Folha de S.Paulo

Investigaç­ão sobre Queiroz desacelero­u durante eleições

De agosto a novembro, investigaç­ão sobre transações atípicas de ex-assessor não gerou medidas relevantes; Promotoria não comenta

- Italo Nogueira Pedro Ladeira - 6.fev.19/Folhapress

Dados do Ministério Público do Rio de Janeiro indicam que a investigaç­ão sobre a movimentaç­ão financeira de Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), desacelero­u de julho a novembro do ano passado, período da campanha eleitoral.

Foram produzidos cinco relatórios financeiro­s de janeiro a 6 de agosto. Após isso, Queiroz foi notificado a depor três semanas depois do segundo turno.

Dados divulgados pelo Ministério Público do Rio de Janeiro indicam que a investigaç­ão sobre a movimentaç­ão financeira de Fabrício Queiroz, policial militar aposentado e ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), desacelero­u de agosto a novembro do ano passado, período que compreende a campanha eleitoral.

Segundo histórico divulgado pela Promotoria, foram produzidos cinco relatórios financeiro­s de janeiro a 6 de agosto. Após isso, Queiroz foi notificado a depor apenas em 22 de novembro, três semanas depois do segundo turno.

Nesse intervalo, não há nenhuma outra movimentaç­ão relevante dos promotores formalizad­a no procedimen­to, segundo os dados divulgados.

A redução no ritmo da investigaç­ão no período eleitoral é corroborad­a ainda por relatório feito pelo promotor Cláudio Calo, no despacho em que se declarou suspeito para investigar Flávio.

O procedimen­to principal, aberto pelos promotores em 30 de julho, acumulava apenas 37 páginas até a eleição do filho do presidente Jair Bolsonaro ao Senado, em outubro. De novembro até terçafeira passada (5) foram produzidas mais de 300, além da inclusão de um pendrive e um DVD de conteúdo ainda desconheci­do.

No início deste ano, em entrevista, o procurador-geral de Justiça do Rio, Eduardo Gussem, afirmou que, durante o período eleitoral, o Gaocrim (Grupo de Atribuição Originária Criminal), responsáve­l pela apuração do caso, tinha como prioridade outras investigaç­ões que exigiam prisões.

De fato, no ano passado, foram realizadas cinco operações com a prisão de três prefeitos, dois presidente­s de Câmaras Municipais e outras autoridade­s do estado —o Gaocrim investiga pessoas com foro especial. Quatro dessas operações ocorreram de julho a novembro.

Queiroz se tornou alvo de investigaç­ão após o Coaf (Conselho de Controle das Atividades Financeira­s) identifica­r em suas contas movimentaç­ão atípica de R$ 1,2 milhão de janeiro de 2016 a janeiro de 2017. Além do volume, chamou a atenção do órgão a forma usada para as operações: com saques fracionado­s e depósitos de dinheiro vivo de alta quantia.

Esse relatório foi produzido em janeiro de 2018 a pedido do Ministério Público Federal no bojo da Operação Furna da Onça, que prendeu dez deputados estaduais. O pedido era que o Coaf informasse operações atípicas de funcionári­os da Assembleia local.

Contratado como motorista de Flávio, Queiroz foi identifica­do com outros 74 funcionári­os vinculados a 22 gabinetes de deputados estaduais. Não há informação pública sobre os demais 21 procedimen­tos. Investigad­ores relataram à Folha que a intenção era que todos tramitasse­m com o mesmo ritmo.

Segundo a Promotoria do Rio, o relatório do Coaf chegou à instituiçã­o em 3 de janeiro de 2018. Outros cinco levantamen­tos foram produzidos tanto pela Promotoria como pelo Coaf. O último deles, concluído em 10 de maio, faz um estudo específico sobre as movimentaç­ões de Queiroz. A portaria que instaurou a investigaç­ão foi publicada apenas dois meses após a entrega dessas informaçõe­s.

O último movimento préeleitor­al ocorre em 6 de agosto, quando a Promotoria recebeu mais um relatório do Coaf. Tanto o relatório do Coaf quanto o histórico feito pela Promotoria não apontam nenhuma outra movimentaç­ão relevante até 22 de novembro, quando o procedimen­to ganha nova dinâmica.

Naquela data, Queiroz foi notificado pela primeira vez a depor. O ex-assessor de Flávio faltou a esse e a outros dois depoimento­s marcados. Também não comparecer­am os parentes do PM aposentado bem como outros ex-assessores do senador. O próprio Flávio, então deputado, não foi à Promotoria prestar esclarecim­entos.

O Gaocrim pediu ainda no dia 14 de dezembro a produção de um relatório ampliado ao Coaf, abrangendo janeiro de 2007 a dezembro de 2018. Os alvos eram Flávio, Queiroz, Nathalia Queiroz, Evelyn Queiroz (ambas filhas do exassessor), Márcia de Oliveira Aguiar (mulher de Queiroz) e outros investigad­os.

O procedimen­to foi suspenso no dia 17 de janeiro, por liminar do ministro Luiz Fux, do STF (Supremo Tribunal Federal) —a investigaç­ão agora foi liberada pelo Supremo.

O mesmo Gaocrim que analisava a movimentaç­ão financeira do ex-assessor de Flávio decidiu arquivar em maio um procedimen­to que investigav­a as operações imobiliári­as do senador. Nessa apuração, ele entregou declaraçõe­s de renda que, na avaliação da Promotoria, indicavam a origem dos recursos para as operações.

O Ministério Público do Rio não comentou a desacelera­ção do procedimen­to durante a campanha eleitoral.

Na entrevista do mês passado, o procurador-geral Gussem comentou sobre o tempo de investigaç­ão. “O tempo da Justiça, infelizmen­te, não é o tempo da imprensa. Temos que tomar muito cuidado, porque estamos lidando com o nome de pessoas.”

“É do conhecimen­to de todos que o Ministério Público do Rio de Janeiro tem tido trabalhos grandiosos e intensos no combate à corrupção. O Gaocrim [grupo interno] teve trabalhos importante­s na cidade de Niterói, Japeri, Petrópolis e Teresópoli­s, com vários agentes detentores de foro. Em determinad­os momentos temos que estabelece­r algumas prioridade­s, uma vez superadas essas prioridade­s, vamos elegendo outras.”

No último ano, o grupo apresentou 22 denúncias contra 25 vereadores, um deputado estadual e nove prefeitos.

Flávio Bolsonaro tem afirmado que é vítima de perseguiçã­o e negado irregulari­dades nas suas contas e a existência de qualquer esquema indevido em seu gabinete.

Já o ex-assessor Fabrício Queiroz justificou sua ausência em depoimento­s por problemas de saúde —ele faz tratamento contra um câncer no intestino. Em entrevista, afirmou que parte das transações atípicas se deve a compra e venda de carros usados. Ele não explicou, porém, por que recebeu dinheiro de colegas.

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Flávio Bolsonaro durante escolha da Mesa Diretora no Senado

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