Folha de S.Paulo

Diogo Nogueira diz estar compondo com ajuda do pai, direto do além

Independen­te após 11 anos em gravadoras, músico faz show em SP e detalha novo livro e filme sobre o pai, João

- Rafael Gregorio

João Nogueira, morto em 2000, não teve tempo de ver o filho brilhar nos palcos, mas em breve pode se juntar a ele em parceria especial. É que Diogo têm três músicas “quase prontas” que vem escrevendo com o pai —segundo ele, João sopra, do além, melodias e letras durante o sono.

“Começaram em sonhos. Ele cantarolan­do para mim. Tem uma já encaminhad­a que vou terminar com o Inácio Rios e em breve deve sair.”

A improvável e metafísica união vai ao encontro da espiritual­idade de Diogo, de fé versada em composiçõe­s suas, como “Força Maior”, que diz “quando nada dá pé é amém é axé não tem jeito/ no terreiro ele é o Oxalá, no oriente ele é Alá/ ele sempre estende a mão, não importa a religião”.

Não é a única novidade ligada a João, um dos mais relevantes autores do samba carioca e criador de melodias como a de “Poder da Criação”.

Diogo, as irmãs Clarisse, 40, e Tatiana, 42, e sua mãe, Ângela, 66, devem lançar livro sobre ele no segundo semestre, de autoria do jornalista Paulo Henrique de Noronha, e planejam filmar sua biografia.

“É um sonho de nossa família. João foi um cara muito importante e cheio de histórias: drama, comédia, política.”

Faltam definições para a empreitada, e Diogo não sabe qual será seu envolvimen­to nem se interpreta­rá o pai.

Não seria novidade. O cantor atuou no musical “SamBRA”, em 2005, e há sete anos apresenta o programa “Samba na Gamboa” na TV Brasil, com exibição pela Cultura.

Aos 37 anos, Diogo é não só o principal nome de sua geração no samba como já está no time de cima, tendo angariado respeito dos que o precederam, como Zeca Pagodinho.

O músico já lançou nove álbuns —todos foram indicados ao prêmio Grammy Latino, que ganhou duas vezes. Neste fim de semana, ele tem compromiss­os em São Paulo. Na sexta-feira (8), canta na Casa Natura e, no sábado (9), vai a São Caetano do Sul, no ABC.

Os shows terão repertório misto; um pouco do disco “Alma Brasileira” (2016), no qual canta compositor­es além do samba, como Jorge Ben e Cazuza, e outro tanto de “Munduê” (2017), seu elogiado disco mais recente, todo autoral.

O repertório deve incluir também um novo single, “Tá Faltando o Quê”, que ganhou vídeo gravado em Madureira, bairro carioca onde desde novembro ele conduz uma roda de samba com a próxima edição marcada para 17 de março.

O vídeo será lançado na segunda (11), no YouTube e no Multishow —assista a um trecho em folha.com/6rqn4u9l. É o primeiro lançamento de Diogo como um artista independen­te, após 11 anos sob as grifes Universal e EMI.

“Foi muito bom, agradeço aos que fizeram tanto por mim, mas está sendo melhor assim; faço o que quero com mais velocidade e amplitude.”

Ele trilha caminho inverso do roteiro tradiciona­l em que artistas nascem independen­tes e crescem até chamarem a atenção de uma corporação. “Há toda uma burocracia para as coisas, enquanto no independen­te você pega e faz. Os que começaram em gravadora hoje estão fora, já perceberam”, diz, aos risos.

Também o diverte pensar que vem aí o Carnaval, de conflito entre folia e labuta; ele fará seis shows e percorrerá milhares de quilômetro­s para se apresentar do Rio Grande do Sul a Fortaleza, passando pelo Rio, onde cantará no camarote de Zeca na Sapucaí.

Sem contar o bloco Clube do Samba, fundado por seu pai e amigos dele, como o poeta Paulo César Pinheiro, e que em 2019 celebra 40 anos em desfile na terça de Carnaval na avenida Atlântica, no Rio, para até 30 mil foliões.

Falta tempo também para se dedicar à Portela, sua escola de coração e para a qual já ajudou a escrever enredos, quatro dos quais renderam títulos do Carnaval carioca —o pai também começou portelense, mas depois migrou para a Tradição, fundada por dissidente­s chateados com o que viam como ofensa a tradições.

Mas, como outras celebridad­es do samba, Diogo se dá bem com diversas escolas, e em 2018 desfilou também na Mangueira, na Salgueiro e na Mocidade Independen­te.

O cantor reforça a observação constante na conversa: funk e samba estão se amalgamand­o em bailes e rodas país afora. Ele vai além e dá dicas de que pode flertar com o batidão em breve.

“É assim no Brasil inteiro: a festa começa no pagode e termina no funk. Eu mesmo tenho novidade chegando.”

Mas isso significar­ia decadência? Diogo, aliás, responde com frequência perguntas sobre o possível fim do samba.

“Existe um esquema político nas rádios que resulta no predomínio do sertanejo. Mas o samba sempre esteve sendo feito. Eu, Zeca, Jorge, Alcione. Nunca teve momento ruim.”

Inclusive em São Paulo, ele diz, refutando a rivalidade antiga entre os sambas carioca e paulista, de cuja lavra cita nomes como Os Pretos e rodas como a do Samba da Vela.

Desafeito à imparciali­dade na política, Diogo acompanha atento os primeiros movimentos do governo Jair Bolsonaro, em quem diz não ter votado, mas ressalta um cuidado.

“Acho cedo pra dizer se está bom ou ruim. A gente tem de ter esperança e pensamento positivo. Mas fico atento, observo. Ele diz que fará coisas boas pelo povo; quero ver. Se não fizer, vou me pronunciar.”

Diogo Nogueira

Casa Natura Musical - r. Artur de Azevedo, 2.134. Sex. (8): 23h. Ingr.: R$ 100 a R$ 200, p/ eventim.com.br. 12 anos. Teatro do Externato Santo Antônio - r. São Luís, 80, São Caetano do Sul (SP). Sáb. (9): 23h. Ingr.: R$ 140 a R$ 180, p/ ticketbras­il.com.br. Livre

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Divulgação O cantor e compositor Diogo Nogueira, que faz shows em São Paulo no fim de semana

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