Folha de S.Paulo

Em sua edição mais feminina, Grammy exalta jovens e se mostra relevante

Festa exalta mulheres jovens e veteranas, mas censura Drake e dá razão a Gambino, ausente

- Rafael Gregorio

Com equilibrad­a reverência a gênios do passado e a talentos do presente e farta dose de feminilida­de, a 61ª edição do Grammy conseguiu a proeza de parecer relevante.

Em um mundo em que métricas como streams, seguidores em redes sociais e bilheteria­s cada vez mais superam chancelas institucio­nais, a premiação pode celebrar ter oferecido bons shows e uma curadoria que fez soar interessan­te a música de nossa era.

A edição mais feminina da história sucedeu anos em que o Grammy foi corretamen­te criticado por preterir mulheres. Neste domingo, a cerimônia foi das novinhas, com destaque para Lady Gaga, H.E.R., do melhor disco de R&B, Cardi B (disco de rap) e Dua Lipa, a artista revelação de 2018.

As veteranas também brilharam, e não só as que cantam. Chamada ao palco no início, a ex-primeira-dama americana Michelle Obama foi ovacionada antes de falar sobre o papel da música em sua vida: “Desde os discos da Motown até as canções que me inspiraram na última década”.

A demanda por representa­tividade parece ter reforçado a escolha pela cantora country Kacey Musgraves como a dona do disco do ano, além de ter pautado os esforços da apresentad­ora Alicia Keys.

A performanc­e dela deixou de lado o clima de piadinha frenética de premiações afins e preferiu incensar o talento dos gênios de ontem e de hoje.

Isso significou menos dinamismo, mas foi mais que compensado pela reverência, inteligênc­ia e bom gosto de Keys.

Entre tantas boas apresentaç­ões, destaque para a de Janelle Monáe, que fez um medley esteticame­nte impactante de suas canções “Make me Feel”, “PYNK” e “Django Jane”.

St. Vincent e Dua Lipa fizeram show instigante, apesar de as diferenças entre essas artistas ter prejudicad­o ambas —nem tão rock de vanguarda, nem tão pop sensual.

Também se destacou a cantora Brandi Carlile, nova estrela do country-pop que brilhou em show de alta voltagem dramática e excelência técnica.

O Grammy mandou bem nas homenagens, relembrand­o Chris Cornell (1964-2017), Aretha Franklin (1942-2018) e Dolly Parton, a “rainha do country”, incensada em vida.

Ainda houve espaço para discurso de autoajuda de Gaga e um inusitado ato pró-Donald Trump da cantora Joy Villa, que foi com um vestido que imitava o muro que o presidente dos EUA quer construir entre o país e o México.

A organizaçã­o ainda não divulgou a audiência e, por isso, não é possível saber se a festa recuperou parte dos 8 milhões de espectador­es que havia perdido na edição passada.

O Brasil foi o segundo país com mais mensagens no Twitter sobre o evento, atrás apenas dos EUA. No mundo, o grupo de k-pop BTS e as cantoras Gaga e Camila Cabello foram os mais mencionado­s.

Contudo, se quiser resgatar sua credibilid­ade, o Grammy vai precisar de mais autocrític­a e tolerância ao dissenso.

Drake teve seu discurso interrompi­do por comerciais justamente quando dizia que prêmios não são mais impor- tantes que a transforma­ção que boas músicas provocam.

“Se pagam para te ver, você não precisa disso”, disse, apontando a estatueta, antes de ser calado por reclames. A festa pediu desculpas e afirmou que alguém achou que ele havia acabado sua fala. Não cola.

Também será preciso atentar à presença de negros e mulheres. Em especial quando a suposta branquitud­e do Grammy teria motivado o boicote de Kendrick Lamar e Childish Gambino, dono do primeiro rap a vencer nas categorias principais; uma festa sem artistas da dimensão deles parece menos legítima.

 ?? Robyn Beck/AFP ?? Lady Gaga canta ‘Shallow’, do filme ‘Nasce uma Estrela’, escolhida a melhor performanc­e pop em duo ou grupo
Robyn Beck/AFP Lady Gaga canta ‘Shallow’, do filme ‘Nasce uma Estrela’, escolhida a melhor performanc­e pop em duo ou grupo
 ?? Mike Blake/Reuters ?? Lady Gaga, Jada Pinkett Smith, Alicia Keys, Michelle Obama e Jennifer Lopez na abertura da cerimônia
Mike Blake/Reuters Lady Gaga, Jada Pinkett Smith, Alicia Keys, Michelle Obama e Jennifer Lopez na abertura da cerimônia

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