Folha de S.Paulo

Não é mais o juro

Prestes a deixar o posto, atual equipe do BC teve o mérito de baixar a Selic e tirar da política monetária o espaço excessivo que ocupava no debate nacional

- editoriais@grupofolha.com.br

Acerca de Selic em patamar mais baixo da história.

Ainda não começou a política econômica de Jair Bolsonaro (PSL). Planos anunciados de venda de estatais, abertura comercial e desburocra­tização aguardam a definição da proposta de reforma da Previdênci­a e o pleno restabelec­imento da saúde do presidente.

A política econômica de Michel Temer (MDB), por sua vez, ainda não se encerrou. Em parte porque restam temas relevantes de sua agenda legislativ­a em tramitação no Congresso; em parte porque a cúpula do Banco Central permanece a mesma enquanto a nova diretoria indicada não passar pelo escrutínio do Senado Federal.

Foi sob o comando de Ilan Goldfajn que o BC decidiu neste mês manter sua taxa de juros, a Selic, inalterada em 6,5% ao ano —o patamar mais baixo desde sua criação, em 1986, e em vigor há quase um ano inteiro, outro recorde para os padrões brasileiro­s. Nesta terça-feira (12), detalharam-se os motivos da decisão cautelosa.

Em sua retórica peculiar, a instituiçã­o aponta que “persiste, apesar de menos intensa, a assimetria no balanço de riscos para a inflação”. Em português mais claro, o Comitê de Política Monetária entende que a probabilid­ade de a inflação subir é maior que a de cair.

Isso, como se depreende da mensagem, a despeito do elevado grau de ociosidade no setor produtivo, que recomenda uma atuação “estimulati­va” —ou seja, de juros baixos o bastante para incentivar o crédito, o consumo e o investimen­to. Para o BC, a Selic atual se encaixa em tais critérios.

Nesse cenário, pode parecer excesso de conservado­rismo a preocupaçã­o com a alta de preços. As expectativ­as de analistas para o IPCA, em queda, estão em torno de 3,87%, confortave­lmente abaixo da meta oficial para este 2019, de 4,25%. Nos últimos dois anos, aliás, o índice foi inferior à meta.

Entretanto é compreensí­vel que uma equipe prestes a deixar o posto prefira evitar decisões potencialm­ente controvers­as e capazes de afetar a confiança de empresário­s e investidor­es, hoje em alta. A cautela pode ser justificad­a, afinal, pelas incertezas relativas ao panorama global e às chances de aprovação da reforma previdenci­ária.

Essa diretoria do BC teve o mérito de tirar da política de juros o espaço excessivo que ocupava no debate nacional. Está claro, inclusive para o novo governo, que esse não é hoje o fator decisivo para a retomada do cresciment­o —embora haja muito a fazer para reduzir as taxas cobradas pelos bancos.

 ?? *Projeção. Fontes: IBGE e Banco Central ??
*Projeção. Fontes: IBGE e Banco Central

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil