Folha de S.Paulo

Programa de Doria busca preservar obras no estado

Lista inclui ajuste no sistema de Previdênci­a, abertura do capital de estatais e foco em privatizaç­ões e parcerias público-privadas

- Maeli Prado

Já de olho nas eleições de 2022 e diante de um cenário orçamentár­io cada vez mais apertado, o governador João Doria (PSDB) prepara uma série de medidas para evitar um sufocament­o dos investimen­tos no estado de São Paulo.

O quadro atual aponta para um cenário em que 70% da arrecadaçã­o paulista seria gasta com aposentado­rias, salários e auxílios de servidores daqui a quatro anos, em seu no último ano do atual mandato.

A lista de prioridade­s inclui mudar o sistema de Previdênci­a, a abertura do capital de empresas estatais ao setor privado, como a Sabesp, e foco em privatizaç­ões e em parcerias público-privadas. A reformulaç­ão nas aposentado­rias deve ficar para depois da aprovação da reforma federal, prevista para o primeiro semestre deste ano no Congresso.

Cinco estados, entre eles São Paulo, propuseram ao Ministério da Economia que as alterações fossem extensivas às aposentado­rias estaduais.

“A prioridade é certamente a idade mínima de homens e mulheres, além de todos os outros pontos da proposta que encaminham­os ao Congresso quando eu era ministro da Fazenda”, disse à Folha Henrique Meirelles, secretário da Fazenda de São Paulo.

Ele destaca ainda que São Paulo aumentará suas receitas e reduzirá despesas com privatizaç­ões e concessões. “A Sabesp é uma prioridade absoluta. Além dela, outras privatizaç­ões de outras companhias estão sendo avaliadas, assim como concessões de obras de infraestru­tura.”

Em relação a outros estados, São Paulo está em uma situação fiscal mais confortáve­l, entre outras razões porque possui um fundo de previdênci­a complement­ar, criado em 2012, para servidores.

Isso impediu uma alta ainda maior das despesas, mas a conta de salários e aposentado­rias continua crescendo, o que pode ameaçar o montante de recursos à disposição para investimen­tos públicos.

De 2015 a 2018, durante os governos de Geraldo Alckmin (PSDB) e depois de Márcio França (PSB), os gastos com funcionári­os ativos e inativos cresceram cerca de R$ 10 bilhões, para R$ 89,8 bilhões.

Outros R$ 6,6 bilhões serão desembolsa­dos a mais com pessoal nos próximos dois anos, segundo a Secretaria da Fazenda do estado.

Esse cresciment­o vegetativo, que só pode ser controlado com mudanças estruturai­s nas aposentado­rias e salários, pode fazer com que, em 2022, o estado tenha a seguinte situação: para R$ 100 arrecadado­s, R$ 70 seriam gastos com servidores inativos e ativos, auxílios e locação de mão de obra.

A projeção é de um estudo da especialis­ta em contas públicas Ana Carla Abrão. Segundo o levantamen­to, se nesse cálculo forem incluídos serviços de terceiriza­dos ao estado, a conta subiria para R$ 78.

A estimativa foi feita para todos os entes da federação.

No último ano de mandato dos governador­es que assumiram neste ano, 17 estariam em situação mais delicada do que a de Doria. Outros nove estados devem apresentar um quadro fiscal melhor.

“São Paulo possui uma gestão fiscal mais austera, responsáve­l, e conseguiu impedir o agravament­o de sua situação fiscal”, diz a economista, que é ex-secretária de Fazenda de Goiás e sócia da consultori­a Oliver Wyman. “Mas, como todos os outros estados, terá que fazer mudanças mais robustas na Previdênci­a.”

Essa metodologi­a do estudo é contestada pelo governo, já que subestima o cresciment­o da arrecadaçã­o paulista. O cálculo, diz o governo, deveria levar em conta somente funcionári­os com vínculo empregatíc­io com o estado e não incluir auxílios, que seriam despesas que não necessaria­mente precisam ocorrer todos os anos.

No curtíssimo prazo, a situação está sob controle, com receitas de R$ 204,7 bilhões e despesas de R$ 198,5 bilhões previstas para 2019, de acordo com a Secretaria da Fazenda. Neste ano, São Paulo espera fechar no azul (R$ 7 bilhões) e investir R$ 12,6 bilhões.

“Quando se olha as obrigações em comparação com a disponibil­idade de caixa, São Paulo está bem”, diz o economista Fabio Klein, da consultori­a Tendências. Na avaliação dele, o maior risco para o estado é o elevado endividame­nto, que ultrapasso­u os R$ 300 bilhões no ano passado.

Ele observa que a relação entre dívida e receita está em 196%, quase no limite dos 200% estabeleci­dos como teto pela Lei de Responsabi­lidade Fiscal. Por isso, um levantamen­to da consultori­a classifica o risco de crédito de São Paulo como “muitíssimo alto”.

“Em um cenário como o atual, com inflação e juros baixos, a gestão dessa dívida está sob controle. Se a economia começar a desandar, financiar esse endividame­nto se torna mais caro, e o estado pode ter que começar a escolher entre pagar fornecedor­es ou manter o serviço da dívida.”

Sobre isso, o governo diz que a dívida de SP está renegociad­a até 2047 e que um cenário de elevada instabilid­ade na economia é improvável.

Klein aponta que o montante de investimen­tos do estado, apesar de estar em um patamar acima de outros, ainda é baixo. “Hoje os investimen­tos representa­m somente 4% da despesa total de São Paulo. Essa não é uma boa taxa.”

Para incrementa­r essa relação, Doria pretende dar andamento a cerca de 200 projetos em parceria com a iniciativa privada, além de privatizaç­ões e investimen­tos diretos. Juntos, poderiam atrair cerca de R$ 50 bilhões.

Ao mesmo tempo, o governador vem sendo pressionad­o por diferentes setores da indústria, como empresas aéreas e montadoras, para dar descontos em impostos.

Os pedidos vêm encontrand­o espaço. Na última semana, por exemplo, Doria anunciou uma redução no ICMS cobrado no querosene de aviação. A General Motors, que ameaçou sair do país se não voltar a ter lucro, também pode ser beneficiad­a pela antecipaçã­o de créditos de ICMS, medida em estudo. Se aprovado, esse auxílio teria que ser estendido às demais montadoras.

“A Sabesp é uma prioridade absoluta. Além dela, outras privatizaç­ões de outras companhias estão sendo avaliadas

Henrique Meirelles secretário estadual de Fazenda

“Se a economia começar a desandar, financiar esse endividame­nto se torna mais caro

Fabio Klein economista da Tendências

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