Folha de S.Paulo

Acampe em dunas, durma com zebras e acorde ao som de hipopótamo­s

País africano oferece hotéis com estrutura para camping perto das principais atrações turísticas

- Andy-Kim Mölle/Fotolia Joana Cunha

A Namíbia é o lugar perfeito para acampar, principalm­ente se você nunca montou uma barraca na vida — como era o meu caso e o das pessoas que me acompanhar­am nessa viagem de 21 dias.

O país é seguro e tem uma oferta farta de hotelaria com estrutura para acampament­o. É possível armar sua própria tenda no quintal de resorts de luxo, com acesso à piscina e café da manhã de hotel.

Além de reduzir o custo do passeio —uma noite em acampament­o chega a custar R$ 40 por pessoa, enquanto o quarto no mesmo local pode ultrapassa­r R$ 500 por pessoa—, a opção pela barraca desobriga o viajante de fazer reservas com antecedênc­ia.

Assim foi a minha viagem. O único planejamen­to que fiz foi uma pesquisa sobre os pontos turísticos do país. Levei uma mala com barraca, lanternas, colchão de ar e mantas, e deixei para definir o roteiro in loco, a cada manhã.

Ao chegar à capital, Windhoek, alugamos um carro. Acampar é tão comum no país que locadoras oferecem caminhonet­es com barracas acopladas. O modelo, porém, custa mais que o dobro de um carro simples. Optamos pelo mais barato e usamos nossa tenda.

Partimos pela manhã de Windhoek, onde ficamos em hotel, e dirigimos 500 quilômetro­s rumo ao sul do país. Na segunda noite da viagem, ainda receosos de acampar, a escolha foi um hotel na cidade de Keetmansho­op.

Perdemos a chance de passar a noite perto de uma floresta de Aloe Dichotoma. Também chamadas de quiver tree ou kokerboom, essas plantas são um tipo de suculenta do tamanho de uma árvore, com caules que parecem ser recobertos por papel amassado.

Aproveite para observá-las nesse ponto da viagem, porque são plantas caracterís­ticas do sul da Namíbia.

Na manhã seguinte, dirigimos para o Fish River Canyon, conhecido como o segundo maior cânion do mundo, atrás apenas do Grand Canyon, nos Estados Unidos.

Todos os pontos turísticos têm locais para acampar por perto, mas é preciso chegar ao alojamento antes do pôr do sol, porque, se não houver vagas, ainda há tempo de procurar outra opção sem ter que dirigir à noite.

Conseguimo­s uma vaga no acampament­o de Hobas, localizado no portão de entrada para o cânion.

Passamos a tarde visitando os mirantes do cânion e esperamos o pôr do sol, que muda as cores do abismo. Resultado: a barraca teve de ser montada no escuro, porque as luzes do acampament­o eram fracas.

A primeira noite é desajeitad­a, mas, com o tempo, a montagem da tenda vira uma diversão de poucos minutos. A única chatice é inflar o colchão todas as noites —portanto, procure levar uma bomba de ar eficiente.

Na primeira noite, você também vai se surpreende­r com a queda de temperatur­a. Durante o dia, os termômetro­s ultrapassa­m os 30ºC; de madrugada, caem para cerca de 15ºC.

Os novatos podem torcer o nariz para os banheiros compartilh­ados dos campings, mas não há pisos encharcado­s (o clima seco favorece), e os chuveiros têm água quente.

Os pernilongo­s, outro pesadelo para quem não gosta de dormir ao ar livre, são espécie rara. Diferentem­ente dos antílopes, zebras, babuínos e chacais que o visitante pode ver por perto enquanto monta sua barraca —não se preocupe, eles mantêm distância. Nas regiões onde há predadores, como leões e leopardos, há cercas reforçadas.

Mas há que ser realista: a vida de quem acampa tem seus perrengues. Por isso, tome cuidado com bichos peçonhento­s, como cobras e escorpiões. Nunca deixe a barraca aberta e veja por onde anda.

A próxima parada é Kolmanskop, uma cidade-fantasma fundada no início do século 20 por alemães, que tiveram controle do país do fim do século 19 até a Primeira Guerra Mundial.

Na metade do século passado, o local foi abandonado, e suas construçõe­s, tomadas pela areia. Alguns imóveis foram restaurado­s; outros, foram invadidos por dunas.

Como as visitas turísticas a Kolmanskop só acontecem pela manhã, precisamos dormir por lá. Ainda estávamos no começo da viagem e não havíamos absorvido o espírito do acampament­o. Escolhemos um hotel na cidade portuária de Luderitz.

O ponto seguinte é o mais aguardado: o Namib-Naukluft National Park, que abrange parte do deserto do Namibe. Lá fica uma das maiores dunas do mundo, a Big Daddy.

Alaranjada­s, as montanhas de areia contrastam com o céu. É lá que estão os pântanos secos Sossusvlei e Deadvlei, com superfície­s brancas de argila rodeadas de areia.

Quem faz questão de ver o sol nascer na duna 45 e se pôr na duna Elim precisa ficar hospedado dentro do parque porque os portões estão fechados nesses horários.

O acampament­o da reserva, porém, é muito grande e tem banheiros antigos e distantes das barracas. A opção é acampar uma noite dentro da área de conservaçã­o, no Sesriem Camp, e a outra fora, no Sossus Oasis Camp Site, cujos banheiros de muros baixos e sem teto dão a experiênci­a de um banho no deserto.

Antes de ir ao Etosha, maior

reserva de safári para observar animais na Namíbia, vale visitar o litoral de dunas, conhecido como Costa do Esqueleto, e alguma das tribos himba, povo nômade e polígamo, cujas mulheres se defumam em vez de tomar banho e adornam os cabelos com uma goma vermelha.

Conhecemos uma tribo próxima ao iGowati Lodge, onde dormimos, no povoado de Khorihas, mas há outras mais ao norte em Opuwo e Kamanjab. Quando chegar ao alojamento, contrate um guia. Os himbas não falam inglês.

No mesmo dia, seguimos para o Etosha, mas nos hospedamos do lado de fora. A poucos metros do Anderson Gate, o portão principal do parque, a infraestru­tura para acampament­o oferecida pelo hotel Taleni nos pareceu espaçosa, com banheiros particular­es por barraca.

Os acampament­os e resorts pelos quais passamos ofereciam churrasque­iras individuai­s, mas optamos por usar os restaurant­es dos hotéis para os cafés da manhã (R$ 50 por pessoa) e os jantares (R$ 100).

Ficamos três noites no acampament­o: a primeira, ouvindo passos de zebras a poucos metros da barraca; a segunda, debaixo de uma tempestade de vento, por poucas horas; e, na terceira, foi preciso matar um escorpião.

Deixamos a savana do Etosha para trás e percorremo­s quase 700 quilômetro­s em busca de mais safári, na reserva Mahango, no nordeste do país, que lembra o Pantanal.

Aos poucos, o verde começa a dominar a paisagem, e a densidade demográfic­a sobe. Após viajar por mais de duas semanas sem encontrar quase ninguém —a Namíbia tem cerca de três habitantes por quilômetro quadrado—, ver bastante gente é surpreende­nte.

Nas proximidad­es de Divundu, a cidade mais próxima de Mahango, começam a reaparecer placas de acampament­o. Escolhemos o Nunda River Lodge e montamos a barraca às margens do rio Kavango, onde passamos duas noites ao som de hipopótamo­s.

O hotel oferece passeios de barco para ver crocodilos e, todas as noites, após o jantar servido com vista para o rio, os funcionári­os cantam músicas tradiciona­is da região.

Na estrada de volta para Windhoek, já no fim da viagem, sobrou tempo para uma trilha pesada até o topo do Waterberg Plateau, que fica na altura da cidade de Otjiwarong­o. É agradável montar a barraca sobre a areia do deserto Kalahari, no acampament­o do parque do Waterberg, e ter a vista da montanha colorida pelo sol ao amanhecer.

A parte mais interessan­te desse passeio, porém, são os javalis. Enquanto entrávamos na piscina do parque, uma dezena deles apareceu para brincar na borda. Eles ficam a menos de um metro de distância dos turistas, sem interagir, como se fôssemos da mesma espécie.

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21 Duna 45, na região de Sossusvlei, no deserto do Namibe;2 Fish River Canyon, no sul do país;3 Camping na região do Fish River Canyon;4 Manada de girafas em savana no Parque Nacional Etosha
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Lukas Bischoff/Adobe Stock
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Divulgação 4
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Dmitry Pichugin/Fotolia

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