Folha de S.Paulo

Futebol brasileiro esqueceu do centroavan­te de ofício

Artilheiro no Japão, ex-corintiano Jô defende o camisa 9 e responsabi­liza o Barcelona pelo que considera uma escassez de atacantes de área

- Luciano Trindade

Na última temporada, o Campeonato Brasileiro teve a sua pior média de gols desde 1990. Foram 2,18 por partida. Um dos fatores que ajudam a entender esse dado é a escassez de grandes centroavan­tes no país.

Para o atacante Jô, artilheiro do Nacional em 2017 pelo Corinthian­s, com 18 gols, o Barcelona tem uma grande parcela de culpa nisso.

“De uns anos para cá, muitos clubes passaram a jogar com um falso 9 e a nova geração de jogadores tem isso como referência”, diz o ex-corintiano, em entrevista à Folha.

“O Barcelona começou isso naquela época pós-saída do Eto’o. Mas só deu certo porque eles tinham grandes jogadores, fora o Messi, que é um cara fora do normal”, explica.

Aos 31 anos, o atacante defende atualmente o Nagoya Grampus, do Japão, clube para o qual se transferiu logo após conquistar o Brasileiro de 2017. Lá, ele também provou a importânci­a de um centroavan­te de ofício. Com 24 gols, foi o artilheiro do campeonato e evitou o rebaixamen­to do time.

Mesmo à distância, Jô se mantém ligado ao Brasil, principalm­ente ao Corinthian­s, que enfrenta neste domingo (10) o Novorizont­ino, pelo Campeonato Paulista.

Torcedor do clube, ele defende que Gustavo seja mantido por Fábio Carille como o atacante titular da equipe, à frente nas disputas com Mauro Boselli e Vagner Love. “[Gustavo] Está trabalhand­o, fazendo gols, então tem de continuar. E os outros têm de respeitar”, afirma.

Que avaliação faz da primeira temporada no Japão?

Individual­mente foi um ano especial. Não me lembro de ter conseguido 24 gols em uma liga no mesmo ano. O começo foi um pouco complicado, depois, as coisas encaixaram e os gols começaram a sair.

Em 2017, você foi artilheiro e campeão. No ano seguinte, ajudou o Nagoya a não cair. O que pressiona mais um atacante, confirmar um título ou evitar a queda?

Nunca tinha passado por uma situação dessas, de rebaixamen­to. Psicologic­amente desgasta muito mais. O lado bom é que aqui no Japão não tem tanta pressão. Eles respeitam muito os jogadores, sabem que é natural um time ser campeão e os outros terem outros objetivos.

Você já morou em vários lugares: Rússia, Inglaterra, Turquia, China... O que foi diferente na adaptação ao Japão?

Aqui é muito acima do que eu esperava, um país que oferece de tudo: educação, segurança, pontualida­de nos serviços. Meu filho mais velho já está na escola, minha esposa anda com tranquilid­ade. A gente sai e pode deixar a casa aberta, são coisas que em outros países nós não tínhamos e, infelizmen­te, o nosso país não tem essa liberdade. Estou apaixonado pelo Japão.

Por tudo isso, não pensa em voltar ao Brasil?

Aqui, pelo fato de ter uma boa vida, de os clubes pagarem bem, de os japoneses serem corretos e de terem uma cultura bem diferente de como tratar os jogadores, faz com que o jogador se sinta seguro em cumprir o contrato. Se vier uma situação de renovar, vou sentar com a minha família e ver porque é uma situação muito boa.

Na sua opinião, há uma carência de camisas 9 no futebol brasileiro?

De uns anos para cá, o futebol mundial passou a sofrer com isso. Muitos clubes passaram a jogar com o falso 9. O Barcelona, pós-saída do Eto’o, fez isso. O time foi incorporan­do o tiki-taka do [Pep] Guardiola. Deu certo porque tinha grandes jogadores e era a maneira deles de jogar, fora o Messi, que é fora do normal. O futebol brasileiro também foi muito influencia­do por essa coisa que veio de fora. Muito se olhou para a agilidade e habilidade, mas esqueceram um pouco do centroavan­te de ofício, que enche o saco dos zagueiros. Infelizmen­te, deixamos de lado isso.

Qual a sua opinião sobre os centroavan­tes que o Corinthian­s trouxe para 2019?

Gostei muito das três contrataçõ­es. Com o Gustavo eu tive o prazer de estar com ele no Corinthian­s, no começo de 2017. É um menino do bem, trabalhado­r. O Boselli é um cara mais experiente, tem números muito bons, acredito que vai ajudar bastante. E tem o Vagner Love que, além de jogar como centroavan­te, pode fazer várias funções. Quem eu colocaria para jogar? Hoje, sem dúvida, o Gustavo está na frente. Está trabalhand­o, fazendo gols, então tem de continuar. E os outros têm de respeitar.

Em entrevista à Folha, Carille afirmou que o elenco atual do Corinthian­s é melhor que o de 2017. Concorda?

Se analisarmo­s as contrataçõ­es de 2017, a maioria chegou questionad­a. Eu mesmo, pelo fato de estar seis meses sem jogar. Mas cada jogador colocou na cabeça que teria de provar seu valor e o Fábio [Carille], com a saberia dele, montou uma equipe consistent­e. Então, realmente, é um pouco diferente. Agora, melhor (risos)... Aí já vou discutir com o Carille (risos). Nosso time foi campeão brasileiro.

 ??  ?? João Alves de Assis Silva (Jô), 31 Revelado no Corinthian­s em 2003, passou por Rússia, Inglaterra e Turquia. No Brasil, jogou no Internacio­nal e no Atlético-MG antes de retornar ao Corinthian­s. Hoje está no Japão
João Alves de Assis Silva (Jô), 31 Revelado no Corinthian­s em 2003, passou por Rússia, Inglaterra e Turquia. No Brasil, jogou no Internacio­nal e no Atlético-MG antes de retornar ao Corinthian­s. Hoje está no Japão

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