Folha de S.Paulo

Pente-fino do INSS fere regras do Orçamento

Estudo da Câmara aponta que governo federal não respeitou a legislação ao editar MP; entrada em vigor pode atrasar

- Bernardo Caram

Estudo feito pela Consultori­a de Orçamento da Câmara concluiu que o governo não respeitou exigências da lei ao editar a MP (medida provisória) que estabelece um pente-fino em benefícios do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social).

Inconsistê­ncias no texto geram risco de que o tema seja judicializ­ado e podem dar combustíve­l para partidos de oposição questionar­em a matéria durante a tramitação no Congresso Nacional.

Para técnicos, a medida só poderá ser colocada em prática na sua totalidade após o envio pelo governo e a aprovação no Legislativ­o de uma proposta complement­ar para corrigir as distorções.

O documento da consultori­a, elaborado para subsidiar o relator da medida, detectou que o texto fere quatro exigências previstas na LDO (Lei de Diretrizes Orçamentár­ias) e na Constituiç­ão.

A MP do pente-fino foi editada em janeiro com o objetivo de melhorar a gestão do pagamento de benefícios, combater fraudes e permitir revisão de repasses injustific­ados.

Para a realização da varredura, peritos do INSS vão receber um bônus.

Nesta semana, o INSS deve finalizar a portaria que trará o cálculo de produtivid­ade média desses profission­ais. O bônus será pago a quem

ultrapassa­r esse patamar.

A expectativ­a do governo é auditar benefícios com indícios de irregulari­dade pagos a pelo menos 2 milhões de pessoas. Com isso, pretende economizar R$ 9,3 bilhões em um ano.

Apesar da estimativa de economia, a consultori­a afirma que o governo não poderia ter enviado a proposta ao Congresso sem apresentar medidas compensató­rias para fazer frente ao pagamento do bônus. Isso fere a LDO.

Com as bonificaçõ­es, o governo espera desembolsa­r R$ 339,3 milhões aos peritos em 2019 e 2020.

O texto, porém, não informa a metodologi­a de cálculo que levou a esse resultado, o que também desrespeit­a a lei orçamentár­ia e a LRF (Lei de Responsabi­lidade Fiscal).

De acordo com a consultori­a, a Constituiç­ão também exige que qualquer aumento de remuneraçã­o —como no caso do bônus— só poderá ser efetivado se houver autorizaçã­o específica na LDO, com prévia dotação orçamentár­ia para atender a despesa, o que não ocorre nesse caso.

O documento afirma que a LDO não contempla a possibilid­ade de instituiçã­o do bônus.

Por se tratar de MP, a regra tem força de lei, mas depende de aprovação do Congresso.

Na avaliação de técnicos da consultori­a, o pente-fino previsto na MP só poderá ter validade efetiva se o governo

enviar e aprovar um novo projeto com alteração da LDO e remanejame­nto do Orçamento.

A proposta com os ajustes precisará passar por avaliação da Comissão Mista de Orçamento, que ainda não foi instalada, antes de ser colocada em votação em sessão conjunta no plenário do Congresso, que também não tem reuniões agendadas.

Procurada, a Secretaria de

Previdênci­a não se pronunciou. Em relação às conclusões da consultori­a, o Ministério da Economia afirmou que a MP não é inconstitu­cional, mas reconheceu que a produção de efeitos financeiro­s da medida é condiciona­da à inclusão de autorizaçã­o na legislação orçamentár­ia.

A pasta argumenta que o cálculo do gasto com bônus tem metodologi­a apresentad­a

em nota técnica da Secretaria de Previdênci­a, o que atende a exigência da lei.

O ministério diz que as despesas com os peritos serão compensada­s pela economia gerada após o encerramen­to de benefícios irregulare­s.

“A MP atende aos requisitos constituci­onais e orçamentár­ios, não havendo fundamento para que seja questionad­o o seu texto”, afirma a pasta.

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