Defensoria do Rio vê fuzilamento em ação policial
PM afirma que corpos foram achados em vias durante operação na sexta (8)
O ouvidor-geral da Defensoria Pública do Rio de Janeiro, Pedro Daniel Strozenberg, disse ver fortes indícios de fuzilamento na operação em morros do centro do Rio, na última sexta (8), que resultou em 13 mortes.
Gritos de “vagabunda”, ameaças de matarem “mais vinte”, policiais entrando nas casas e perguntando se a moradora era viciada são parte dos relatos feitos por moradores do morro do Fallet, centro do Rio de Janeiro, sobre a operação da Polícia Militar que deixou ao menos 13 mortos na sexta-feira (8).
Entre as queixas, a de que não deixaram moradores ir ao médico, nem sob pedidos de socorro, e “não me mata”.
Nesta terça (12), moradores e familiares dos assassinados participaram de conversa com a Defensoria Pública do Estado, em uma casa na comunidade.
Eles voltaram a afirmar que as mortes aconteceram depois que os suspeitos já haviam se rendido. A Polícia Militar, no entanto, afirma que houve confronto com os traficantes.
Os moradores não negam que familiares tivessem envolvimento com o tráfico, mas defendem que eles deveriam ter sido presos, e não mortos.
Pedro Strozenberg, ouvidor da Defensoria Pública, afirma que a operação teve falhas. Ele avalia que os depoimentos dos moradores são contundentes quanto à ocorrência de mutilações.
Nesta terça, os familiares deram mais detalhes sobre a forma que ocorreram os assassinatos, denunciando tortura. Um homem que não quis se identificar, tio de dois mortos, um de 16 anos e outro de 18, afirmou que os policiais esfaquearam os suspeitos depois de atirar nas pernas, para impedir que fugissem.
Há relatos, ainda, de sinais de espancamento e traumatismo craniano. De acordo com os moradores, os agentes não deixaram que ninguém se aproximasse da casa onde ocorreram a maioria das mortes e tiraram os corpos às pressas.
Os policiais militares levaram os 13 mortos ao hospital municipal Souza Aguiar. Segundo moradores, seria uma forma de inviabilizar a perícia dos corpos no local.
A reportagem leu três certidões de óbito que apontavam como causa da morte lesão polivisceral, ferimento transfixante do crânio, tronco e membros e ação perfuro contundente.
A Folha consultou um médico legista, que afirmou que os termos apontam que a causa primária da morte foi disparo por arma de fogo, atingindo cabeça, tronco e membros.
No entanto, apenas a autópsia poderá esclarecer com detalhes o estado em que os corpos chegaram ao IML e se, de fato, houve tortura.
A reportagem teve acesso a um vídeo, gravado no IML, que mostra corpos feridos e com buracos. Um dos suspeitos aparece com o intestino completamente para fora do corpo. Em nota, a PM informou que os corpos foram encontrados em vias da comunidade. Há, no entanto, imagens da casa com a parede cravejada de balas, o chão ensanguentado e mortos no chão.
O caso está sendo investigado pela Polícia Civil e pelo Ministério Público. A Divisão de Homicídios ouviu policiais envolvidos na ação, recolheu armas e as encaminhou à perícia. Agora, estão sendo ouvidos testemunhas e familiares.
No Ministério Público, a investigação está a cargo da 23ª Promotoria de Investigação Penal, auxiliada pelo Gaesp (Grupo de Atuação Especializada em Segurança Pública). O grupo vem recebendo informações, dados e imagens.
O órgão informou que ouvirá os comandantes dos batalhões de Choque, Bope (Batalhão de Operações Especiais) e Coe (Comando de Operações Especiais) que participaram da operação.
Os corpos foram enterrados neste domingo (10), no cemitério São João Batista, em Botafogo. Moradores dizem que mais dois suspeitos foram encontrados mortos na mata no morro dos Prazeres, onde também ocorreu a ação.
O governador do estado Wilson Witzel (PSC) vem prometendo, desde a campanha, que autorizará o “abate” de criminosos com armas pesadas.
O deputado estadual Rodrigo Amorim (PSL), que mantém bom trânsito com o governador, anunciou nesta terça que propôs homenagem ao Choque e ao Bope. “Eles mostraram aos marginais que a polícia do Rio de Janeiro tem que ser respeitada. Foram 13 CPFs cancelados”, escreveu.