Folha de S.Paulo

Rio de tragédias

Acerca de sequência de eventos mortais na cidade.

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A cidade do Rio de Janeiro, não bastassem as sequelas sentidas na capital de um estado assolado por rara sucessão de governos desastroso­s, viu-se abalada por três tragédias em sequência, no espaço de dois dias. Em sua esteira, contaram-se três dezenas de mortes.

O primeiro flagelo se abateu sobre a capital fluminense na noite de quarta para quinta-feira (6 e 7). Em poucas horas, despencara­m — em especial sobre bairros das zonas sul e oeste— mais de 100 mm de chuva, com rajadas de vento superiores a 100 km/h.

O saldo da tempestade revelouse aterrador. Foram sete mortos, dois deles num ônibus colhido por deslizamen­to de lama e árvores na avenida Niemeyer. A prefeitura decretou estado de crise e luto oficial. A Defesa Civil recebeu mais de 500 chamados para vistoria.

Os bombeiros terminavam os trabalhos para desinterdi­tar a famosa via de ligação entre as zonas sul e oeste, na sexta-feira, quando circulou a notícia tenebrosa: um incêndio no centro de treinament­o de futebol do Flamengo, local conhecido como Ninho do Urubu, no bairro Vargem Grande (zona oeste).

O fogo consumiu um alojamento onde se abrigavam meninos e rapazes das categorias de base do clube. Dez deles foram encontrado­s mortos, e três ficaram feridos.

A terceira desgraça se deu na mesma sexta-feira no morro do Fallet, região central. Investida da Polícia Militar, que teria sido recebida a tiros no local, resultou na morte de pelo menos 14 pessoas.

A ação foi motivada pela série de confrontos entre quadrilhas rivais nos morros do Fallet, da Coroa e do Fogueteiro. Não se tem notícia de baixas entre os agentes policiais.

Há pouca coisa em comum, além da coincidênc­ia temporal, na origem dos três desastres. Pode-se dizer, contudo, que a ineficiênc­ia estatal no mínimo contribuiu para ampliar o número de vítimas.

Não foi a primeira chuva torrencial a flagelar o Rio de Janeiro, nem a única vez em que parte da ciclovia da avenida Niemeyer ruiu sob a ação de causas supostamen­te naturais —é evidente que há algo de equivocado naquele projeto.

O local de moradia dos jovens atletas no centro de treinament­o do Flamengo, sabe-se agora, contava apenas com licença para funcionar como estacionam­ento. Falhou o clube ou falhou a prefeitura?

No morro do Fallet, surge mais um episódio de chocante letalidade policial. Há que aguardar as investigaç­ões para determinar se a violência foi desproporc­ional, mas não será surpresa se o evento entrar para a deplorável crônica de chacinas da PM fluminense.

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