É saudosista pôr crítica, que já não apita nada, no nível do mercado
“Uma crítica ruim é melhor do que cair no buraco de ser anônimo”, diz Morf Vandewalt, o crítico-clichê de “Velvet Buzzshaw”, como se a crítica ainda tivesse importância no já avançado século 21.
Críticas fizeram e desfizeram carreiras. No Brasil, o caso mais lembrado é sempre o texto de Monteiro Lobato sobre Anita Malfatti, de 1917, que provocou uma guinada na carreira da pintora.
Nesse sentido, o filme pode ser visto até como saudosista ao colocar no mesmo nível a crítica e o mercado de arte, mas é bem realista em relação a essa segunda categoria.
Críticos, hoje, não apitam nada. Seguimos interlocutores de artistas, ajudando a criar uma ponte entre a produção artística e um público mais amplo, ou então pontuando questões do circuito que nem sempre são tão óbvias. Mas isso não representa mais ser possível provocar alterações significativas de rota.
Há muitos agentes no atual circuito de arte que possuem muito mais força do que os críticos há cem anos, como curadores, colecionadores, galeristas e consultores.
Críticos podem ajudar a dar um verniz a mais, mas quem faz e destrói carreiras, como o filme retrata até bem, são especialmente os outros agentes, galeristas e consultores, alguns ainda por idealismo, muitos por dinheiro.
Nesse sentido, faltou retratar bem no filme o grupo dos colecionadores, que mandam em museus e bienais, muitas vezes conseguindo inserir artistas de sua coleção particular em exposições, visando em boa parte a valorização financeira de seus bens.
É até fantasioso mesmo imaginar que um crítico de arte possa, hoje em dia, ter um depósito cheio de obras, como ocorre em “Velvet”. Pode já ter ocorrido, como foi o caso da célebre coleção de Clement Greenberg, mas este é um caso ímpar com uma história bastante controversa.
Por isso, a empáfia de Morf Vandewalt é um tanto deslocada. Críticos que agem com esse perfil ainda se veem em um contexto que já não existe e acabam apenas contribuindo para levar a crítica ainda mais para o buraco.