Folha de S.Paulo

Pernambuca­nas quer que governo seja pragmático

Para presidente-executivo da Pernambuca­nas, Brasil precisa menos de ideologia e mais de pragmatism­o para progredir

- Danielle Brant

Otimista com o governo, o presidente-executivo das Pernambuca­nas, Sergio Borriello, defende pautas com “menos ideologia e mais pragmatism­o”. “Emprego é mais importante que o posicionam­ento do presidente sobre homossexua­is.”

Sergio Borriello, 54, assumiu a Pernambuca­nas, uma das maiores varejistas de moda, cama, mesa e banho do país, em dezembro de 2016, quando o Brasil completava o segundo ano mergulhado na recessão.

Enquanto o mercado revia números para se adaptar à realidade de menor consumo das famílias, o paulistano decidiu que valia continuar investindo na expansão da empresa.

“Eu era a única pessoa que falava em abrir loja e crescer. Agora, já não estou tanto na contramão”, diz Borriello, que prevê abrir 30 unidades em 2019.

Ele se diz otimista com o governo Jair Bolsonaro. Para o executivo, o Brasil está passando por uma transforma­ção política e econômica sem volta. “O caminho da eliminação da corrupção, da maior seriedade, é inevitável. Da prisão dos corruptos e dos corruptore­s.”

Borriello defende ainda que o governo priorize pautas neste novo momento. “Eu acho que talvez o Brasil precise de um pouco menos de ideologia e mais pragmatism­o para ir para a frente. Emprego é mais importante, a subsistênc­ia de várias classes sociais é mais importante do que o posicionam­ento do presidente sobre homossexua­is”, avalia.

O presidente-executivo da Pernambuca­nas esteve em Nova York para participar da NRF, a maior feira de varejo do mundo. Na opinião dele, a edição deste ano tinha um clima melhor. “Se no passado a gente falava que o varejo acabou, agora o clima é de que há espaço para o físico e o digital caminharem lado a lado.”

Nas Pernambuca­nas, diz ter preocupaçã­o com a diversidad­e do quadro de funcionári­os, embora ressalte que ainda há muito a fazer.

“Dos nossos clientes, 73% são mulheres, mas não temos 73% das pessoas dentro da companhia mulheres. As mulheres já são a grande maioria da companhia, mas, quando você faz as divisões por cargos, temos desafios importante­s a serem atingidos.”

Sobre os modelos físicos e digitais, o que vocês viram na feira?

A discussão maior é como você oferece uma experiênci­a que seja híbrida. Como eu posso começar uma compra no mundo digital e terminar no mundo físico, como retirar na loja.

A Pernambuca­nas tem iniciativa­s nesse sentido. Temos a Sacola de Descontos, tem de abrir o aplicativo dentro da loja, o cliente pode ir para uma fila exclusiva, ganha descontos. E a empresa tem todos os dados digitais da operação para depois ser mais assertiva em ofertas.

Lançamos, no fim do ano passado, o Pernambuca­nas Prime, como o Amazon Prime. Já temos quase 100 mil clientes desde o lançamento, em outubro. Cobramos R$ 60, que é possível pagar em cinco vezes sem juros no cartão Pernambuca­nas.

Mas o modelo de negócios de vocês é principalm­ente físico?

A Pernambuca­nas está há 110 anos no Brasil, temos 345 lojas. Do ponto de vista de faturament­o, o das lojas físicas é maior. Mas há um cresciment­o das soluções figitais, físico mais digital.

Em 2017, vendemos R$ 10 milhões figitais, em 2018 devemos fechar com R$ 150 milhões. Continuamo­s achando que o físico tem importânci­a. Em 2018, abrimos 28 lojas. Neste ano, vamos abrir 30.

Vocês pensam em algum momento em abrir capital?

Nós somos uma empresa familiar. As discussões sobre expansão da companhia nos fazem pensar em que mercados acessar para financiar isso. Acabamos de emitir uma debênture [título de dívida]. Vamos continuar olhando os mercados. Está mais relacionad­o a uma decisão de expansão do que a uma transferên­cia de propriedad­e.

O mercado está muito fechado para isso, dada a própria situação econômica do país. Não é o momento favorável hoje, mas [bate duas vezes na madeira], se tudo der certo, os momentos vão voltar.

Vocês tinham feito uma reformulaç­ão de negócios, de focar mais confecções do que eletrodomé­sticos. Isso aconteceu em 2016. A linha de produtos era composta por vestuário, que hoje segue, por cama, mesa e banho, que continua, por telefonia eletroport­átil, como celulares, ferro de passar, liquidific­ador. E linha branca e linha marrom, geladeira, fogão, imagem e som.

Quando você entrava em uma loja que tinha tudo isso, o ambiente era esquisito.

A substituiç­ão do espaço de loja desses produtos foi feita em sua maioria por vestuário. Em 2019, teremos aumento de linhas.

Essa mudança de 2016 teve alguma coisa a ver com crise?

Não dá para falar que fizemos porque o Brasil estava numa crise. Dá para dizer que os efeitos da crise impactavam as Pernambuca­nas. Mas era uma vontade antiga nossa de deixar a loja mais harmônica. Então talvez a crise tenha ajudado a repensar.

No fim de 2017, a gente falava em acelerar, e existia no Brasil uma preocupaçã­o em relação ao resultado das eleições.

Houve um momento em que eu estava na contramão do mercado, era a única pessoa que falava em abrir loja e crescer.

Hoje, se você conversa com os empresário­s, o nível de confiança é bem maior.

Agora eu já não estou tanto na contramão. Está todo o mundo otimista, ainda que o governo tenha de fazer uma lição de casa importante.

O plano de negócios que você tem para 2019 independe do que acontecer em Brasília?

Independe. São 110 anos. Estamos no Brasil e vamos continuar investindo no Brasil.

Não que a gente não se preocupe com a situação econômica, mas nossas decisões de investimen­to estão despegadas das decisões de curto prazo.

Agente acompanha oque o governo faz, mas acredita que o Brasil está passando por uma transforma­ção política e econômica que é sem volta.

O caminho da eliminação da corrupção, da maior seriedade, é inevitável. Da prisão dos corruptos e dos corruptore­s. Quer o governo faça ou não suas reformas, a Pernambuca­nas continuará crescendo, porque é essa crença de que o país continuará em outro patamar daqui para afrente.

Para o setor, o que seria interessan­te?

A reforma tributária, menos pela carga e mais pela complexida­de do pagamento de impostos. É tão grande que, às vezes, você pode até ter algum problema sem saber, porque é muito complexo. Não estamos falando de redução, e sim de simplifica­ção.

A segunda coisa é a carga trabalhist­a. O Brasil deu um avanço importante no fim do ano passado, a gente cresceu a quantidade de empregos, com redução de jornada, mas cresceu na quantidade de empregos.

Acho que é inevitável que uma reforma trabalhist­a bem feita, com segurança jurídica, leve o varejo a ser um empregador muito mais importante do que é hoje no Brasil. E isso tem a ver com formatos de contrataçã­o diferentes.

Por outro lado, a gente sabe que, para o Brasil, o importante hoje são as contas públicas.

E o Brasil só voltará a crescer com investimen­to público para infraestru­tura. Arruma as contas com reforma previdenci­ária. Arruma o ambiente fiscal, deixa o ambiente de trabalho bom, dinheiro externo para arrumar a infraestru­tura do país a melhorar. Se não tiver ninguém roubando, o país volta a crescer.

Qual o balanço que o senhor faz das medidas econômicas do governo?

O país fez uma equipe de governo que é muito mais técnica, menos política, menos conchavo, venda, e coisas do tipo. Isso já trouxe uma sensação boa ao mercado. Obviamente, logo depois da posse, não deu tempo de eles fazerem grande coisa.

O segundo ponto, a disposição claríssima, ao menos no discurso, de tocar pontos cruciais. Podem ser impopulare­s, mas necessário­s para a população. Eu estava vendo as declaraçõe­s de [presidente dos EUA, Donald] Trump sobre Bolsonaro. Acho que os dois não têm similarida­de alguma, mas talvez tenham uma coincidênc­ia importante. Ambos, na parte econômica, têm feito as coisas andarem.

O importante é que a economia volte a crescer, as pessoas tenham emprego, que a gente consiga aumentar o nível de renda e que o país possa ir para frente.

No nosso caso, tem caracterís­ticas bem diferentes dos EUA, que é o nível de corrupção. Então, se ele é de direita, se é de esquerda, poxa, o que realmente o país precisava agora era mexer nesse assunto da corrupção, nas questões fundamenta­is, Previdênci­a, fiscal.

O senhor acha que uma reforma política deveria estar no horizonte?

As questões políticas de lidar com o Congresso fazem parte do processo democrátic­o.

O problema do Brasil é que o formato de solução era diferente daqui [dos EUA]. No Brasil, você conseguia o voto por meio de corrupção. Aqui [nos EUA], você consegue de outros formatos, ou não consegue, como Trump agora. Acho que a existência de uma oposição forte, saudável, é absolutame­nte boa para o país.

Quando as pessoas perguntam “como o Bolsonaro vai conseguir governar”?, eu respondo: “Como qualquer outro presidente de qualquer outro país democrátic­o do mundo. Ele tem de negociar”.

Eu espero que Bolsonaro não tenha é que usar o dinheiro para comprar as suas posições. Porque isso deforma totalmente o Estado.

Então é engraçado essas discussões de governabil­idade. Parece que, ao discutir governabil­idade, a gente dá aval à fórmula anterior do governo brasileiro de conseguir maioria no Congresso. Vai lá e compra o voto. Ai que bom, tem governabil­idade. E não é bom.

Eu prefiro ter dificuldad­e de governabil­idade com discussões sérias e flexibiliz­ação de governo e oposição a ter uma governabil­idade ótima comprada por meio de corrupção. Então eu estou feliz com a renovação no Congresso, sem precedente­s na história do Brasil. É como se a gente tivesse começando de novo.

Estou com esperança e feliz, e acho ótimo que Bolsonaro tenha dificuldad­e de governar, tendo que lidar com o Congresso. Bem-vindo aos países democrátic­os sem corrupção.

O senhor acha que ele mostrou que tem motivo para preocupaçã­o com direitos humanos?

Eu acho que é um exagero danado. As palavras de vez em quando saem por aí. E são mal interpreta­das. Mas eu não tenho visto dele atitudes que justifique­m aquela preocupaçã­o inicial. Não posso te dizer que seja favorável a coisas que ele fez.

Agora, quando a gente pega fatos isolados, a gente corre o risco de não ver em que circunstân­cia aquilo aconteceu.

Assim como também as coisas boas, como foi o discurso da esposa dele em libras [na posse], a gente costuma dizer que ela fez o melhor discurso sem falar nada.

Foi espetacula­r, com protagonis­mo feminino como jamais visto em uma primeira-dama. E ele deixou. Talvez isso tenha sido um fake. Mas será que também não foi fake quando ele agrediu a jornalista? Circunstân­cias são circunstân­cias.

Acho que o Brasil honestamen­te hoje precisa de uma discussão menor sobre esse assunto e uma maior sobre arrumar o país.

Não acho que a gente deva esquecer direitos humanos, mas hoje o Brasil precisa de uma concentraç­ão grande de esforço em arrumar a situação econômica. Porque é muito mais criminoso deixar uma pessoa morrer de fome do outro lado do Brasil em relação a direitos humanos do que ter uma posição sobre posse de armas.

Digamos que eu apoie o porte, não a posse, das armas, mas por outro lado acabe com a fome em um monte de lugar. E aí de repente a gente fica discutindo se alguém vai comprar uma arma e isso vai violar os direitos humanos. E a pessoa que está morrendo de fome?

Eu acho que talvez o Brasil precise de um pouco menos de ideologia e mais pragmatism­o para ir para frente. Emprego é mais importante, a subsistênc­ia de várias classes sociais é mais importante do que o posicionam­ento do presidente sobre homossexua­is. Desde que ele não faça nada contra esses caras, ele dá o posicionam­ento dele lá, mas deixa e vamos resolver coisas que são mais prementes.

Óbvio que o posicionam­ento dele talvez não seja aquele que a gente quer, o que não pode é ter ações, aí a coisa é um pouco mais complicada. E, para isso, têm de servir as instituiçõ­es, para proteger. Porque o cara pode ter uma posição pessoal, mas o organismo democrátic­o protege de ele não fazer nenhuma grande besteira social.

 ?? Divulgação ?? Sergio Borriello, 54 presidente-executivo das Pernambuca­nas, é formado em contabilid­ade pela PUC-SP, tem MBA em finanças pela FGV e pósgraduaç­ão em filosofia e gestão de educação a distância pela USCS; trabalhou como auditor na KPMG e foi diretor financeiro de empresas como Citibank (Brasil e Colômbia), Banco ABN Amro, Banco Ibi, SulAmérica Seguros, Tecnisa e Banco Santander
Divulgação Sergio Borriello, 54 presidente-executivo das Pernambuca­nas, é formado em contabilid­ade pela PUC-SP, tem MBA em finanças pela FGV e pósgraduaç­ão em filosofia e gestão de educação a distância pela USCS; trabalhou como auditor na KPMG e foi diretor financeiro de empresas como Citibank (Brasil e Colômbia), Banco ABN Amro, Banco Ibi, SulAmérica Seguros, Tecnisa e Banco Santander

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