Investigação sobre Queiroz desacelerou durante eleições
De agosto a novembro, investigação sobre transações atípicas de ex-assessor não gerou medidas relevantes; Promotoria não comenta
Dados do Ministério Público do Rio de Janeiro indicam que a investigação sobre a movimentação financeira de Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), desacelerou de julho a novembro do ano passado, período da campanha eleitoral.
Foram produzidos cinco relatórios financeiros de janeiro a 6 de agosto. Após isso, Queiroz foi notificado a depor três semanas depois do segundo turno.
Dados divulgados pelo Ministério Público do Rio de Janeiro indicam que a investigação sobre a movimentação financeira de Fabrício Queiroz, policial militar aposentado e ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), desacelerou de agosto a novembro do ano passado, período que compreende a campanha eleitoral.
Segundo histórico divulgado pela Promotoria, foram produzidos cinco relatórios financeiros de janeiro a 6 de agosto. Após isso, Queiroz foi notificado a depor apenas em 22 de novembro, três semanas depois do segundo turno.
Nesse intervalo, não há nenhuma outra movimentação relevante dos promotores formalizada no procedimento, segundo os dados divulgados.
A redução no ritmo da investigação no período eleitoral é corroborada ainda por relatório feito pelo promotor Cláudio Calo, no despacho em que se declarou suspeito para investigar Flávio.
O procedimento principal, aberto pelos promotores em 30 de julho, acumulava apenas 37 páginas até a eleição do filho do presidente Jair Bolsonaro ao Senado, em outubro. De novembro até terçafeira passada (5) foram produzidas mais de 300, além da inclusão de um pendrive e um DVD de conteúdo ainda desconhecido.
No início deste ano, em entrevista, o procurador-geral de Justiça do Rio, Eduardo Gussem, afirmou que, durante o período eleitoral, o Gaocrim (Grupo de Atribuição Originária Criminal), responsável pela apuração do caso, tinha como prioridade outras investigações que exigiam prisões.
De fato, no ano passado, foram realizadas cinco operações com a prisão de três prefeitos, dois presidentes de Câmaras Municipais e outras autoridades do estado —o Gaocrim investiga pessoas com foro especial. Quatro dessas operações ocorreram de julho a novembro.
Queiroz se tornou alvo de investigação após o Coaf (Conselho de Controle das Atividades Financeiras) identificar em suas contas movimentação atípica de R$ 1,2 milhão de janeiro de 2016 a janeiro de 2017. Além do volume, chamou a atenção do órgão a forma usada para as operações: com saques fracionados e depósitos de dinheiro vivo de alta quantia.
Esse relatório foi produzido em janeiro de 2018 a pedido do Ministério Público Federal no bojo da Operação Furna da Onça, que prendeu dez deputados estaduais. O pedido era que o Coaf informasse operações atípicas de funcionários da Assembleia local.
Contratado como motorista de Flávio, Queiroz foi identificado com outros 74 funcionários vinculados a 22 gabinetes de deputados estaduais. Não há informação pública sobre os demais 21 procedimentos. Investigadores relataram à Folha que a intenção era que todos tramitassem com o mesmo ritmo.
Segundo a Promotoria do Rio, o relatório do Coaf chegou à instituição em 3 de janeiro de 2018. Outros cinco levantamentos foram produzidos tanto pela Promotoria como pelo Coaf. O último deles, concluído em 10 de maio, faz um estudo específico sobre as movimentações de Queiroz. A portaria que instaurou a investigação foi publicada apenas dois meses após a entrega dessas informações.
O último movimento préeleitoral ocorre em 6 de agosto, quando a Promotoria recebeu mais um relatório do Coaf. Tanto o relatório do Coaf quanto o histórico feito pela Promotoria não apontam nenhuma outra movimentação relevante até 22 de novembro, quando o procedimento ganha nova dinâmica.
Naquela data, Queiroz foi notificado pela primeira vez a depor. O ex-assessor de Flávio faltou a esse e a outros dois depoimentos marcados. Também não compareceram os parentes do PM aposentado bem como outros ex-assessores do senador. O próprio Flávio, então deputado, não foi à Promotoria prestar esclarecimentos.
O Gaocrim pediu ainda no dia 14 de dezembro a produção de um relatório ampliado ao Coaf, abrangendo janeiro de 2007 a dezembro de 2018. Os alvos eram Flávio, Queiroz, Nathalia Queiroz, Evelyn Queiroz (ambas filhas do exassessor), Márcia de Oliveira Aguiar (mulher de Queiroz) e outros investigados.
O procedimento foi suspenso no dia 17 de janeiro, por liminar do ministro Luiz Fux, do STF (Supremo Tribunal Federal) —a investigação agora foi liberada pelo Supremo.
O mesmo Gaocrim que analisava a movimentação financeira do ex-assessor de Flávio decidiu arquivar em maio um procedimento que investigava as operações imobiliárias do senador. Nessa apuração, ele entregou declarações de renda que, na avaliação da Promotoria, indicavam a origem dos recursos para as operações.
O Ministério Público do Rio não comentou a desaceleração do procedimento durante a campanha eleitoral.
Na entrevista do mês passado, o procurador-geral Gussem comentou sobre o tempo de investigação. “O tempo da Justiça, infelizmente, não é o tempo da imprensa. Temos que tomar muito cuidado, porque estamos lidando com o nome de pessoas.”
“É do conhecimento de todos que o Ministério Público do Rio de Janeiro tem tido trabalhos grandiosos e intensos no combate à corrupção. O Gaocrim [grupo interno] teve trabalhos importantes na cidade de Niterói, Japeri, Petrópolis e Teresópolis, com vários agentes detentores de foro. Em determinados momentos temos que estabelecer algumas prioridades, uma vez superadas essas prioridades, vamos elegendo outras.”
No último ano, o grupo apresentou 22 denúncias contra 25 vereadores, um deputado estadual e nove prefeitos.
Flávio Bolsonaro tem afirmado que é vítima de perseguição e negado irregularidades nas suas contas e a existência de qualquer esquema indevido em seu gabinete.
Já o ex-assessor Fabrício Queiroz justificou sua ausência em depoimentos por problemas de saúde —ele faz tratamento contra um câncer no intestino. Em entrevista, afirmou que parte das transações atípicas se deve a compra e venda de carros usados. Ele não explicou, porém, por que recebeu dinheiro de colegas.