Por reforma, militares e Maia protegem Bebianno
Preocupação com reforma da Previdência e resistência à atuação de filhos de Bolsonaro orientam movimento para manter ministro
O fantasma de uma crise política fora de controle e que ameace a tramitação da reforma da Previdência motivou tentativa de evitar a saída de Gustavo Bebianno (Secretaria-Geral) do governo.
A operação foi capitaneada pela ala militar da gestão Bolsonaro, que agiu por conta própria, e pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), acionado de madrugada pelo ministro.
Como revelou a Folha ,o PSL, partido do presidente e que Bebianno dirigia nas eleições de 2018, patrocinou com verba pública candidatas com votação mínima e indícios de serem laranjas.
A crise foi agravada na quarta-feira, quando Carlos Bolsonaro chamou Bebianno de mentiroso em redes sociais e foi endossado pelo presidente, que compartilhou as mensagens do filho.
“Vamos pacificar isso”, disse à Folha o vice-presidente, general Hamilton Mourão (PRTB). Em nota, Bebianno declarou que não há ligação dele ou de Bolsonaro com as irregularidades.
“Não sou moleque, e o presidente sabe. O presidente está com medo de receber algum respingo Gustavo Bebianno em entrevista à revista Crusoé
O fantasma de uma crise política fora de controle e que ameaça a tramitação da reforma da Previdência no Congresso motivou uma tentativa de evitar a saída do ministro Gustavo Bebianno (Secretaria-Geral da Presidência) do governo.
A operação foi capitaneada pela ala militar do Planalto, que agiu por conta própria, e pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que foi acionado em um telefonema na madrugada desta quinta (14) por Bebianno.
A missão é difícil, pois todos concordam que o presidente Jair Bolsonaro ultrapassou uma linha ao endossar a crítica de seu filho Carlos ao ministro. Na quarta (13), Bebianno foi chamado de mentiroso após dizer que havia conversado com o presidente sobre a crise dos laranjas do PSL.
Como revelou a Folha, o partido do presidente patrocinou com o fundo partidário candidatas com votação mínima, e o dinheiro foi destinado a empresas suspeitas de não terem prestado serviços. Bebianno era o presidente interino do PSL na campanha.
A ação dos militares é uma vitória contra o que consideram ingerência indevida dos filhos de Bolsonaro. Mas todos concordam que talvez seja tarde demais.
Além de acionar Maia —que saiu em sua defesa publicamente dizendo que ele “dialoga bem” com o Congresso e pediu apoio ao ministro para Paulo Guedes (Economia)—, Bebianno optou inicialmente por um tom ameaçador.
Disse a aliados que não se demitiria porque não tem relação com a distribuição do dinheiro na campanha de 2018 nos estados. E afirmou à revista virtual Crusoé que a pressão sobre si decorria do fato de que Bolsonaro “está com medo de receber algum respingo” do caso das laranjas. Como homem forte da campanha de Bolsonaro, o ministro é depositário de diversas informações estratégicas.
À noite, Bebianno mudou o tom e fez um aceno ao presidente. Em nota enviada pela assessoria de imprensa, reafirmou que a responsabilidade da transferência de dinheiro para candidatos é de cada diretório estadual e acrescentou que Bolsonaro não teve relação com os casos. “Jair Bolsonaro nunca ocupou nenhum cargo de direção no partido, portanto não tem qualquer relação com outras candidaturas. Responde apenas pela sua própria, como qualquer outro candidato”, afirmou.
Dois dos principais ministros da área militar envolvidos na operação para tentar solucionar a crise, Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional) e Fernando Azevedo (Defesa), foram chamados ao Palácio da Alvorada na quarta, onde Bolsonaro havia chegado após uma internação de 17 dias em hospital de São Paulo.
Chefe da Secretaria de Governo, o general Carlos Alberto dos Santos Cruz também entrou no circuito. “Vamos pacificar isso”, sinalizou à Folha o vice-presidente, general Hamilton Mourão (PRTB).
A ala fardada não quer a queda de Bebianno por considerar que a demissão no segundo mês do governo só serviria para firmar a imagem de fragilidade política no Planalto.
Militares e também Rodrigo Maia lembravam a aliados que uma crise política —a revelação da gravação do empresário Joesley Batista com o presidente Michel Temer em 2017— foi responsável por matar a tramitação da reforma da Previdência naquele momento.
O comportamento de Bebianno, contudo, não favoreceu o movimento. Além das ações na mídia, ele não compareceu à reunião em que seria repreendido por Heleno, Azevedo e pelo chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni.
Os militares buscaram atuar como bombeiros. Os mais próximos de Bolsonaro sugeriram sangue frio ao presidente e viram como equivocados o endosso às críticas de Carlos e a declaração à TV Record de que Bebianno poderia “voltar às origens”.
A impressão resultante foi de que Bolsonaro fritou o ministro por meio do filho, em vez de usar de sua autoridade para demitir o auxiliar.
“Vamos pacificar isso Hamilton Mourão vice-presidente da República, sobre a crise
Vereador no Rio de Janeiro pelo PSC, Carlos é o mais influente filho de Bolsonaro, segundo relato de seus próprios irmãos. Ele comanda há anos a estratégia digital do pai, mas durante a campanha eleitoral acumulou discussões com Bebianno sobre rumos da comunicação do então candidato.
Já na transição, o então futuro ministro inviabilizou a indicação de Carlos para a Secretaria de Comunicação Social ao ventilar a possibilidade em entrevista. Os filhos não perdoaram, e o deputado federal Eduardo (PSL-SP) indicou um assessor para a função, que foi retirada do guarda-chuva da Secretaria-Geral que seria assumida por Bebianno.
Assim, o escândalo dos laranjas do PSL caiu como uma luva para o clã Bolsonaro voltar à carga.
Diversos oficiais no governo e na ativa admitem que a influência dos filhos sobre o presidente é algo incontornável. Mas não escondem o desagrado com o modo caótico de comunicação, privilegiando torpedos no Twitter em detrimento de articulações políticas mais consistentes e ponderadas.
Quem pode falar, o indemissível Mourão, já comprou sua briga particular contra a agenda conservadora de Bolsonaro ao se dizer favorável à liberação do aborto. E protagonizou altercação com o ideólogo de Eduardo e Carlos, o escritor Olavo de Carvalho.
Em entrevista à agência Reuters nesta quinta, o vice afirmou que Bolsonaro ainda vai tomar uma decisão sobre a permanência de Bebianno e avaliou que o chefe do Executivo “vai dar uma ordem unida na rapaziada”, em referência aos filhos do presidente.
“O presidente vai tomar uma decisão, foi uma coisa que ele me disse. Acho que ele está aguardando o momento para conversar com o ministro e acertarem os ponteiros.”
Bolsonaro ganhou tempo ao reservar a tarde para fechar a polêmica alteração da idade mínima de aposentadoria em sua proposta de reforma da Previdência, além da regra de transição para sua implantação.
A previsível euforia nos mercados com a definição anunciada deu um alívio momentâneo ao governo, mas o nó político ainda precisa ser desatado.
“A decisão de ele continuar ou não no governo é um problema do Executivo. Agora, de fato ele é um ministro que dialoga bem, tem bom trânsito comigo, não só comigo, mas com todos os líderes da Câmara Rodrigo Maia presidente da Câmara, sobre Bebianno
Ata de uma reunião da Executiva Nacional do PSL realizada em 11 de julho do ano passado mostra que o partido do presidente Jair Bolsonaro definiu Gustavo Bebianno, então presidente interino da sigla, como o responsável pela distribuição de verbas públicas a candidatos nos estados na eleição de 2018.
O encontro também decidiu os critérios eleitorais que deveriam balizar os repasses dos fundos de campanha.
Desde que a Folha revelou o esquema de candidaturas laranjas do PSL em estados, Bebianno, hoje ministro da Secretaria-Geral da Presidência, tem dito que as decisões sobre as chapas estaduais foram das direções regionais e que ele cuidou apenas da eleição presidencial.
“A mim competiu trabalhar para eleição do presidente. Para a eleição dos deputados estaduais, federais, senadores e governadores, cada diretório montou sua chapa e conduziu”, disse Bebianno à Folha na terça (12).
De acordo com a ata da reunião de julho, porém, houve uma votação e, por unanimidade, ficou decidido que caberia “ao presidente da Comissão Executiva Nacional do PSL decidir sobre a distribuição dos recursos”.
Na sequência, o documento trata dos critérios que deveriam ser seguidos, “levando em consideração a prioridade de reeleição dos atuais mandatários, a probabilidade de êxito das candidaturas, bem como a estratégia político-eleitoral do partido no tocante ao crescimento de suas bancadas na Câmara e no Senado”.
O PSL ainda formalizou que, para que o candidato recebesse recursos do fundo eleitoral, deveria “fazer requerimento formal, por escrito, à presidência da comissão executiva nacional”.
O encontro de julho ocorreu em Brasília, com a presen- ça dos membros da Comissão Executiva Nacional do PSL, e foi presidido pelo próprio Bebianno. A primeira assinatura da ata é a do hoje ministro.
A crise de candidaturas laranjas foi alavancada na última quarta (13), respingando no governo, pelo ataque do vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ), filho do presidente, ao ministro da Secretaria-Geral.
Carlos afirmou, no Twitter, que o ministro havia mentido ao dizer à reportagem do jornal O Globo que conversara com Bolsonaro três vezes na véspera, negando a crise. Mais tarde, o vereador divulgou um áudio no qual o presidente da República se recusa a conversar com Bebianno.
O ataque foi endossado por Jair Bolsonaro, que compartilhou as postagens do filho e negou a versão do ministro.
Segundo a Folha apurou, o presidente esperava que, quando saísse do hospital onde esteve internado em São Paulo, Bebianno já tivesse pedido demissão.