Folha de S.Paulo

Com esqueletos, rombo nas contas do Rio chega a R$ 30 bi, diz secretário

Solução para crise dos estados só virá com a revisão do pacto federativo, afirma Luiz Cláudio Carvalho

- Nicola Pamplona

Em seu primeiro mês de trabalho, o secretário de Fazenda do Rio, Luiz Cláudio Carvalho, identifico­u quase R$ 30 bilhões descoberto­s nas contas do estado, resultado da crise fiscal e de artifícios contábeis promovidos pelo governo anterior.

Ele elegeu como foco inicial o combate à sonegação, mas crê que a solução para a crise dos estados só virá com a revisão do pacto federativo, garantindo maior fatia da receita aos governos estaduais.

O Rio é até agora o único estado a aderir ao regime de recuperaçã­o fiscal, programa criado pelo governo Michel Temer (MDB) que suspende a cobrança da dívida com o Tesouro em troca de medidas de austeridad­e.

A medida garantiu ao menos o pagamento em dia de salários de servidores, que começaram a atrasar em 2015 e chegaram a ser parcelados em diversos meses. Ainda assim, o Orçamento prevê um déficit de R$ 8 bilhões para este ano.

Carvalho afirma ter se surpreendi­do com outros esqueletos. Dívidas com fornecedor­es, por exemplo, inscritas na rubrica restos a pagar, somam R$ 16,5 bilhões, sem nenhum correspond­ente em receitas, como costuma acontecer.

Além disso, recursos de fundos vinculados a destinação específica, como investimen­tos em ambiente, vinham sendo usados para outras despesas e hoje têm um rombo de R$ 5 bilhões.

“É uma situação bastante preocupant­e”, diz ele, que ocupava a Secretaria da Fazenda de São Paulo quando foi convidado pelo governador Wilson Witzel (PSC) para cuidar das finanças do Rio.

“Em alguns momentos o estado chega ter R$ 200 milhões, R$ 300 milhões apenas no caixa. A grande missão é recompor a segurança financeira, produzir superávits e criar um colchão que dê tranquilid­ade para o estado não voltar a passar por sustos.”

Nesse sentido, como primeira ação, ele elegeu o combate à sonegação fiscal. Em janeiro, o estado deflagrou três operações contra sonegadore­s, em setores com perdas identifica­das de quase R$ 2 bilhões.

Carvalho sabe que não recuperará todo o valor —uma meta está sendo definida para o ano—, mas argumenta que, além de garantir receita, o combate à sonegação melhora o ambiente de negócios, ajudando a trazer investimen­tos.

Ele diz que gestões anteriores desorganiz­aram o sistema de combate a sonegadore­s, provavelme­nte com o objetivo de dificultar as fiscalizaç­ões, e que o esforço atual pode resultar em processos criminais contra agentes coniventes com os crimes.

“O estado sofreu uma desorganiz­ação muito grande, e o resultado visível disso é a prisão de agentes políticos dos governos anteriores. O não combate à sonegação é a desorganiz­ação mais organizada que já presenciei. Existe uma inteli- gência por baixo da bagunça.”

Em um segundo momento, o governo pretende trabalhar em simplifica­ção das regras tributária­s, também para facilitar o investimen­to.

A redução de impostos, porém, está descartada —o Rio de Janeiro tem hoje alíquotas de ICMS entre as mais caras do país. Também não haverá aumento, diz.

Do lado das despesas, Witzel determinou em seu primeiro dia de governo corte de 30% no gasto de secretaria­s considerad­as não essenciais. Educação, Segurança e Saúde estão fora. Pelo contrário, a ideia é poder aumentar os gastos quando a receita permitir.

Carvalho diz que um dos principais desafios é reduzir a dependênci­a do petróleo, principal atividade econômica do estado, que varia de acordo com fatores geopolític­os. “Não podemos suportar a solidez fiscal do estado nisso.”

Witzel quer também negociar com a União revisão no plano de recuperaçã­o fiscal. O governador já adiantou que quer rever a exigência de privatizaç­ão da Cedae (Companhia Estadual de Água e Esgoto).

As ações da empresa são contragara­ntias a empréstimo de R$ 2,9 bilhões obtido em 2017. Caso o valor não seja pago em 2020, o governo federal pode tomar a estatal.

“O que a gente busca são alternativ­as para a própria Cedae. Há modelagens em estudo para o governador decidir. Pode ser privatizaç­ão plena, abertura de capital, a cisão em várias outras empresas que vão prestar parte dos serviços, PPPs [parcerias público-privadas]”, diz o secretário.

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