das mais nocivas e recorrente­s mazelas das políticas industriai­s no Brasil, principalm­ente no caso da indústria automobilí­stica.

A primeira é reivindica­r incentivos fiscais para resolver problemas cuja origem encontra-se, de fato, no mercado e na gestão. Para tanto, as empresas lançam mão das costumeira­s ameaças de demissões em massa e retirada do país —um expediente que há décadas subtrai recursos fiscais mais necessário­s em áreas essenciais.

A segunda mazela é a falta de equidade do sistema tributário. Sim, é justo reivindica­r créditos tributário­s retidos —a compensaçã­o do ICMS está prevista em lei e é sistematic­amente ignorada pelos estados da Federação, assim como ignoram o pagamento de precatório­s de toda espécie.

Mas o atendiment­o a essa legítima demanda não deveria contemplar apenas uma empresa ou um único setor, como sinalizou o governo paulista.

Esse direito tem de ser reconhecid­o de forma abrangente, com agilidade, sem burocracia e de forma impessoal, alcançando todas as inúmeras empresas que se encontram na mesma situação.

Aliás, melhor ainda: o ICMS deveria ter uma alíquota única para todas as atividades, sem tratamento especial, como aconteceu agora com o setor aéreo no estado de São Paulo.

Tais casos revelam como a agenda de modernizaç­ão da economia enfrentará duros percalços, exigindo muito mais do que a imprescind­ível reforma da Previdênci­a.

A abstinênci­a fiscal em uma economia viciada em subsídios pode gerar reações estranhas, como levar arautos do liberalism­o econômico a topar adiar para um futuro indefinido a remoção das barreiras protecioni­stas em troca da aprovação das reformas.

Sempre haverá justificat­ivas para o injustific­ável amontoado de concessões que premiam setores econômicos, corporaçõe­s e grupos de interesse sortidos.

Os governos eleitos com promessas de arejar a economia e combater privilégio­s têm uma missão incontorná­vel: ignorar os pedintes de casuísmos e, assim, evitar que o Estado, em todas suas instâncias, volte a cair em antigas ciladas.

Sem isso, o aumento da produtivid­ade da economia será uma quimera. Sem isso, não há como darmos certo.

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Paul oG uereta/Photo Premium/Agência OG lobo O governado rJ oã o Do ria, que reduzirá o ICMS n os etor aéreo

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