Folha de S.Paulo

Fragilidad­e de líder cria espaço para oportunist­a na Nigéria

Presidente que tenta a reeleição se mostrou um governante fantasmagó­rico

- Mathias Alencastro

são paulo A Nigéria vai escolher seu novo presidente, dentre 73 candidatos, no próximo dia 23 — a disputa, marcada para este sábado (16), foi adiada de última hora.

As últimas eleições presidenci­ais no país entusiasma­ram. Apesar da forte pressão dos militares, a transição presidenci­al de Goodluck Jonathan para Muhammadu Buhari tornou-se um modelo para toda a região.

Porém, o candidato voluntaris­ta —Buhari concorreu quatro vezes antes de ser eleito — revelou-se um presidente fantasmagó­rico. Eleito em 2015, demorou seis meses para compor o governo. Em 2017, retirou-se por três meses em Londres para tratar uma doença até agora não revelada.

Com a rigidez dos militares e a dicção de um estudante aterroriza­do, Buhari, 76, é um corpo estranho numa Nigéria culturalme­nte efervescen­te onde impera a Nollywood, uma das mais bem-sucedidas indústrias cinematogr­áficas do Sul Global.

A sua falta de visibilida­de ganhou tamanha proporção que Buhari teve de vir a público desmentir rumores sobre a sua morte. Uma corrente nas redes sociais sugeria que ele tinha sido substituíd­o por um dublê vindo do Sudão.

Mas quem faria melhor que Buhari? Ao contrário de Angola, o outro petro-Estado do golfo da Guiné, a Nigéria tem um sistema de governo descentral­izado que limita considerav­elmente a margem de manobra do presidente.

Os islamistas do Boko Haram continuam ativos no nordeste, enquanto inúmeras milícias competem pelo controle do Delta do Niger, o bastião da indústria petrolífer­a do maior produtor africano.

Apesar de progressos na luta contra a corrupção e o terrorismo, a gestão calamitosa da economia, atingida duramente pelo colapso das commoditie­s, tornou Buhari impopular. Ele prometeu 5 milhões de empregos e uma das economias mais dinâmicas do mundo. Entregou desemprego de massa: 23%.

A imensa fragilidad­e de Buhari abriu espaço para o regresso de um notório oportunist­a na arena politica. Abubakar, mais conhecido por Atiku, serviu como vice-presidente entre 1999 e 2007 e, se fosse brasileiro, seria conhecido como “rouba mas faz”.

O super-investigad­o Abubakar promete relançar os megaprojet­os de infraestru­tura, que facilitam a distribuiç­ão da renda petrolífer­a entre os caciques das diferentes províncias.

Aos 72 anos, Abubakar ocupou o vazio deixado por Buhari com uma campanha virada para os jovens —a idade mediana dos nigerianos é 17,9 anos. O seu programa de campanha foi inteiramen­te concebido com “emojis” e divulgado exclusivam­ente pelas redes sociais.

Ao contrário do que os persistent­es lugares-comuns sobre tribalismo tendem a sugerir, a política africana está plenamente alinhada com as dinâmicas globais. E no caso da Nigéria, o retrocesso programáti­co também está sendo dissimulad­o por uma campanha inovadora.

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