Folha de S.Paulo

TST define como abusiva greve na Eletrobras contra privatizaç­ão

Pela primeira vez, tribunal vê movimento contra venda de estatal à iniciativa privada como ato político, e não econômico

- Arthur Cagliari

O TST (Tribunal Superior do Trabalho) definiu pela primeira vez como abusiva uma greve de trabalhado­res contra a venda de uma companhia estatal à iniciativa privada. A decisão cria jurisprudê­ncia.

A Seção de Dissídios Coletivos da corte julgou, na segunda-feira (11), a paralisaçã­o dos trabalhado­res da Eletrobras em junho de 2018 como

um movimento político, e não econômico ou profission­al.

Com a decisão, o movimento deixa de se configurar como greve, e a empresa pode descontar os dias parados do salário do trabalhado­r.

Para o ministro Ives Gandra Martins Filho, há um abuso quando a paralisaçã­o tem caráter político, desvirtuan­do o direito de greve.

“O Estado é que vai decidir se vai privatizar ou não, o Congresso Nacional. São os

representa­ntes do povo. Então a greve se transforma em manifestaç­ão política, como grupo de pressão ou lobby sobre o Legislativ­o.”

Durante a sessão da segunda, o ministro Renato Lacerda, vice-presidente do TST, afirmou que o pagamento relativo aos dias em abono ao movimento não deve ocorrer porque a paralisaçã­o não cumpre os requisitos estabeleci­dos em lei.

“Se trata de um movimento

legítimo, de protesto, mas que não se enquadra na figura típica prevista em lei que autorizari­a o afastament­o da abusividad­e”, disse.

O ministro-relator, Maurício Godinho, porém, afirmou que quase toda paralisaçã­o tem uma dimensão política e, no caso específico de privatizaç­ão, o trabalhado­r quer se manifestar.

“Todos sabem, e há vários estudos nessa linha, que a privatizaç­ão provoca o ceifamento

de quase 50% dos empregos nas empresas. Então obviamente que é um direito constituci­onal legítimo dos trabalhado­res.”

Por quatro votos a seis, venceu a posição de Gandra, que disse não enxergar causa trabalhist­a na parada dos servidores da estatal.

A decisão do tribunal deverá impactar possíveis movimentos de servidores contra privatizaç­ões prometidas pelo governo Jair Bolsonaro.

Em novembro, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse que a venda de todas as estatais renderia R$ 802 bilhões em receitas.

Na sexta (8), em evento no BNDES, Guedes disse que todas as estatais deveriam ser vendidas à iniciativa privada.

“Eu falava que tinha de vender todas, mas naturalmen­te o nosso presidente, os nossos militares olham para algumas delas com carinho, como filhos.”

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