Candidatas laranjas do PSL entram na mira de PF e Ministério Público
Polícia Federal intima candidata em Pernambuco para depoimento; Procuradoria Eleitoral investiga casos em Minas revelados pela Folha
O esquema de candidaturas laranjas do PSL, partido do presidente Jair Bolsonaro, se tornou alvo de investigações da Polícia Federal, do Ministério Público e da Polícia Civil.
As suspeitas, reveladas pela Folha, atingem candidatas em Pernambuco e em Minas Gerais. No primeiro caso, sob comando do grupo do atual presidente do PSL, Luciano Bivar. No segundo, vinculadas ao atual ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio.
A PF intimou a prestar depoimento uma candidata a deputada federal em PE que recebeu do partido R$ 400 mil de dinheiro público na eleição de 2018 e teve só 274 votos.
Conforme mostrou a Folha no domingo (10), a candidatura de Maria de Lourdes Paixão, 68, foi criada pelo grupo de Bivar, recém-eleito segundo vice-presidente da Câmara dos Deputados. Ela foi a terceira maior beneficiada com verba do partido no país, mais do que Bolsonaro e a deputada Joice Hasselmann (SP) —com 1,079 milhão de votos.
O dinheiro do fundo partidário do PSL foi enviado pela direção nacional da sigla para a conta da candidata em 3 de outubro. O hoje ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gustavo Bebianno, era na época presidente interino da legenda e coordenador da campanha de Jair Bolsonaro, com foco em discurso de ética e combate à corrupção.
Apesar de ser uma das campeãs de verba pública do PSL, Lourdes teve uma votação que representa um indicativo de candidatura de fachada, em que há simulação de atos de campanha, mas não empenho efetivo na busca de votos.
O depoimento de Maria de Lourdes na superintendência da PF no Recife foi marcado para as 11h desta quinta (14). Na manhã desta terça-feira (12), a Folha esteve na residência de Maria de Lourdes e na sede do PSL em Pernambuco. Ela não foi encontrada em nenhum dos dois lugares.
Na sede do partido, a recepcionista informou que Maria de Lourdes faltou ao trabalho também na segunda (11) para resolver problemas pessoais.
Ela será ouvida na PF num procedimento chamado Registro Especial, mecanismo formal para obter informações antes do inquérito policial —que ainda não foi aberto.
A Procuradoria Regional Eleitoral em Pernambuco também informou nesta terça que propôs ação de impugnação de contas eleitorais contra Maria de Lourdes. A ação sigilosa, diz, busca esclarecer eventuais irregularidades ligadas à candidatura.
Já a Polícia Civil de Pernambuco comunicou que instaurou inquérito para apurar as informações. O Departamento de Repressão ao Crime Organizado e Corrupção ficará à frente das investigações.
Dos R$ 400 mil repassados pelo PSL, Maria de Lourdes declarou ter gastado R$ 380 mil de dinheiro público em uma gráfica a quatro dias da eleição. Na semana passada, a Folha visitou um endereço que consta na nota fiscal da gráfica e encontrou apenas uma oficina de carros.
Na segunda-feira (10), a empresa, no endereço constante na Receita Federal, amanhe- Angelo Giardini de Oliveira chefe do Ministério Público eleitoral em Minas Gerais ceu de porta aberta. Numa sala pequena com duas mesas, não havia máquinas para impressão em larga escala.
Na semana passada, a Folha havia publicado que o atual ministro do Turismo patrocinou um esquema de candidaturas de fachada em Minas que receberam recursos volumosos do fundo eleitoral do PSL nacional e que não tiveram nem 2.000 votos juntas. Parte do gasto que declararam foram para empresas com ligação com o gabinete de Álvaro Antônio na Câmara.
A Procuradoria Regional Eleitoral de Minas Gerais decidiu investigar o caso.
Em despacho do dia 4 de fevereiro, em que disse considerar graves as suspeitas, o chefe do Ministério Público eleitoral do estado, Angelo Giardini de Oliveira, encaminhou o caso para apuração da Promotoria Eleitoral afirmando que “os fatos narrados podem configurar, em tese, os crimes de apropriação indébita eleitoral, falsidade ideológica eleitoral [...] e ameaça”, com penas que podem chegar a seis anos de reclusão.
O procurador requereu ainda à Justiça, dois dias depois,
“Os fatos narrados podem configurar, em tese, os crimes de apropriação indébita eleitoral, falsidade ideológica eleitoral [...] e ameaça
o congelamento por oito meses do trâmite da prestação de contas de campanha das candidatas, a fim de que as apurações criminais sejam levadas em conta nessa análise.
No documento, o procurador lista como base reportagem da Folha que mostrou que quatro candidatas a deputada estadual e federal em Minas receberam R$ 279 mil da direção nacional do PSL e tiveram votação inexpressiva.
Angelo Giardini também cita representação formulada por uma associação de Coronel Fabriciano (MG), um boletim de ocorrência e um depoimento prestado ao Ministério Público por outra candidata, Cleuzenir Barbosa, de Governador Valadares (MG).
No depoimento, também revelado pela Folha, ela afirma ter sido coagida por dois assessores de Álvaro Antônio a desviar para uma gráfica ligada ao parlamentar a maior parte do dinheiro que havia recebido dos cofres públicos.
A assessoria do Ministério do Turismo diz que Álvaro Antônio desconhece a investigação. “Caso ela seja aberta, será ótima oportunidade de esclarecer os fatos e provar que o ministro sempre agiu estritamente dentro da lei.”
O Ministério Público em Governador Valadares havia aberto procedimento preliminar em dezembro com base no depoimento de Cleuzenir, que não tinha por objeto as candidatas laranjas.
O caso foi encaminhado para a Procuradoria-Geral da República para análise de foro especial em Brasília —em decorrência do cargo de deputado federal de Álvaro Antônio.
A chefe do Ministério Público federal, Raquel Dodge, afirmou não ver relação do caso com o mandato parlamentar de Álvaro Antônio e devolveu o procedimento para Minas.